quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

POLÍTICA - Comunismo e capitalismo no século XXI, por Marcelo Uchôa

Arte Cildo Meireles
Comunismo e capitalismo no século XXI
por Marcelo Uchôa
O comunismo não deveria ser uma opção deveria ser uma obrigação. Uma sociedade justificada falsamente no ideário da liberdade, em que um núcleo mínimo de beneficiados explora e expolia a grandíssima maioria de povos e populações do mundo inteiro, inclusive, comprometendo substancialmente os recursos naturais do planeta, é uma sociedade falida, escorada num modelo econômico inequivocamente fadado ao fracasso. 
Falácia como a da justeza do capitalismo é a da democracia contada em votos. Ao contrário do Brasil, nos EUA, Inglaterra, dezenas e dezenas de outras nações consideradas exemplos de democracia, também não contam sua expressão democrática em votos.
A fórmula da democracia contada em votos foi a fórmula com que a burguesia ludibriou a classe média nacional para achar que fosse o modelo mais justo. Bobagem. Funcionou relativamente bem no país, mas quando a mesma burguesia percebeu que não venceria processos eleitorais em número de votos, rasgou o compromisso que havia assumido, patrocinou  um golpe institucional sobre uma presidenta legitimamente eleita e encarcerou o concorrente da esquerda, que virtualmente seria eleito o próximo Presidente da República. 
Para consolidar sua vitória, a burguesia forjou um candidato covarde, que fugiu a todos os debates presidenciais e se escondeu atrás de divulgações repulsivas de fake news em redes sociais, bancadas por verdadeiras organizações de elevado capital agindo sob ações tipicamente ilegais.
A burguesia partidária, com apoios das estruturas aristocráticas de poder e da grande massa ignara, manipulada pelos órgãos de comunicação (avessos ao compromisso com a verdade), masoquistamente preferiu entregar a nação às favas, do que honrar um pacto republicano assumido na Constituição. 
Passados três anos do assalto à vontade popular, difícil não mudar radicalmente os parâmetros pessoais sobre a compreensão da democracia. Uma democracia verdadeira não se mede unicamente por votos, nao há relação necessária entre uma coisa e outra. Uma democracia verdadeira se mede por participação popular efetiva nas instâncias de governo, e, sobretudo, no retorno dos benefícios sociais que a maioria necessitada recebe do Estado. Sem benefícios para o povo mais explorado não há como falar-se de democracia. Tudo o que restará é uma autocracia tecnocrata servil àqueles que sempre se beneficiaram do sistema excludente (especialmente, homens, brancos, supostamente heterossexuais, ricos ou mesmo falsos ricos, inocentes úteis por ignorância ou má-fé). 
Não seria impossível um comunismo baseado em pressupostos democráticos, até mesmo porque a experiência estalinista serviu para que se exigissem alternativas menos traumáticas e mais humanamente civilizatórias quanto a isso. Porém, infelizmente, certas coisas não mudariam para uma eventual implantação do comunismo, enquanto sistema que prioriza a coletividade em detrimento do individualismo da acumulação do capital: primeiro, o comunismo só existiria (e subsistiria permanentemente) na hipótese de ser, de fato, uma experiência internacional total; ainda assim, precisaria derrotar definitivamente o capitalismo, o que não se vê provável acontecer, já que a luta dos trabalhadores sequer se sente mais internacional (há muito partidos políticos de esquerda não se programam para interagir globalmente); por último, não apenas pelo enfraquecimento (sucateamento programado) sindical, mas também pelos processos de automação das fábricas, trabalhadores não possuem a mesma força que possuíam no chão da indústria na virada do século XX, a ponto de literalmente pararem a produção se e quando decidissem.
Mas o pior de tudo é que para que o capitalismo sucumba há que se aguardar seu desmonte por suas próprias vias, a partir de suas incoerências fáticas e sistêmicas. Que haja, por exemplo, o estouro de uma bolha financeira infinitamente mais forte que a crise dos subprimes (hipotecária) de 2007. 
Não é improvável que aconteça, pois um sistema econômico que não se sustenta em bases produtivas sólidas, mas, tão-somente, em cascatas especulativas tocadas por manda-chuvas engravatados em Wall Street (que sequer imaginam que por trás de números existem pessoas, famílias, vidas), dia a mais, dia a menos, fugirá a qualquer controle. 
Desgraçadamente, acontecendo uma tragédia assim, os maiores prejudicados serão os que prudentemente guardam seus suados salários de cada mês nos bancos (contribuições previdenciárias idem), porque um dos grandes riscos que o (des)governo eleito promete com a adoção do Estado mínimo (que certamente o presidente  sequer sabe o que significa, já que passou a vida escorado na política, assim como sua prole) é que no momento de uma crise sistêmica pode não haver nenhum Estado para socorrer os que mais precisam. 
Brasileiras e brasileiros sequer sonham que bancos, instituições financeiras, fundos de investimento, factorings usam seu dinheiro apostando diariamente em verdadeiros cassinos especulativos mundo afora. Se um dia uma bolha financeira como a supra citada estourar e o Brasil, por capricho de sua política exterior míope, não tiver mais as parcerias estratégicas que outrora manteve com China, Rússia, Índia, África do Sul, e mesmo com o Mercosul, além de outras, ao contrário, estiver única e exclusivamente na dependência da vontade do Tio Sam, o país não terá outra alternativa: quebrará literalmente.
Mas na pior das hipóteses, se a crise for realmente global e atingir inclusive as nações em desenvolvimento do G20, especialmente as do (B)RICS (o Brasil já era), será difícil crer que o comunismo vingará, mais provável que se instale de vez a barbárie. Mesmo assim, não custa nada que os partidos políticos de esquerda nacionais e internacionais façam seus deveres de casa e estejam adequadamente preparados para funcionarem como partidos revolucionários se assim a história requerer. 
Marcelo Uchôa é Advogado e Professor da UNIFOR

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