Rua Tutóia, 921: de centro de tortura a memorial das vítimas
Um dos maiores centros de tortura no regime militar, o antigo prédio do DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operação de Defesa Interna), localizado na rua Tutóia 921, em São Paulo, poderá se transformar em um museu da tortura ou memorial às vítimas da ditadura militar.
Nesta semana (3ª feira), ex-presos políticos e representantes de entidades dos Direitos Humanos, como o Grupo Tortura Nunca Mais, o Comitê pela Memória, Verdade e Justiça e a Comissão dos Direitos Humanos da OAB-SP fizeram uma vistoria na antiga sede da Operação Bandeirantes (OBAN), onde atualmente funciona o 36º Distrito Policial da capital.
O objetivo foi fazer um diagnóstico das condições de preservação com vistas à proposta de transformar o local em museu ou memorial, evitando futuras deteriorações no imóvel, cujo tombamento está sendo estudado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (CONDEPHAAT). A partir de agora, um relatório será elaborado e apresentado ao Comitê Interamericano dos Direitos Humanos e às comissões da Verdade do município.
43 anos depois...
Darci Miyaki e Antonio Carlos Fon em frente ao prédio onde funcionou o DOI-CODI em São Paulo
Pela primeira vez, depois de todos esses anos, ex-presos políticos voltaram ao local. Recomendo a todos que leiam o depoimento do jornalista Antônio Carlos Fon sobre o que considerou um “dia doloroso, mas essencial para entender muita coisa sobre nosso passado, presente e futuro” (leia a íntegra aqui).
Fon conta que sua pressão arterial chegou a 18 ou 19. “Tive de sentar nas escadas para recuperar o fôlego. E consegui, finalmente, entender um detalhe que não conseguia explicar: por que eu não ouvi os gritos do jornalista Celso Horta, torturado na outra câmara de torturas, separada da minha apenas por uma divisória de Eucatex, e ouvi os assassinos do Jonas enquanto o interrogavam? Quem matou a charada foi a Darci [Miyaki], que passou por essa experiência inúmeras vezes: a gente não ouve os gritos das outras pessoas enquanto nós mesmos estamos gritando.”
Ele também destaca a importância desta vistoria: "Pudemos comprovar que foram e estão sendo feitas mudanças para descaracterizar o que foi o maior centro de torturas já instalado neste país”. E conclui trazendo um importante alerta aos brasileiros: “Saí com a impressão de que nós e nossos companheiros continuamos a ser torturados. E que as Forças Armadas precisam decidir se vão continuar, por puro espírito de corpo, a defender e procurar encobrir os crimes desses criminosos ou vão renegá-los para ajudar a construir o Brasil que todos nós queremos”.
Leiam também "Delegacia era fachada do centro de tortura", entrevista com o deputado Adriano Diogo.
(Foto protesto: Marcelo Camargo/ABr; foto DOI-CODI: portal O Vermelho)
Nesta semana (3ª feira), ex-presos políticos e representantes de entidades dos Direitos Humanos, como o Grupo Tortura Nunca Mais, o Comitê pela Memória, Verdade e Justiça e a Comissão dos Direitos Humanos da OAB-SP fizeram uma vistoria na antiga sede da Operação Bandeirantes (OBAN), onde atualmente funciona o 36º Distrito Policial da capital.
O objetivo foi fazer um diagnóstico das condições de preservação com vistas à proposta de transformar o local em museu ou memorial, evitando futuras deteriorações no imóvel, cujo tombamento está sendo estudado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (CONDEPHAAT). A partir de agora, um relatório será elaborado e apresentado ao Comitê Interamericano dos Direitos Humanos e às comissões da Verdade do município.
43 anos depois...
Darci Miyaki e Antonio Carlos Fon em frente ao prédio onde funcionou o DOI-CODI em São Paulo
Pela primeira vez, depois de todos esses anos, ex-presos políticos voltaram ao local. Recomendo a todos que leiam o depoimento do jornalista Antônio Carlos Fon sobre o que considerou um “dia doloroso, mas essencial para entender muita coisa sobre nosso passado, presente e futuro” (leia a íntegra aqui).
Fon conta que sua pressão arterial chegou a 18 ou 19. “Tive de sentar nas escadas para recuperar o fôlego. E consegui, finalmente, entender um detalhe que não conseguia explicar: por que eu não ouvi os gritos do jornalista Celso Horta, torturado na outra câmara de torturas, separada da minha apenas por uma divisória de Eucatex, e ouvi os assassinos do Jonas enquanto o interrogavam? Quem matou a charada foi a Darci [Miyaki], que passou por essa experiência inúmeras vezes: a gente não ouve os gritos das outras pessoas enquanto nós mesmos estamos gritando.”
