quinta-feira, 23 de junho de 2011

A EXPLORAÇÃO DOS PLANOS DE SAÚDE.

Agência Nacional de Saúde Suplementar faz um esforço enorme para fingir que está controlando os planos de saúde.

Carlos Newton

Existem várias maneiras de administrar. Uma delas é simples fingir que está administrando, através da criação de factóides (pseudas realizações). Não significa nada, porque as coisas continuam como estão, mas é de rara eficiência para o “administrador”, porque geralmente consegue mantê-lo no cargo. Esta sistemática está sendo usada com sucesso pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), sempre alvo de muitas críticas, porque teoricamente é responsável pelo atendimento dos planos de saúde.

De acordo com a própria Agência, 9% das reclamações recebidas são sobre demora no atendimento e 60% sobre negativa de cobertura por parte do plano de saúde, segundo as estatísticas do Disque ANS (0800 701 9656), de segunda a sexta-feira, das 8h às 20h.

E o que faz a Agência? Ao invés de cuidar da maioria absoluta das queixas (60%), baixando normas rigorosas para evitar que os planos de saúde neguem cobertura aos segurados, a ANS se preocupa exatamente com as reclamações mínimas (9%), sobre demora no atendimento de médicos, dentistas e laboratórios. E ainda alardeia que, antes de publicar a resolução, realizou consulta pública, quando teria recebido mais de 3 mil sugestões.

Assim, ficou parecendo que está fazendo um grande trabalho, não é mesmo? Mas vamos ver o que aconteceu. A Agência, na realidade, simplesmente estabeleceu prazos para os pacientes serem atendidos pelos médicos e laboratórios e fixou uma multa e caso de descumprimento. Os prazos máximos estipulados variam de três a 21 dias, dependendo da especialidade médica e tipo de atendimento.

Em caso de o usuário não conseguir o serviço e o plano não oferecer alternativa, o consumidor pode procurar atendimento com médico ou dentista não credenciado ao plano e solicitar reembolso à operadora, conforme previsto na Resolução 259, publicada segunda-feira.

As operadoras que descumprirem os prazos poderão ser multadas em até R$ 80 mil ou sofrer intervenção, se é que alguém acredita que a Agência chegaria a tanto. Mas as normas são tão tranqüilas que os próprios representantes das operadoras de planos de saúde avaliam ser factível cumprir os prazos para atendimento dos seus usuários. Em nota, também a Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) disse que os prazos “são razoáveis de serem cumpridos”.
E a própria Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge) afirmou que os prazos já vêm sendo praticados pelo mercado, e llembrou que a marcação de consultas ou exames é controlada exclusivamente pelos médicos ou laboratórios.

Traduzindo: é tudo uma grande conversa fiada. Os clientes de planos de saúde raramente reclamam de demora para serem atendidos em consultórios ou para fazer exames. Em praticamente todos os planos, o número de médicos, dentistas e laboratórios é enorme. São múltiplas as opções, sem falar que, em último caso, basta recorrer às emergências dos hospitais conveniados, que atendem a qualquer tipo de doença, indistintamente.

Na verdade, aqueles 9% de reclamações se referem quase sempre à demora na realização de cirurgias, partos tipo cesariana e outros procedimentos médicos que exigem marcação com antecedência e existência de vagas nas salas de operações e até nas UTIs, de acordo com a complexidade do caso.

Note-se, portanto, a criativa ardilosidade da Agência Nacional de Saúde Suplementar, “mostrando serviço” ao estabelecer normas absolutamente desnecessárias, com multa rigorosa que jamais será aplicada.

Mas é para isso que foram criadas no governo FHC as tais agências reguladoras? Temos agências para tudo: telecomunicações, aviação civil, transportes, previdência privada, petróleo e por aí a fora. Nenhuma delas funciona. São apenas cabides de empregos, com altos salários e ingresso sem concurso público, unicamente via apadrinhamento político. Recentemente, o deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) e o ex-ministro José Dirceu estavam brigando para nomear o presidente da Agência Nacional de Telecomunicações.

E o pior é que um jornal como O Globo, carro-chefe do maior grupo de comunicação do país, dá uma notícia factóide dessas como manchete. Não é preciso dizer mais nada. Este é o país em que vivemos.
Fonte: Tribuna da Imprensa.

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