Por ANTONIO ATEU

Do Esquerda.Net

“Não há direção política na UE”

Num comentário sobre a crise do Chipre na sexta-feira à noite, Francisco Louçã critica o plano da troika de impor taxas sobre os depósitos bancários daquele país, afirmando que, se a UE queria combater a evasão fiscal, taxava a entrada de capitais e o controlo dos seus movimentos, mas também nos offshores britânicos de outros Estados europeus. E afirma que a “estupidez desta decisão é grave”, e tem consequências de desagregação da União Europeia.

No programa “Tabu” de sexta-feira na SIC Notícias, Francisco Louçã, professor catedrático de Economia, referiu-se em termos muito duros à atuação as autoridades europeias na crise do Chipre, e nomeadamente em relação ao plano de impor uma taxa sobre os depósitos bancários do país. Esta solução foi rejeitada pelo parlamento cipriota, mas volta a estar na ordem do dia nas negociações que estão a ser levadas a cabo neste domingo.
Louçã recorda que “a decisão foi tomada numa maratona noturna de uma reunião do Eurogrupo que decide por unanimidade, com consulta ao FMI e ao Banco Central Europeu”, mas, no dia seguinte ninguém queria assumir a responsabilidade por ela. “O ministro das Finanças alemão diz que foi o BCE; o BCE diz que foi a Comissão Europeia. A Comissão Europeia fez um texto escrito a dizer que tinha sido o governo de Chipre, que diz que foi obrigado”, enumerou o economista, que sublinhou que essa atuação “dá uma ideia de inconsistência, basta haver um abanão, um sopro de vento, a perceção de que tinham feito um disparate gravíssimo do ponto de vista sistémico sobre a Europa, para que imediatamente o castelo de cartas caia”.
Para Louçã, o episódio demonstrou que “não há direção política na União Europeia”. Recordando que a justificação para tal plano era de que “os russos tinham lá muito dinheiro porque era lavagem ou evasão fiscal”, Louçã foi enfático: “Entendamo-nos bem: se a Europa quisesse controlar a evasão para paraísos fiscais como o Chipre, então impunha uma taxação sobre a entrada de capitais e o controlo dos seus movimentos. Mas tinha que o fazer em relação aosoffshores britânicos também, que são muito mais importantes do que Chipre. Ou os offshores de outros Estados europeus, incluindo Portugal”.
Para o militante bloquista, a UE protegeu offshores e não se pode queixar da situação de Chipre que é de facto gravosa porque permite a evasão fiscal”. Mas o aspecto mais importante foi que essa decisão fez que “os depositantes italianos, ou os depositantes alemães, ou os depositantes finlandeses pensassem que 'isto um dia pode chegar a nós!'”
“Não há nenhuma forma de garantir”, sublinhou Louçã, “como tentou fazer Vítor Gaspar, que 'é só para aqueles'. Mas aqueles não são um território colonial em África no século XIX. São um país da União Europeia, que teve a presidência da União ainda há pouco tempo”.
Para Francisco Louçã, “a estupidez desta decisão é tão grave, de gente que não é capaz de imaginar as consequências gravíssimas de desagregação da União Europeia, quando ao mesmo tempo estão a pedir enorme poder para si – o poder orçamental, o poder federal, o poder de decisão política, um governo europeu”.
E concluiu: “São tão estúpidos que não são capazes de liderar a solução económica para um país que representa 0,2% do PIB europeu, como é que se podem atrever a dizer que têm uma solução para a Europa? Não têm, e portanto todos os efeitos de consequência e de desânimo e de desconfiança vão atingir as taxas de juros, as economias europeias e a credibilidade da União Europeia”.