terça-feira, 6 de outubro de 2009

MÍDIA - RIO OLÍMPICO, 2016: Indiferença em vez de otimismo.

O Lula fez um discurso belíssimo, com coração e emoção, que deixou todos emocionados, discurso esse que foi decisivo para que o Brasil fosse escolhido e vem o Fantástico e faz uma matéria escondendo o Lula e seu discurso. Depois reclamam do rótulo PIG.
Carlos Dória.


Por Washington Araújo, no Observatório da Imprensa.

Ele conquistou auto-suficiência em petróleo, passou a ser emprestador do Fundo Monetário Internacional. Ele descobriu que dispõe de imensas reservas de petróleo na camada do pré-sal, em uma faixa de não desprezíveis 800 quilômetros entre os estados do Espírito Santo e Santa Catarina. Ele trouxe 20 milhões de pessoas da miséria para a pobreza e 18 milhões de pobres subiram à classe média. Ele será palco do maior evento futebolístico do mundo – a Copa do Mundo de 2014. E, de quebra, em 2016 já foi escolhido para sediar as primeiras Olimpíadas da América Latina.

Na maior crise econômica mundial pós-1929 ele encarou os desafios, esnobou a velha ordem econômica esclerosada – e em vertiginosa queda – com a alcunha de "marolinha" e foi o primeiro país a retomar o crescimento econômico. De celebrada 10ª potência econômica mundial já vem sendo anunciado, em previsão de peso-pesado do Banco Mundial, que em 2016... será a 5ª maior economia do mundo.

Em meio a barulhentos vizinhos que movem mundos, fundos, alteram Constituições tudo em esforço concertado para se perpetuar no poder, ele continua dando mostras de que a alternância democrática é o que melhor condiz com sua história e melhor será para seu futuro.

Ele é o Brasil. Aquele sempre cantado em verso e prosa como o Brasil-brasileiro e o gigante deitado eternamente em berço esplêndido. Assisti inteiramente concentrado na transmissão (por sinal muito boa) da Rede Record de Televisão, minuto a minuto, a cerimônia em Copenhague para a escolha por parte do Comitê Olímpico Internacional (COI) do país-sede das Olimpíadas de 2016. Assisti o nome do Rio de Janeiro ser anunciado e a algazarra (palavra com cheiro de naftalina mas muito oportuna) no salão. Depois fui conferir a maneira como o mundo se curvava ao Brasil.

Chacinas em pauta

Barack Obama diz que "vitória do Brasil (para sediar Olimpíadas) é histórica". A rede CNN destacou que "o Rio desbancou Chicago, Madri e Tóquio", o New York Times não deixou por menos e em seu site na internet destaca a escolha da cidade como a primeira da América do Sul a sediar uma edição das Olimpíadas. O principal jornal espanhol, El País, abriu longa manchete em seu site: "Madri ficou a um passo do sonho. O esforço diplomático dos últimos dias não deu frutos e o Rio se impôs na última curva".

O francês Le Monde dava a escolha do Rio como notícia principal e não deixava de alfinetar seus vizinhos: "Os brasileiros comemoram, os espanhóis lamentam", dizia um título. Até o principal diário esportivo dos hermanos, o argentino Olé, não se conteve: "Se festeja en Río, duele en Madrid, decepción en Chicago (Obama inclusive), y quién sabe qué se dice en Tokyo..." O Clarín deixou claro desde os últimos dias que a Argentina era espanhola desde sempre e passamos a acreditar que a Argentina compartilha fronteiras com o Brasil por mera ironia geográfica. Não causou mesmo espanto ver que a nossa Cidade Maravilhosa (e agora Olímpica) ganhar de Chicago, Madri e Tóquio só podia mesmo doer no âmago da alma portenha. Coisas da vida. Fazer o quê?

Mas não sei o que acontece com nossa imprensa. Na hora de mostrar otimismo fica indiferente. Dos jornais de maior circulação do país apenas o Jornal do Brasil levou à manchete o assunto das Olimpíadas. Publicou o diário carioca, na sexta-feira (2/10): "Rio 2016. É hoje!" O Globo, a Folha e o Estadão trataram mesmo foi do Enem e os dois diários paulistas, qual dupla sertaneja, elevaram ao altar principal as mesmas palavras: "PF investiga vazamento".

Temos que convir que a depender do entusiasmo de nosso jornalismo auriverde o maior evento esportivo do planeta em 2016 poderia se dar em terras madrilenhas, na Gotham City norte-americana ou na terra do Sol Nascente. Tudo, menos na ensolarada Rio de Janeiro, cidade que melhor vende a imagem do Brasil mas que freqüenta o noticiário nativo quase que unicamente através da cobertura de chacinas nos morros cariocas, nas incursões da polícia quando não de efetivos do exército para reprimir o narcotráfico ou quando nos informam do extermínio de meninos (e meninas) de rua.

Dia de celebração

Repassando as manchetes dos sete principais jornais brasileiros de sexta-feira (2/10), observamos com certo desalento que seis se ocupam do vazamento de provas do Enem e apenas um, o de menor circulação – e carioca ainda por cima – resolve dar um refresco e dá um voto de confiança ao evento de maior potencial midiático passível de ocorrer em nosso país.

É que temos especialistas no Brasil que não dá certo e pouquíssimo traquejo para com o Brasil que pode dar certo. E não me venham com a ladainha de que não temos boas notícias para apurar, assuntos interessantes para repercutir. Basta reler o primeiro parágrafo deste texto.

Que mais esperamos de bom para elevar nossa auto-estima e de quebra passar uma boa imagem do Brasil? Falta ainda termos um brasileiro pisando em solo lunar. E também o médico Miguel Nicolellis ganhar o Nobel de Medicina, Lygia Fagundes Telles trazer para o Brasil o Nobel de Literatura. E um filme brasileiro ganhar o Oscar de melhor filme. Pode até ser na categoria melhor filme estrangeiro. O Brasil poderia também ganhar assento no Conselho de Segurança da ONU, mas ainda é pouco para satisfazer nossas expectativas. É como se nossa imprensa visse o Brasil sempre com viés de baixa (para usar um linguajar típico do noticiário econômico).

Poderíamos começar a trabalhar para ter uma imprensa pautada pela ética e pela duradoura defesa dos direitos humanos. Uma imprensa que saiba distinguir opinião pública de opinião publicada, interesse público de interesse privado. E, quem sabe?, na medida em que formos transpondo as águas do rio São Francisco no Nordeste brasileiro poderíamos começar a transpor para a educação brasileira, em todos os níveis, do elementar ao superior, essa coisa chamada qualidade. De qualquer forma nada disso impede que festejemos um pouco nossas conquistas. Sonhos que foram de passadas gerações de brasileiros. Hoje não é dia de recolhimento. É de celebração. E não é todo dia que a terra descoberta por Cabral pode assistir a um placar assim: Rio, 66 votos. Madri, 32. Goleada!

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