domingo, 13 de julho de 2008

ANOS DE CHUMBO XXIII - Caça aos torturadores.

“Polícia, polícia, encosta, encosta”, gritaram os dois homens com pistola e revólver calibre 38 nas mãos, ao deter os repórteres de CartaCapital na avenida Vereador José Diniz, no Ibirapuera, em São Paulo. Os jornalistas, minutos antes, tentaram entrevistar, na sede da empresa de segurança Dacala, a poucos metros dali, o delegado aposentado David dos Santos Araújo, o Capitão Lisboa, acusado por presos políticos de ser torturador do DOI-Codi (Departamento de Operações de Informações e Centro de Operações de Defesa Interna), na equipe “B” do comandante Carlos Alberto Brilhante Ustra, no início dos anos 1970.

Questionados por que não estavam fardados, um dos homens, alto, branco e magro, exibiu uma carteira da Polícia Militar, mas cobriu a parte em que aparecia o seu nome. O outro, negro, baixo e corpulento, não mostrou documentos. Pelo menos um PM, como foi confirmado, trabalhava ilegalmente para a empresa comandada por Araújo. A lei proíbe a dupla função para policiais.

Também de forma ilegal, pois não estavam em serviço como policiais, os seguranças ameaçaram prender os repórteres. “Vocês estavam em atitude suspeita próximos de uma empresa que transporta valores”, alegaram. Em frente ao prédio da Dacala, havia vários carros, mas nenhum de transporte de valores. Os repórteres só foram liberados depois de provarem ser jornalistas.

Antes, na portaria, nem ao menos foram anunciados. “O senhor David só atende com hora marcada. Nem adianta avisá-lo”, comunicou um dos porteiros. Diversos contatos foram feitos por telefone nos dias seguintes, mas não houve retorno. Araújo nunca atendeu e seus auxiliares ainda tentaram intimidar os jornalistas.

Oficiais do Exército, investigadores e delegados envolvidos com a repressão política na ditadura, como David Araújo, estão preocupados com a decisão do Ministério Público Federal (MPF) de São Paulo de entrar com ações na Justiça para responsabilizar torturadores e autoridades da época por crimes cometidos no DOI-Codi paulista. O MPF pretende puni-los por prisões ilegais, torturas, homicídios e desaparecimentos forçados. Para a Procuradoria da República em São Paulo, agentes públicos, “notadamente da União Federal”, praticaram abusos e atos criminosos contra opositores ao regime, “em violação ao princípio da segurança pessoal”. Na visão dos procuradores, a Lei de Anistia não encerrou esse episódio e o Brasil pode – e deve – punir os repressores, à semelhança do que aconteceu na Argentina, no Chile e no Uruguai.
Fonte: Revista Carta Capital.

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