terça-feira, 24 de agosto de 2010

REFLEXÕES DE FIDEL - "Estou pronto para continuar discutindo.

Em mais um artigo da sua série de Reflexões, o dirigente da Revolução Cubana, Fidel Castro, discorre sobre o perigo da guerra nuclear e comenta o papel do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, para "evitar o desastre"
Há dois dias, eu observava Vanessa Davies em seu programa “Contragolpe”, no canal 8 da Rede Venezuelana de Televisão. Ela dialogava e multiplicava suas perguntas a Basem Tajeldine, venezuelano inteligente e honesto que transpirava nobreza em seu rosto. No momento em que liguei a televisão, estava sendo abordada a minha tese de que somente Obama podia deter o desastre.

De imediato, vinha à mente do historiador a ideia do incomensurável poder que lhe era atribuído. E é assim, sem nenhuma dúvida. Mas estamos pensando em dois poderes distintos.

O poder político real nos Estados Unidos é ostentado pela poderosa oligarquia dos multimilionários, que governam não só esse país mas também o mundo: o gigantesco poder do Clube Bilderberg que Daniel Estulin descreve, criado pelos Rockfeller e a Comissão Trilateral.

O aparato militar dos Estados Unidos com seus organismos de segurança, é muito mais poderoso que Barack Obama, presidente dos Estados Unidos. Ele não criou esse aparato, nem tampouco o aparato o criou. Foram as condições excepcionais da crise econômica e a guerra os fatores principais que levaram um descendente do setor mais discriminado dos Estados Unidos, dotado de cultura e inteligência, ao cargo que ocupa.

Em que radica o poder de Obama neste momento? Por que eu afirmo que a guerra ou a paz dependerão dele? Oxalá o intercâmbio de opiniões entre a jornalista e o historiador sirva para ilustrar o assunto.

Direi de outra forma: a famosa maleta com as senhas e o botão para lançar uma bomba nuclear surgiu por motivo da terrível decisão que isto implicava, o caráter devastador da arma, e a necessidade de não perder uma fração de minuto. Kennedy e Kruschov passaram por essa experiência e Cuba esteve a ponto de ser o primeiro alvo de um ataque maciço com tais armas.

Ainda recordo a angústia refletida nas perguntas que Kennedy indicou que o jornalista francês Jean Daniel me formulasse, quando soube que este viria a Cuba e se reuniria comigo. “Castro sabe o quão próximo estivemos de uma guerra mundial?” Indicou que regressasse a Washington para conversar com ele. É uma história bem conhecida.

O tema era tão interessante que o convidei a sair de Havana e estávamos abordando o assunto em hora avançada já de manhã, em uma casa próxima ao mar na famosa praia de Varadero.

Ninguém precisou nos contar nada, porque de imediato me avisaram sobre o atentado e sintonizamos uma rádio dos Estados Unidos. Naquele mesmo instante se informava que vários disparos haviam ferido de morte o presidente dos Estados Unidos.

Mãos mercenárias haviam levado a cabo o homicídio.

Para a direita dos Estados Unidos,incluindo os mercenários da CIA que desembarcaram em Girón, Kennedy não era suficientemente enérgico com Cuba.

Desde então transcorreu quase meio século. O mundo mudou, muito mais de 20 mil armas nucleares foram desenvolvidas, seu poder destruidor equivale a quase 450 mil vezes ao da que destruiu a cidade de Hiroshima. Qualquer pessoa tem direito de se perguntar: para que serve a maleta nuclear? Acaso pode um presidente dirigir algo tão sofisticado e complexo como uma guerra nuclear? nuclear?

Tal maleta é algo tão simbólico como o bastão de mando, que se mantém em mãos do presidente como pura ficção.

O único fato significativo é que nos Estados Unidos há uma Constituição que estabelece que só existe uma pessoa no país que pode dar a ordem de iniciar uma guerra, o que agora é mais importante do que nunca, já que uma guerra nuclear mundial pode ser desencadeada em um minuto e durar talvez um dia.

Então posso fazer várias perguntas. Alguém mais além do presidente pode dar a ordem de iniciar uma guerra? O próprio Kennedy necessitou de outra faculdade para atacar Girón e depois desencadeá-la no Vietnã? Johnson necessitou de outra faculdade para escalá-la? E Nixon para bombardear demolidoramente esse país? Reagan para invadir Granada? Bush pai para em 20 de dezembro de 1989 atacar as cidades do Panamá e Colón, demolir o bairro pobre de El Chorrillo e ali matar milhares de pessoas pobres? Clinton necessitou de outra faculdade para atacar a Sérvia e criar Kosovo? E Bush filho para a atroz invasão do Iraque? Menciono pela ordem apenas vários dos feitos mais conhecidos do império. Obama até hoje não fez mais do que receber a herança.

O velho pensamento não se adapta facilmente às novas realidades.

Pois bem. Apresentei a ideia, não de que Obama seja poderoso ou superpoderoso; ele prefere jogar basquete ou pronunciar discursos; outorgaram-lhe, além do mais, o Prêmio Nobel da Paz. Michael Moore o exortou a que o ganhasse agora. Talvez nunca ninguém imaginou, e ele menos do que ninguém, a ideia de que nesta etapa final de 2010, se ele acatar as instruções do Conselho de Segurança das Nações Unidas, ao que talvez o exorte um sul-coreano chamado Ban Ki-moon, será responsável pelo desaparecimento da espécie humana.

Estou pronto para continuar discutindo sobre o tema.

Fidel Castro Ruz
22 de agosto de 2010

Fonte: Prensa Latina

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