quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

ECONOMIA - A hipervalorização do real.


Paulo Nogueira Batista Jr.: A hipervalorização do real

Se o Banco Central resolver subir os juros em 2010, como muitos preveem, o problema tenderá a se agravar.

Por Paulo Nogueira Batista Jr., no jornal Folha de S. Paulo

Uma das principais fraquezas da economia brasileira é a força externa da moeda. É exagero falar em hipervalorização do real? Não me parece.


Segundo levantamento da Bloomberg, que inclui 51 moedas, o real foi a que mais se valorizou no ano passado. A apreciação de 2009 se soma a vários anos de alta do real.

Em termos reais, a taxa efetiva de câmbio -calculada em relação a uma cesta de 15 moedas e ajustada por índices de preços ao consumidor- subiu mais de 40% desde dezembro de 2003, segundo estimativa do Banco Central. A Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex) obtém o mesmo resultado para esse período, calculando a taxa efetiva com base em 13 taxas bilaterais de câmbio.

Parte dessa valorização era inevitável. Ela reflete, em parte, os avanços do Brasil nos anos recentes. Mas, em 2009, chegamos a um ponto claramente problemático. É uma ilusão pensar que essa enorme apreciação cambial possa ser compensada por ganhos de produtividade ou reformas estruturais, como alguns economistas sustentam. E se o Banco Central resolver subir os juros em 2010, como muitos preveem, o problema tenderá a se agravar.

As consequências de uma grande e persistente sobrevalorização são velhas conhecidas nossas. A cada semana que passa, aparecem projeções piores para o balanço de pagamentos em 2010. O superavit comercial, que chegava a mais de US$ 40 bilhões por ano entre 2005 e 2007, ficou em US$ 25 bilhões em 2009 e deve cair para US$ 11 bilhões em 2010, segundo projeções de analistas do mercado coletadas pelo Banco Central (relatório Focus).

O mesmo relatório Focus aponta para um deficit no balanço de pagamentos em conta corrente de mais de US$ 40 bilhões neste ano (mediana das projeções). Alguns bancos calculam um deficit ainda maior. O Itaú Unibanco, por exemplo, projeta desequilíbrio de US$ 60 bilhões, o equivalente a mais de 3% do PIB (Produto Interno Bruto).

O resultado vai depender também do ritmo de expansão da economia brasileira. Um crescimento rápido da demanda interna, aliado à moeda valorizada, é a combinação ideal para produzir desequilíbrios perigosos em conta corrente.

O crescimento da economia pode refletir, por sua vez, uma política fiscal excessivamente expansiva. Ou, ainda, a ampliação do crédito induzida por entradas de capital estrangeiro. A oferta excedente de capital externo contribui, portanto, duplamente para o problema. Por um lado, leva diretamente à valorização da moeda nacional. Por outro, induz a expansão do crédito e da demanda agregada, reforçando a pressão sobre as contas externas.

Não se deve perder de vista que a persistente sobrevalorização do real tem também implicações de médio e longo prazos para a estrutura da economia. Pode afetar, por exemplo, o setor industrial e levar a uma diminuição do grau de diversificação da economia e da pauta de exportações. Esse processo parece já ter começado. Segundo a Funcex, o quantum exportado de produtos manufaturados acusou queda de nada menos que 25% no período janeiro-novembro de 2009 em relação a igual período de 2008.

Os manufaturados, que costumam ser mais sensíveis aos movimentos do câmbio, vêm perdendo peso relativo nas exportações do país. No exterior, a economia brasileira continua sendo celebrada em prosa e verso. Hora de se acautelar.

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