sexta-feira, 15 de março de 2024

A morte do esporte olímpico.

 Política

Marcelo Zero: A morte do esporte olímpico

 Tempo de leitura: 3 min

A Morte do Espírito Olímpico

Por Marcelo Zero*

O esporte olímpico nasceu, como se sabe, para unir cidades rivais da Antiga Grécia. Tratava-se de canalizar conflitos e tensões no esporte e propiciar, dessa forma, um ambiente de paz.

As olimpíadas modernas, criadas por Pierre de Coubertin, também estavam baseadas no mesmo “espírito olímpico”.

Pois bem, o “Espírito Olímpico” (Olympic Spirit) é, hoje, um programa oficialmente sancionado pelo Comitê Olímpico Internacional (COI).

A missão do Espírito Olímpico é “construir um mundo pacífico e melhor, que requer compreensão mútua, com um espírito de amizade, solidariedade e jogo limpo. O Espírito Olímpico se esforça para inspirar e motivar os jovens do mundo a serem os melhores que puderem. O Espírito Olímpico procura incutir e desenvolver os valores e ideais do “Olimpismo” naqueles que o visitam e promover a tolerância e a compreensão, nestes tempos cada vez mais conturbados em que vivemos, para tornar o nosso mundo um lugar mais pacífico “.

Muito meritório, é claro.

Entretanto, a discriminação política no esporte e contra atletas vem de longe.

Em 1980, os EUA e o bloco ocidental resolveram boicotar as Olimpíadas de Moscou, alegando que a então União Soviética estava intervindo no Afeganistão.

A hipocrisia da justificativa era descomunal, tratando-se de um país tão intervencionista quanto os EUA.

Mas, de qualquer forma, o boicote, que contrariava frontalmente o “espírito olímpico”, foi realizado, prejudicando toda uma geração de atletas, que tiveram de renunciar ao “sonho olímpico” e passaram a viver o pesadelo das discriminações geopolíticas contra o esporte.

Mais recentemente, em razão do conflito ucraniano e das sanções ilegais a ele associadas, atletas russos e bielorrussos são submetidos a regras realmente humilhantes para poderem participar de eventos esportivos, inclusive nas próximas de Olimpíadas de Paris.

Tais atletas, além de não poderem usar uniformes de seus países, não poderem envergar quaisquer símbolos vinculados às suas nacionalidades e não poderem ouvir seus hinos, não podem também ter manifestado qualquer apoio a seus países, em relação ao conflito com a Ucrânia.

Assim, se um atleta russo ou bielorusso tiver, de qualquer modo, expressado apoio ao seu país ou ter, ainda, criticado a Otan, ele estará automaticamente banido das próximas Olimpíadas.

Já os atletas ucranianos ou de quaisquer países da Otan não enfrentam restrições e, podem, evidentemente, se manifestar da forma que quiserem sobre o conflito, inclusive durante os eventos esportivos. É o que se vê, hoje, em abundância, nas competições esportivas.

O Comitê Olímpico Russo já denunciou a confirmação pelo Tribunal Arbitral do Esporte (TAS) de sua suspensão como uma “discriminação sem precedentes” contra seus atletas, submetidos a “critérios humilhantes para poderem participar das Olimpíadas de 2024”.

Ao acusar o TAS de ter “ignorado os diversos argumentos jurídicos” apresentados pela Rússia, o Comitê Olímpico Russo (ROC), manifestou, em um comunicado àquela instância, com sede em Lausanne, Suíça, de atuar como “um instrumento político” a serviço do Ocidente.

“Há muito tempo, o Tribunal Arbitral do Esporte perdeu a sua objetividade em tudo que é relativo à Rússia“, afirmou a organização olímpica russa, apontando uma “discriminação esportiva contra os russos, que alcançou proporções sem precedentes”.

A Rússia também acusou o Comitê Olímpico Internacional (COI) de “fazer todo o possível para diminuir o número de atletas (russos) convidados” para participar das Olimpíadas de Paris, e de lhes impor “critérios humilhantes para poder participar do grande evento”.

Evidentemente, tudo isso contraria o “espírito olímpico”, tanto o espírito propriamente dito quanto programa do COI acima citado.

Lembramos, adicionalmente, que quaisquer sanções internacionais só são legais, perante a ordem mundial, quando aprovadas pelo Conselho de Segurança da ONU.

Os símbolos nacionais da Rússia não pertencem ao atual governo russo e os atletas russos não representam o governo; representam seu país, inclusive a fração da população que não vota em Putin.

A russofobia no esporte não contribuirá em nada para a paz. Ao contrário, tende a exacerbar o ódio e o conflito.

É a morte do espírito olímpico.

*Marcelo Zero é sociólogo e especialista em Relações Internacionais.

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