segunda-feira, 19 de maio de 2008

CURIOSIDADES - Influência Espírita.

Matéria do jornalista Vinícius Queiroz Galvão na FSP.

Influência religiosa deturpa Estado de Direito.

Segundo Dalmo Dallari, o uso de cartas psicografadas nos tribunais é "claramente ilegal'Teórico do direito, professor Marcelo Neves afirma que posições religiosas diversas não podem ser usadas para influenciar decisão judicial
VINÍCIUS QUEIROZ GALVÃODA REPORTAGEM LOCAL
Juristas e teóricos do direito consultados pela Folha dizem ver uma "deturpação" do Estado democrático de Direito na medida em que decisões judiciais são fundamentadas ou contaminadas por valores ou critérios religiosos.Para Dalmo de Abreu Dallari, professor aposentado da Faculdade de Direito da USP, e autor dos livros "O Poder dos Juízes" e "O Futuro do Estado", "o uso de psicografia é claramente ilegal"."Não há o reconhecimento disso no sistema jurídico brasileiro. Se isso for a prova, o julgamento é nulo. Não pode", diz.Um dos maiores teóricos do direito brasileiro, Marcelo Neves, professor de teoria do Estado da USP e de teoria do direito do doutorado da PUC, diz haver uma "descaracterização dos princípios do Estado constitucional moderno" na aplicação de valores espíritas no dia-a-dia do Poder Judiciário.Estado laico"Não se podem definir posições sobre casos jurídicos a partir de uma percepção religiosa do mundo. A partir do momento em que esses magistrados não conseguem se desvincular é um problema gravíssimo para o Estado de Direito, que parte do princípio de ser um Estado laico e que posições religiosas diversas não podem ser determinantes no processo de decisão jurisdicional", afirma Marcelo Neves.Para Dallari, a associação de juízes espíritas é "exercício de cidadania". "Os juízes têm plena liberdade religiosa como todos os demais cidadãos, como têm o direito de associação."Mas, segundo o jurista, "se isso interferir no desempenho da função jurisdicional, aí, sim, se torna ilegal e ofende a laicidade". "Nunca tive notícia de juízes espíritas."Segundo Neves, o uso de psicografia nos tribunais "é um perigo" e só tem significado nos campos religioso e pessoal."Isso não pode passar para o plano jurídico porque realmente é uma interferência destrutiva da consistência do Estado democrático de Direito.""Não existe amparo legal na utilização do sobrenatural", completa Dallari.Vontade funcionalPara Walter Nunes da Silva Júnior, presidente da Ajufe (Associação dos Juízes Federais do Brasil), os juízes, como Estado, "manifestam não uma vontade pessoal, mas uma vontade funcional"."Escorar uma decisão com base numa prova psicografada não tem ressonância no mundo jurídico. É indevida uma decisão que se embasa na psicografia, que cientificamente não é comprovada", diz ."A constituição do Estado democrático de Direito fica totalmente prejudicada, principalmente pela pluralidade religiosa. Num mundo de pluralidade religiosa cada vez maior hoje é que tem que haver maior distância do Estado constitucional em relação aos particularismos religiosos", diz Neves.Livros como "A Filosofia Penal dos Espíritas", "Pena de Morte e Crimes Hediondos à Luz do Espiritismo" e "A Psicografia ante os Tribunais" já foram lançados no mercado jurídico-espírita.
Folha de S.Paulo - Associação quer espiritualizar o Judiciário - 19/05/2008www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1905200801.ht...
Associação quer espiritualizar o Judiciário
A recém-criada Associação Jurídico-Espírita de SP defende, entre outros pontos, o uso de cartas psicografadas nos tribunaisAlém de juízes, entidade reúne promotores, delegados e advogados; "o Estado é laico, mas as pessoas não", diz o promotor Tiago Essado
VINÍCIUS QUEIROZ GALVÃODA REPORTAGEM LOCAL Eles defendem um Judiciário mais sensível às questões humanitárias, dizem que a maior lei é a de Deus, vêem na condenação penal e na própria função uma missão de vida, defendem o uso de cartas psicografadas nos tribunais e estimulam, nas audiências, a fraternidade entre vítimas e criminosos.Discutir temas polêmicos, como o aborto, a eutanásia, o casamento gay, a pena de morte e as pesquisas de células-tronco, condenados pelas religiões cristãs, são alguns dos objetivos da recém-criada AJE (Associação Jurídico-Espírita) de São Paulo, que teve anteontem a primeira reunião deliberativa, e já existe no RS e no ES."O Estado é laico, mas as pessoas não. Não tem como dissociar e dizer: vou usar a minha fé só dentro do centro espírita", afirma o promotor Tiago Essado, um dos fundadores da AJE.Embalada na esteira do crescimento da Abrame (Associação Brasileira de Magistrados Espíritas), que hoje reúne 700 juízes, desembargadores e ministros de tribunais superiores, e que aceita apenas togados como membros, a AJE surge com uma proposta de abranger todos os operadores do direito e já conta com 200 associados ou interessados, entre promotores, delegados de polícia e advogados, além de juízes.Embora juristas não vejam ilegalidade no fato de juízes se reunirem em associações religiosas, a questão levanta discussões como:1) o laicismo, princípio que prega o distanciamento do Estado da religião;2) a contaminação de decisões por valores ou crenças de caráter religioso ou pessoal;3) e o caráter científico do direito positivo, que deve se basear em verdades comprovadas, e não, como a religião, em verdades reveladas.Além dos tribunais superiores (entre outros, o vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça, Francisco Cesar Asfor Rocha, é um dos integrantes da diretoria da Abrame), a convicção espírita permeou também o Conselho Nacional de Justiça, o órgão de controle externo do Judiciário."Não enxergaria nenhuma diferença entre uma declaração feita por mim ou por você e uma declaração mediúnica, que foi psicografada por alguém", diz Alexandre Azevedo, juiz-auxiliar da presidência do CNJ, designado pelo conselho para falar a respeito das associações.A Folha levantou quatro decisões em que cartas psicografadas, supostamente atribuídas às vítimas do crime, foram usadas como provas para inocentar réus acusados de homicídio.Segundo Zalmino Zimmermann, juiz federal aposentado e presidente da Abrame, o propósito da associação "é questionar os poderes constituídos para que o direito e a Justiça sofram mais de perto a influência de espiritualizar"."O objetivo geral é a espiritualização e a humanização do direito e da Justiça", diz.Para o juiz de direito Jaime Martins Filho, a escolha de sua profissão não foi uma casualidade e, por isso, a exerce como uma missão de vida."Não acredito em acaso, mas numa ordem que rege o universo, acredito em leis universais."E ele explica "a finalidade religiosa da associação"."Dentro da liberdade de religião, são os juízes aplicando princípios religiosos no seu dia-a-dia. Temos um foco que é a magistratura, procurar trabalhar esses valores espirituais que estão relacionados com a própria religião dentro da magistratura", diz Martins Filho.

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