quinta-feira, 12 de maio de 2011

A TENSÃO NA CASA BRANCA ANTES DO ASSASSINATO DE BIN LADEN.

Era o segredo mais bem guardado de Barack Obama. Nada do que o presidente dos EUA tinha feito nos dias anteriores permitia suspeitar da iminente operação de uma unidade de elite no Paquistão, com semelhante objetivo. E só um grupo reduzido de pessoas reunidas na Sala de Situação da Casa Branca escutou esta frase no primeiro domingo de maio: "Temos contato visual com Jerônimo".

A reportagem é de Yolanda Monge, publicada pelo jornal El País e reproduzida pelo Portal Uol, 11-05-2011.

Era a voz do diretor da CIA, Leon Panetta, que chegava do quartel-general da CIA do outro lado do rio Potomac, em Langley, Virgínia. O presidente e seus mais próximos colaboradores acompanhavam em uma tela o que acontecia a milhares de quilômetros de distância, no Paquistão. Panetta explicava aos ali reunidos o assalto à casa do líder da Al Qaeda, orientando sobre o curso de uma operação que representaria a consagração ou o naufrágio político do presidente americano.

A foto de um instante, dentro dos 40 minutos que durou o assalto que levou à morte de Osama Bin Laden e outras pessoas que habitavam a casa, já faz parte da história e talvez seja a obra-prima do fotógrafo da Casa Branca, Pete Souza. A gravidade dos gestos dos presentes naquela sala faz supor que o momento captado pelo instantâneo foi o determinante na caça ao inimigo público número 1 dos EUA. Talvez se tratasse do momento de sua morte nas mãos das forças especiais dos Navy Seals, um dos pontos sobre os quais não há informação oficial.

O silêncio que dominava a sala só foi rompido por outra intervenção de Panetta: "Jerônimo EKIA".

EKIA é a sigla de "enemy killed in action" - inimigo morto em combate. "Jerônimo" foi o codinome que a CIA decidiu utilizar para a operação cujo objetivo era acabar com Bin Laden - e cuja escolha levantou certa polêmica entre as associações de indígenas americanos, que o consideram um insulto e um erro. De acordo com a última informação oferecida pela Casa Branca - outras anteriores traziam dados diferentes -, o líder da Al Qaeda estava desarmado, embora pudesse oferecer resistência porque perto dele havia um fuzil AK-47 e uma pistola Makarov.

No meio do caos, e em um ambiente de máxima tensão - o cadáver de Bin Laden jazia no solo, com pelo menos um tiro no olho esquerdo, que estourou parte de sua cabeça, e outro no peito -, um soldado tirou uma foto dele que foi enviada imediatamente a Langley para ser submetida a um reconhecimento facial por computador. A resposta chegou em seguida em forma de porcentagem: havia 99,99% de probabilidade de que o cadáver da foto fosse o de Bin Laden. Provas de DNA posteriores deram o mesmo resultado concludente: 99,99% de coincidência.

"O apanhamos!", exclamou o presidente Obama, a primeira pessoa a romper o silêncio na Sala de Situação depois do anúncio do diretor da CIA. Se tudo continuasse como previsto, a missão estava destinada a ser um êxito. Ficou para trás o temor de Obama sofrer um desastre como os que foram vividos por alguns de seus antecessores no cargo e que acabaram definindo suas presidências.

A reeleição de um presidente anterior, Jimmy Carter, fracassou em parte por causa da tentativa desastrosa de resgatar os reféns americanos retidos durante 444 dias na embaixada dos EUA em Teerã em 1980. Quando a missão se desdobrava, um avião de operações especiais se chocou no ar com um helicóptero da marinha, com o saldo final de oito militares mortos. Depois daquele fiasco, foi criada a hoje famosa Equipe 6 dos Navy Seals, a que matou o terrorista mais procurado de todos os tempos, que só nos EUA causou cerca de 3 mil vítimas fatais.

Fontes próximas ao governo contam que em todas as reuniões que o presidente Obama manteve com seus colaboradores entre os dias 14 de março e 28 de abril surgiram três palavras malditas que ninguém queria ouvir: "Black Hawk down". Uma referência dolorosa, símbolo do fracasso de operações americanas no estrangeiro, tragicamente relacionada à batalha de Mogadíscio, em 1993, quando dois helicópteros Black Hawk - como os utilizados na missão Jerônimo - foram derrubados e 18 soldados americanos morreram na tentativa de sequestrar um chefe guerreiro.

As imagens dos corpos dos militares dos EUA arrastados pelas ruas empoeiradas da capital da Somália se transformaram em um poderoso símbolo nas mãos dos que se opunham à participação de Washington em conflitos fora de suas fronteiras. Bill Clinton, então no comando em Washington, ordenou a retirada das tropas da Somália e prometeu não voltar a mobilizar forças no estrangeiro a menos que se tratasse de um caso de claro interesse nacional.

