terça-feira, 15 de dezembro de 2009

REFLEXÕES DE FIDEL- Mensagem a Hugo Chaves.

C U B A

Havana. 15 de dezembro, de 2009


Reflexões de Fidel
Mensagem ao presidente da República Bolivariana da Venezuela
(Extraído do Cubadebate)

Caro Hugo:

• COMPLETAM-SE hoje 15 anos do nosso encontro na Aula Magna da Universidade de Havana, em 14 de dezembro de 1994. Na noite anterior, tinha esperado você ao pé da escada do avião que o trouxe a Cuba.

Conhecia do seu levantamento em armas contra o governo pró-ianque da Venezuela. Em Cuba tinham chegado notícias de suas idéias quando estava na cadeia, e tal como nós, consagrava-se ao aprofundamento do pensamento revolucionário que o levou ao levantamento de 4 de fevereiro de 1992.

Na Aula Magna, de forma espontânea e transparente, você exprimiu as idéias bolivarianas que levava dentro de si, e que lhe conduziram, nas condições específicas do seu país e da nossa época, à luta pela independência da Venezuela contra a tirania do império. Depois do esforço de Bolívar e demais colossos que, plenos de sonhos lutaram contra o jugo colonial espanhol, a independência da Venezuela era apenas uma ridícula aparência.

Nenhum minuto da história é igual a outro; nenhuma idéia ou acontecimento humano pode ser julgado fora de sua própria época. Tanto você quanto eu partimos de conceitos que foram evoluindo ao longo de milênios, mas têm muito em comum com a história longínqua ou recente em que a divisão da sociedade em donos e escravos, exploradores e explorados, opressores e oprimidos sempre foi antipática e odiosa. Na época atual, constitui a maior vergonha e a principal causa da infelicidade e do sofrimento dos seres humanos.

Quando a produtividade do trabalho, apoiada hoje na tecnologia e na ciência, se multiplicou por dezenas e em alguns aspectos centenas e até milhares de vezes, tais e tão injustas diferenças deviam desaparecer.

Você, eu e conosco, milhões de venezuelanos e cubanos, partilhamos dessas idéias.

Você partiu dos princípios cristãos que lhe inculcaram e um caráter rebelde; eu, das idéias de Marx e um caráter também rebelde.

Há princípios éticos universalmente admitidos que são válidos tanto para um cristão, como para um marxista.

Desse ponto de partida, as idéias revolucionárias se enriquecem constantemente com o estudo e a experiência.

Resulta conveniente sublinhar que nossa amizade sincera e revolucionária surge quando você não era presidente da Venezuela. Nunca lhe pedi nada. Quando o movimento bolivariano obteve a vitória, nas eleições de 1999, o petróleo valia menos de 10 dólares o barril. Lembro bem disso porque você me convidou a sua tomada de posse.

O seu apoio a Cuba foi espontâneo, como sempre o foi nossa cooperação com o irmão povo da Venezuela.

Em pleno período especial, quando a URSS desabou, o império endureceu seu brutal bloqueio contra nosso povo. Em um determinado momento, os preços do combustível ficaram elevados e nossos fornecimentos se tornaram difíceis. Você garantiu o fornecimento comercial seguro e estável ao nosso país.

Não podemos esquecer que, depois do golpe político contra a Revolução Bolivariana, em abril de 2002, e sua brilhante vitória frente ao golpe petroleiro a finais desse próprio ano, os preços se elevaram acima de 60 dólares o barril, e aí você nos ofereceu o fornecimento de combustível e facilidades de pagamento. Bush já era Presidente dos Estados Unidos e foi o autor daquelas ações ilegais e traidoras contra o povo da Venezuela.

Lembro-me o quanto se indignou você com que ele exigisse minha saída do México, como condição para aterrar nesse sofrido país, onde você e eu participávamos em uma conferência internacional das Nações Unidas em que também ele devia comparecer.

À Revolução Bolivariana nunca lhe perdoarão seu apoio a Cuba, quando o império imaginou que nosso povo, depois de quase meio século de resistência heróica, cairia de novo em suas mãos. Em Miami, a contra-revolução reclamava três dias de licença para matar revolucionários, logo que se instaurasse o governo de transição em Cuba que Bush exigia.

