quarta-feira, 4 de março de 2009

MÍDIA - Reforma na Folha.

Parece que as reações ao infeliz editorial da Folha, que para mim foi escrito por um jovem jornalista sem conhecimento da história, que criou o neologismo "ditabranda" serviram para mostrar à esse veículo, a necessidade de mudar de rumo, para não cair no descrédito que caiu a revista Veja. Daí a boa notícia que o Dines nos dá, a respeito de uma reforma da Folha.Tal reforma, como escreve o Dines,"não poderá dispensar uma quebra no monolitismo hoje infiltrado em todas as páginas e colado nas paredes de todas as redações brasileiras. Para ser didática uma matéria não pode dispensar o contraditório e a dialética".
Para mim, Dória, a razão da explosão da blogosfera observada no Brasil nesses últimos anos, deve-se principalmente ao fato da grande imprensa, com raríssimas excessões,não permitir o contraditório.Limitam-se a tentar passar para seus leitores, "um pensamento único, uma verdade absoluta.O caso dos boxeadores cubanos é exemplar. Por mais que o governo brasileiro explicasse que os cubanos voltaram para Cuba porque quiseram, toda a imprensa vendeu uma verdade única. Jabor, Merval,Veja, Estadão, Folha,Lúcia Hipólito, esbravejaram, cairam de pau no governo,etc. Agora, pelo que eu sei, só a Lúcia Hipólito teve a decência de fazer seu "mea culpa".
No momento, parece que pelo menos os responsáveis pela Folha perceberam que se este veículo continuasse a tentar impor a "verdade única" com forte viés ideológico, como faz a Veja, estaria aumentando como diz o Dines, "a homogeneidade que domina e distancia a grande mídia jornalística brasileira da grande massa de leitores".
Felizmente a Folha caiu na real. Agora o mais surpreendente foi a capa da edição dessa semana da Veja, mostrando uma guinada na cobertura dos efeitos da crise econômica no Brasil. A capa destaca dez razões para otimismo e uma para pessimismo. Será que a Veja também está caindo na real? Será que ela constatou que a postura de "torcer pelo quanto pior, melhor" que uma parte da oposição também está adotando, não está atingindo seus fins, no sentido de atingir o Lula e o seu governo? Será que foi a redução das receitas publicitárias motivada por esse alarmismo em função do tamanho da crise, que induziu essas mudanças de postura?Estou curioso para saber o que os "pitbuls" da Veja, (Mainardi e Reinaldo), estão achando dessa capa.
Carlos Dória.

