No dia 12 de outubro de 1939, o "Brigadeführer" da SS nazista Christoph Diehl ordenou que o distrito de Orlowo, na cidade polonesa de Gdynia, deveria ser totalmente evacuado até as nove horas da manhã daquela quinta-feira. Os apartamentos deveriam ser deixados abertos, com as chaves no chão em frente às portas de entrada. Permanecer em casa depois das 9h seria considerado um ato de sabotagem.
Cada pessoa estava autorizada a levar apenas uma bagagem de mão, com roupas e pequenos objetos pessoais. O resto deveria ficar para trás. Qualquer depredação do mobiliário ou da estrutura das moradias seria, igualmente, um ato de sabotagem. Todos tiveram 20 minutos para cumprir todas as ordens. Os "sabotadores", os desobedientes e os que fossem pegos armados seriam punidos com execução.
Este foi apenas o primeiro desalojamento em massa promovido pelos alemães nesta pequena cidade portuária localizada na costa norte da Polônia, às margens do mar Báltico.
No entanto, desde o primeiro dia da ocupação de Gdynia -- 14 de setembro de 1939 --, todos aqueles que poderiam oferecer ou organizar resistência aos nazistas foram presos, e em seguida enviados a campos de concentração ou assassinados nas florestas próximas. Muitos outros, alistados no exército polonês, morreram em combate ou foram feitos prisioneiros de guerra. O fato é que, antes da II Guerra Mundial, 120 mil pessoas viviam na cidade; depois, restavam 30 mil. Vivos ou mortos, onde foram parar?
Para tentar achar respostas, no último dia 1º de setembro -- aniversário da invasão da Polônia, em 1939 -- a prefeitura lançou um site chamado "Gdynia durante a II Guerra Mundial". O objetivo é aproveitar as possibilidades oferecidas pelo meio online para descobrir o paradeiro de quase 90 mil pessoas, que podem ter sido mortas, deportadas ou simplesmente emigraram e não deram mais notícias.
À primeira vista, a inciativa esbarra na dificuldade prática de que os sobreviventes provavelmente não são pessoas habituadas a navegar pela internet. Mas os organizadores acreditam que eles poderão ser avisados sobre a campanha por terceiros. Na primeira semana em que o site esteve no ar, dez pessoas apareceram -- em nome próprio ou referidas por conhecidos.
Além de ser um esforço para reconstituir a História, o projeto tem ainda um caráter mais pragmático: fazer justiça quanto às propriedades perdidas nos tempos de guerra.
Entre todos os países envolvidos na II Guerra Mundial, a Polônia foi aquele que teve a maior perda relativa de vidas humanas. Dezesseis por cento dos seus habitantes morreram em razão do conflito -- estima-se que a população polonesa na época era de 35,1 milhões de pessoas. Quanto às perdas materiais, as estimativas oficiais dão conta de que elas somaram o equivalente a dez vezes o valor do orçamento do Estado polonês para o biênio 1939/1940.
Na Polônia, entretanto, a percepção é de que os números que pretendem traduzir os sofrimentos e prejuízos causados à população do país são marcados pela pouca transparência e pela falta de esmero em um levantamento fiel ao que realmente aconteceu. A ocupação dos soviéticos, subseqüente à guerra, teria contribuído para a falta de dados confiáveis sobre o tamanho da catástrofe que se abateu sobre o país até meados dos anos 1940. As autoridades comunistas, dizem os poloneses, não quiseram ou não puderam mostrar o que realmente aconteceu.
Ainda hoje, 63 anos depois da II Guerra Mundial, o balanço daqueles anos nos territórios poloneses invadidos pelo III Reich permanece em relativa obscuridade. E o pior: à medida que o tempo passa, fica cada vez mais difícil jogar luz sobre os fatos do passado. As testemunhas vão envelhecendo e morrendo, e os documentos se deterioram ou mesmo desaparecem. No caso de Gdynia, as fontes escritas sobre a repressão aos cidadãos da cidade são incompletas, dispersas, ou sequer chegaram a ser elaboradas.
Lendo um pequeno trecho do livro "História de Gdynia", do professor R. Wapiński -- uma das mais importantes publicações sobre a cidade --, pode-se ter uma idéia do que representa o drama da falta de informações:
"O número exato de cidadãos de Gdynia assassinados ou desaparecidos é difícil de ser estimado. As fontes de dados não abrangem todas as pessoas e estão cheias de imprecisões, o que dificulta identificar a real a extensão das perdas. Portanto, podemos citar como vítimas do terror nazista apenas 15 conselheiros da Câmara de Indústria e Comércio, 12 professores, 14 padres, 65 funcionários poloneses da Western Union, 24 oficiais de polícia, 10 colaboradores da Câmara Marítima, 10 meninos e 31 comerciantes".
Ou seja, os documentos existentes dão conta de apenas 181 mortos. Agora, além da vontade política de trazer a verdade à tona, Gdynia recorre à alta tecnologia, conta com recursos públicos e aposta na cooperação e na solidariedade para preencher a sua lacuna particular, entre as tantas deixadas mundo afora pelos horrores daquela e de outras guerras.
Fonte:Blog Opinião&Notícia.
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