Ele também destaca a importância desta vistoria: "Pudemos comprovar que foram e estão sendo feitas mudanças para descaracterizar o que foi o maior centro de torturas já instalado neste país”. E conclui trazendo um importante alerta aos brasileiros: “Saí com a impressão de que nós e nossos companheiros continuamos a ser torturados. E que as Forças Armadas precisam decidir se vão continuar, por puro espírito de corpo, a defender e procurar encobrir os crimes desses criminosos ou vão renegá-los para ajudar a construir o Brasil que todos nós queremos”.
Leiam também "Delegacia era fachada do centro de tortura", entrevista com o deputado Adriano Diogo.
(Foto protesto: Marcelo Camargo/ABr; foto DOI-CODI: portal O Vermelho)
Delegacia era fachada do centro de tortura
Publicado em 31-Jan-2013
Qual o papel do antigo prédio do DOI-CODI, na rua Tutóia, durante a repressão?
Adriano Diogo O prédio da OBAN foi a materialização repressiva do AI-5. O mais importante centro de repressão do país e seu grande núcleo clandestino. Ali, pela primeira vez, a ditadura militar juntou agentes federais, militares e polícia de São Paulo na criação de um “pull” de inteligência, logística e repressão à esquerda e aos demais perseguidos pela ditadura militar.
Muitos pensam que só os paulistas foram presos e investigados ali. Em suas dependências morreram Vladimir Herzog, o Manoel Fiel Filho, o Alexandre Vannuchi, o Virgílio Gomes da Silva e tantos outros. Mas, é bom lembrar que as ordens para eliminar as pessoas na Guerrilha do Araguaia, no massacre em Pernambuco que teve colaboração do Cabo Anselmo, ou o David Capistrano na fronteira com a Argentina, e todo o comando repressivo saíam da rua Tutóia. Tudo. Era lá o núcleo pensante albergado no II Exército, comandado durante um longo período pelo atual general Carlos Alberto Brilhante Ustra.
Por que um museu ou memorial?
Adriano Diogo Há nos capítulos das Comissãos da Verdade, no mundo todo, lugares chamados sítios da memória. Os campos de concentração da Alemanha nazista, por exemplo, são sítios da memória. Tratam-se de museus permanentes abertos à visitação pública, onde estão registradas todas as pessoas que lá estiveram presas ou foram mortas e o nome dos seus algozes. Na Argentina, o sítio da memória localiza-se na ESMA – Escola Superior de Militares da Armada, em Buenos Aires.
Aqui no Brasil, o único sítio da memória (da resistência pela democracia) preservado é o Memorial da Resistência (antigo sede do DOPS paulista). Já a 19º estrela no site da PM é uma referência ao Golpe Militar, sem falar de escolas e ruas que trazem os nomes do Filinto Muller, Sérgio Paranhos Fleury... Há muitos sítios que continuam com essas loucuras. Agora, o prédio mais significativo (para memória da resistência), obviamente, é o prédio da OBAN (Tutóia), onde hoje funciona uma delegacia.
Como está a preservação deste sítio?
Adriano Diogo Embora eles digam que uma coisa é a delegacia e outra os fundos dela - onde ficavam os centros de tortura -, nada foi feito para preservar esse sítio de memória. Tampouco para resgatar o que ocorreu. E pior: na delegacia onde na ditadura ficavam celas dos prisioneiros políticos, continua funcionando como uma delegacia até hoje. Essa delegacia era uma fachada legal à época para o centro de tortura nos fundos do terreno. Em 1979, o então governador Paulo Maluf, durante a votação da anistia, para dar uma bofetada na dignidade dos brasieiros, cedeu através de um decreto estadual aquele terreno todo ao II Exército.
No decreto está escrito “para o DOI-CODI”, que era o nome regular, legal, da Operação Bandeirantes. Este decreto não foi revogado até hoje e nós da Comissão da Verdade estamos entrando com um pedido para que haja a sua revogação. Os dois prédios estão isolados. Nos fundos, ocorriam os interrogatórios e as sessões de tortura. O que não ficou claro - é importante frisar - é que no prédio onde hoje funciona a delegacia ficavam as celas: a cela forte, uma solitária terrível; e mais seis celas. Todas funcionavam dentro do prédio da atual delegacia, lá embaixo. Ontem, nós não conseguimos acessar essas partes, mas temos as fotos do processo de tombamento destas antigas celas que foram modificadas e hoje são salas.
Fundos da 36ª Delegacia de Polícia de São Paulo, onde funcionava a OBAN
Como está o processo de tombamento?
Adriano Diogo Está indo bem. Só temos elogios ao Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo (CONDEPHAAT), embora exista o problema da morosidade. Mas há uma compreensão da importância deste processo e ele está sendo acompanhado.
Em tempo: aproveito para recomendar, neste 31 de janeiro, a leitura do artigo de Max Altman "Stalingrado salvou a humanidade da sanha nazi-fascista". Há exatos 70 anos, os russos venciam os alemães em uma das mais sangrentas batalhas da história.