MUDANÇA (PREVISTA) NA FOLHA

A reforma já começou

Por Alberto Dines em 3/3/2009

Já é oficial: a Folha de S.Paulo vai mudar. O jornalista Eduardo Ribeiro revelou os objetivos a serem alcançados com essa mudança (ver "Grupo Folha projeta um novo ciclo editorial"). Felizmente foram banidos os "consultores internacionais" que há mais de 20 anos locupletam-se com as reformas cosméticas adotadas pelos jornais brasileiros. Pelo que se depreende, será empreendida por quem entende do riscado – os que fazem o jornal e não agüentam mais fazê-lo desta forma burocrática. Será uma reforma de teor. Conteúdo, como se diz nas rodas mediáticas.
A grande notícia, porém, é que a reforma da Folha já começou. E muito auspiciosamente. Dias depois do registro de Eduardo Ribeiro, o editor de Brasil, Fernando de Barros e Silva, publicou na Folha (24/2, pág. A-2), um texto claro, polido (em todos os sentidos) e revolucionário. Discordou abertamente das posições adotadas pela direção do jornal no caso do editorial em que o regime militar brasileiro foi designado como "ditabranda".
Na abertura do artigo "Ditadura, por favor", FBS afirma que "não é a primeira vez que um colunista da casa diverge da posição expressa pelo jornal em editorial". Data venia, é a primeira vez que um colunista assume ostensiva e publicamente sua divergência com a orientação do jornal.
Recuo compulsório
É uma revolução, não apenas na Folha mas na grande imprensa brasileira. O que falta aos nossos grandes jornais é pluralismo, abertura, tolerância, variedade. Esta é a deficiência que os torna convencionais, ultrapassados, "preguiçosos" – para usar o adjetivo empregado pelo ombudsman Carlos Eduardo Lins da Silva.
A nova Folha com "textos compactos, didáticos e analíticos" não poderá dispensar uma quebra no monolitismo hoje infiltrado em todas as páginas e colado nas paredes de todas as redações brasileiras.
Para ser didática uma matéria não pode dispensar o contraditório e a dialética. Só um jornal afinado com os novos tempos admitirá uma discussão pública como esta tranquilamente iniciada por Fernando de Barros e Silva. Não faria o menor sentido se ficasse reservada à esfera doméstica ou sutilmente processada semanas depois em doses homeopáticas nas diversas colunas.
A valorização dos colunistas, como pretende a Folha, vai certamente conferir a seus textos uma visão de mundo mais abrangente e transformá-los em peças efetivamente didáticas. Com um único artigo, o editor de "Brasil" (na verdade editor de Política) mostrou as oportunidades que se oferecem a colunistas compenetrados com suas responsabilidades, zelosos com seus currículos e biografias.
E se esta abertura for levada adiante, será inevitável um degelo na espessa homogeneidade que domina e distancia a grande mídia jornalística brasileira da grande massa de leitores.
A Folha de S.Paulo já promoveu duas revoluções (a de 1975 e a implantação do "Projeto Folha", entre 1984 e 1987). A que entrou para a história do jornalismo e mexeu com a história do país foi acionada pela incrível dupla Octávio Frias de Oliveira-Cláudio Abramo, que materializou a distensão política pretendida pela outra dupla, Geisel-Golbery.
Não foi uma reforma no sentido tradicional, cosmética. Foi uma catarse. Como resultado dela, de repente, as redações começaram a formigar com a pergunta "e por que não nós?". Por isso, diante das pressões exercidas pelo ministro da Justiça, Armando Falcão, a Folha foi obrigada a recuar em 19 de setembro de 1977.
Fazer história
É ousada a decisão da direção do Grupo Folha em mexer no seu carro-chefe, depois de um ano espetacular em matéria de receitas e no meio de um imprevisível processo recessivo global. Por inúmeras razões, mas principalmente porque implica o reconhecimento de que um grande jornal como a Folha não pode esperar passivamente as soluções do "mercado" ou da conservadora corporação empresarial. Decisões inovadoras, pioneiras, são necessariamente solitárias.
Jornais precisam voltar a ser indispensáveis e imprescindíveis. São eles que organizam e acionam o processo informativo. Está comprovado que os portais da web não conseguem ser ao mesmo tempo "quentes" (isto é, altamente noticiosos) e "frios’ (isto é, altamente analíticos). Noam Chomsky numa contundente entrevista publicada na edição de segunda-feira (2/3, pág. 33) do diário espanho El País é categórico: "As fontes de informação ainda estão na imprensa tradicional" [ver "`No soy un Don Quijote, porque mis molinos de viento son reales´").
Como todos os conglomerados multimídia, o Grupo Folha vai integrar os diferentes serviços jornalísticos, reforçar os vínculos entre eles, mas deixa claro que manterá a aposta naquele que tem sido o seu carro-chefe.
Se resistir ao instinto trendy, modista, que geralmente sepulta os mais bem intencionados projetos, está assegurado o êxito da reforma da Folha. Se perceber que a repercussão produzida pela publicação de uma divergência foi mais importante do que a infeliz e impolida "Nota da Redação" defendendo a "ditabranda", estará fazendo história novamente.

Um comentário:

Anônimo disse...

Eu acho que foi a "ordem" do FHC, naquela entrevista de sábado ou domingo, dizendo que esse tipo de coisa não funciona mais. Tem de inventar outra.