Já decorreram dez anos de exemplar e frutuosa cooperação entre a Venezuela e Cuba. A ALBA nasceu nesse período. Tinha fracassado a ALCA ―promovida pelos Estados Unidos― mas o império está de novo à ofensiva.

O golpe de Estado em Honduras e o estabelecimento de sete bases militares na Colômbia, são fatos recentes acontecidos depois da tomada de posse do novo Presidente dos Estados Unidos. Seu predecessor já tinha restabelecido a IV Frota, meio século depois de finalizada a última contenda mundial, e não existia nem Guerra Fria, nem a União Soviética. São óbvias as intenções reais do império, desta vez, sob o sorriso amável e o rosto afro-americano de Barack Obama.

Daniel Ortega explicou ontem a forma em que o golpe em Honduras determinou o enfraquecimento e a conduta dos membros do Sistema da Integração Centro-Americana.

O império mobiliza atrás de si as forças de direita da América Latina para golpear a Venezuela, e com ela, aos Estados da ALBA. Se conseguisse apoderar-se de novo dos quantiosos recursos petroleiros e de gás da Pátria de Bolívar, os países do Caribe anglófono e outros da América Central perderão as generosas condições de fornecimento que hoje a Venezuela revolucionária lhes oferece.

Há uns dias, após o discurso pronunciado pelo presidente Barack Obama, na escola militar de West Point, para anunciar o envio de 30 mil soldados à guerra do Afeganistão, escrevi uma reflexão na qual qualificava de ato cínico aceitar o Prêmio Nobel da Paz quando já tinha adotado essa decisão.

No passado 10 de dezembro, ao proferir em Oslo o discurso de aceitação, fez afirmações que constituem um exemplo da lógica e do pensamento imperialista. “…sou responsável pelo desdobramento de milhares de jovens para lutarem em um país distante. Alguns matarão. A outros os matarão.”, afirmou, tentando apresentar como uma “guerra justa” a brutal carnificina que leva a cabo naquele distante país, onde a maioria dos que morrem, são povoadores indefesos das aldeias onde explodem as bombas lançadas por aviões não-tripulados.

Depois dessas frases, pronunciadas entre as primeiras, dedica mais de 4.600 palavras a apresentar a chacina de civis como guerra justa. “Nas guerras de hoje ―afirmou― morrem muitos mais civis do que soldados”.

Ultrapassam o milhão de civis não-combatentes os que já morreram no Iraque e no Afeganistão e na fronteira do Paquistão.

Nesse mesmo discurso elogia Nixon e Reagan, como personagens ilustres, sem se deter a lembrar que um deles jogou mais de um milhão de toneladas de bombas no Vietnã, e o outro fez explodir, por meios eletrônicos, o gasoduto da Sibéria, sob a aparência de um acidente. Foi tão forte e destruidora a explosão que os aparelhos monitores dos testes nucleares a registraram.

O discurso pronunciado em Oslo se diferencia do de West Point, porque o proferido na academia militar estava mais bem elaborado e declamado. No discurso na capital da Noruega, o rosto do orador expressava a consciência da falsidade de suas palavras.

O momento e as circunstâncias também não eram iguais. Oslo se localiza nas proximidades de Copenhague. Neste ponto, tem lugar a importantíssima Conferência sobre a Mudança Climática, onde sei que você e Evo pensam participar. Naquele lugar se trava, nestes momentos, a batalha política mais importante da história humana. Ali se pode constatar em toda sua magnitude, quanto prejuízo tem ocasionado à humanidade o capitalismo desenvolvido. Hoje, a humanidade deve lutar desesperadamente não só pela justiça, mas também pela sobrevivência da espécie.

Acompanhei de perto a reunião da ALBA. Meus parabéns para todos. Desfrutei imenso ao ver tantos e tão queridos amigos elaborando idéias e lutando unidos. Meus parabéns para todos.

Até à vitória sempre!

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