Passou muito tempo desde então. Na noite do último domingo, pouco mais de 20 membros da elite dos Seals aterrissaram no refúgio de Bin Laden. A equipe tinha partido horas antes a bordo de helicópteros da base militar de Bagram em Cabul (Afeganistão), e depois de uma breve escala em Jalalabad voou para o Paquistão rumo ao lugar onde se encontrava seu alvo. O maior risco da missão era ser detectada e talvez detida pelas autoridades paquistanesas, que desconheciam a existência da operação. Mas a forte presença militar em Abbottabad, uma cidade-quartel que abriga uma academia militar, muito próxima da casa utilizada como esconderijo por Bin Laden, serviu de cobertura perfeita para os propósitos da unidade militar americana, cujos helicópteros passaram despercebidos.

Não houve incidentes quando os soldados escorregaram para o interior do refúgio de Bin Laden. Uma vez no solo, soaram os primeiros tiros e, diante das versões iniciais oferecidas pela Casa Branca, os Seals a todo momento tiveram a situação sob controle. Em nenhum momento existiu fogo cruzado no edifício principal do complexo, onde estava Osama bin Laden.

O primeiro a cair foi Abu Ahmed, o mensageiro e homem de confiança do terrorista, cuja pista havia levado até Bin Laden. O nome do kuwaitiano Abu Ahmed foi obtido no início da guerra contra o terrorismo graças a confissões de prisioneiros em Guantánamo aos quais se aplicou a tortura conhecida como "waterboarding", ou afogamento simulado. Anos mais tarde, com o rastro de Bin Laden perdido e outro inquilino da Casa Branca no poder, agentes paquistaneses a serviço da CIA identificaram o mensageiro do líder da Al Qaeda em uma ruidosa rua de Peshawar. Os agentes anotaram a placa do Suzuki branco que ele conduzia. Naquele momento, julho do ano passado, começou-se a escrever o princípio do fim de Osama bin Laden.

No domingo passado, Abu Ahmed disparou contra os Seals quando se viu a descoberto. Mais foi abatido. Também caiu sob as balas uma mulher que estava perto dele. Os homens das forças especiais iniciaram então sua aproximação da casa principal - estavam na de convidados - e toparam com o irmão de Ahmed, a quem também feriram de morte quando acreditaram que preparava uma arma para disparar. Na subida ao andar superior, o segundo, os Seals mataram Khaled, um dos filhos de Bin Laden, que se encontrava na casa.

Do quartel-general da CIA na Virgínia, Panetta acompanhava os acontecimentos ao vivo. No entanto, o diretor da agência de espionagem reconheceu que houve um período de 20 a 25 minutos no qual não se soube exatamente o que estava acontecendo. Segundo as autoridades americanas, no recinto da casa se encontravam mais de 20 pessoas, incluindo mulheres e crianças. Os atacantes tiveram de determinar em milésimos de segundo quem representava uma ameaça letal e quem não. Haviam sido avisados de que qualquer um poderia estar vestindo um colete carregado de explosivos.

Mais acima, em outro andar, estava a presa que buscavam. Ao entrar em um quarto, os soldados ouviram uma mulher gritar o nome de Bin Laden. Diante de seus olhos se encontrava o homem mais odiado pelos americanos. Os Seals dispararam para matar.

A operação Jerônimo foi concebida desde o início como uma missão para matar, por mais que as autoridades dos EUA insistam em declarar que Bin Laden teria sido capturado com vida se tivesse se rendido.

Os rostos e as atitudes dos personagens fotografados por Pete Souza na Sala de Situação da Casa Branca merecem uma análise. A face do presidente Obama expressa tensão, preocupação, incerteza. A secretária de Estado, Hillary Clinton, leva a mão à boca, afogando um grito, reprimindo uma emoção. Dizem que o vice-presidente, Joe Biden, desfiou as contas de seu rosário durante o tempo que durou a operação.

Das 13 pessoas que aparecem no instantâneo - há o cotovelo e parte da gravata de alguém cujo rosto não faz parte de história porque ficou fora do enquadramento -, só uma ocupa um lugar que não lhe estava reservado na exclusiva. Trata-se do general Marshall B. Webb, número 2 do Comando Conjunto de Operações Especiais, homem carregado de medalhas que ocupa a cadeira destinada ao presidente.

A decisão mais difícil de Obama, a que tomou sabendo que havia no máximo 60% de probabilidade de que Bin Laden se encontrasse na casa - poderia nunca ter estado, já que nunca foi visto -, estava prestes a se traduzir em um sucesso que marcará sua presidência e que já o catapultou nas pesquisas de popularidade entre seus compatriotas.

No local ficaram os sobreviventes da casa, com as mãos amarradas com tiras de plástico, à disposição das autoridades paquistanesas, que se encarregarão deles. Antes de partir, o comando fez explodir o helicóptero avariado no momento de descida sobre a casa de Bin Laden. Então, sem dúvida, muitos vizinhos devem ter despertado, lembrou Panetta nos últimos dias.

Um dos dois helicópteros Chinook que esperavam como reforço, caso algo saísse errado, acudiu como apoio para a saída da Equipe 6. Todos os integrantes do grupo encarregado da incursão iam a bordo. Não houve qualquer baixa americana. Saíam do Paquistão os 24 soldados especiais que tinham executado a operação secreta, mais o grupo de apoio. Levavam também o cadáver de Osama bin Laden, que horas depois seria lançado ao mar do porta-aviões USS Carl Vinson, situado no mar Arábico.

FONTE: IHU

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