Eu também estava lá. Recente pesquisa da FSP mostrou que de cada 10 brasileiros, 8 não sabem o que foi o AI 5. Com ele, fui demitido do antigo DNER, onde trabalhava como escriturário.
Carlos Dória.
“Nessa tarde, a infantaria da PM teve medo de entrar na Avenida Rio Branco.Os poucos que se aventuraram, esconderam-se logo sob as marquises. A única força a entrar foi a cavalaria, mas os cavalarianos não esconderam o medo”. (“1968 O Ano Que Não Terminou” Zuenir Ventura)
É que, do alto dos prédios “chovia” gelo, grampeador, vaso de flor e até uma máquina de escrever.
O ano era 1968. Sexta feira, centro da cidade do Rio de Janeiro. A rotina das manifestações estudantis já tinha transformado o cenário das principais ruas e avenidas do centro financeiro e econômico da metrópole. Jovens faziam incursões relâmpago, gritando palavras de ordem e atirando pedras na Embaixada dos Estados Unidos e em instituições como bancos norte americanos e na sede da US AID. Atrás, vinha a PM baixando a porrada. Correrias, gritos, bombas de gás, barulho de vidro quebrando. Todo dia, o dia todo. As pessoas nos escritórios acompanhavam do alto.
Nesta sexta, após as ações “rotineiras” de atirar pedras na embaixada norte americana, surgiu uma caminhonete do DOPS jogando gás lacrimogêneo. Os estudantes, entre eles Vladimir Palmeira ( hoje no PT-RJ) saíram correndo e foram surpreendidos pelo fogo cruzado nas esquinas da Rua México e Santa Luzia. Helicóptero e sirenes anunciavam reforços chegando. A ordem era “Atirar para Matar”. Três moças foram baleadas e uma morreu a caminho do hospital. Os espectadores, postados no alto dos prédios de escritório, tomaram partido: primeiro, alguém tentou acertar um PM com pedras de gelo. Foi a senha. Em seguida, objetos mais pesados e contundentes começaram a chover. A partir de então, a cavalaria iria padecer em todos os confrontos com os estudantes, principalmente quando eram jogadas na avenida, do alto dos prédios, rolhas para que os cavalos escorregassem. Zuenir Ventura considera a sexta sangrenta como o momento em que a classe média passou a odiar as autoridades estaduais e federais e o momento em que a população entrou fisicamente no confronto, mostrando que tomara partido ao lado dos estudantes. Ele localiza também nestes 3 dias (19, 20 e 21 de junho, quarta, quinta e sexta) o momento em que Costa e Silva perdeu definitivamente o apoio da opinião pública.
Na quarta feira seguinte, o que seria uma passeata de intelectuais e estudantes, transformou-se na, hoje conhecida como, “Passeata dos 100.000” que tomou completamente a Cinelândia e as ruas adjacentes.
Muitas outras manifestações se sucederam pelo Brasil afora e o regime endureceu mais ainda.
Na manhã da sexta feira 13 de dezembro do mesmo ano de 68, há exatos 40 anos, todos os jornais do Rio e de São Pulo foram apreendidos antes mesmo da circulação.
O Jornal do Brasil, do Rio, resolveu informar, de alguma forma, que havia uma censura ferrenha às notícias e, apesar do dia ensolarado e quente, uma previsão meteorológica destacava no alto da primeira página “tempo negro e temperatura sufocante, ar irrespirável, o país está sendo varrido por fortes ventos”.
Era uma nova “sexta feira sangrenta” que duraria bem mais tempo e seria responsável por muito mais mortes.
Fora decretado o Ato Institucional No.5 que fechava o Congresso, cassava mandatos políticos, suspendia garantias institucionais, prendia políticos artistas e estudantes e, durante 10 anos, censurou 500 filmes, 450 peças de teatro,200 letras de música e 200 livros. Prendeu, torturou e matou qualquer cidadão, que parecesse um subversor ao regime ditatorial.
Ainda hoje há setores que estremecem à simples menção de punição aos torturadores, que permanecem impunes, levando vidas tranqüilas como se nada tivessem feito de horrendo.(Recomendo que leiam o livro “Mulheres, Militância e Memória” de Elizabeth F. Xavier Ferreira , editora da Fundação Getulio Vargas )
Hoje, ao escrever este artigo, surpreendi-me com a pergunta da minha sobrinha de 25 anos: “AI-5? O que é isso??”
Fonte:Blog Brasil Mobilizado.
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