Reposta ao post "A grosseria imbecilizante de Joaquim Barbosa"

Alguns esclarecimentos sobre a discussão entre Barbosa e Lewandowski.
1 - em nenhum momento se cogita da aplicação da súmula no. 711, do STF, acerca da hipótese de crime continuado, uma vez que o bispo rodrigues foi condenado por apenas e tão somente uma e única corrupção passiva (art. 317, do CP). Trata-se de crime único, enquanto que a continuidade delitiva pressupõe a prática de várias crimes que, por ficção, se reunem em um único delito. Como efeito nem se pensa em aplicar ou não a súmula no. 711, do STF, porque ela não se aplica para crime único.
2 - O crime de corrupção passiva possui três condutas, cada uma vinculadas a um verbo (ação humana), solicitar vantagem, aceitar promessa de vantagem ou receber vantagem. Se o agente pratica qualquer dessas três condutas comete de pronto e de imediato a corrupção, já que é um crime chamado de formal, ou de mera conduta (cf. min. celso de mello), bastando para se consumar na simples solicitação ou aceitação de vantagem, mesmo que tal vantagem no futuro sequer seja efetuada. Se solicitou ou aceitou a promessa o crime está interiamente consumado, e nesse momento se operou a ação do agente (tempo do crime) fixando a lei penal que deverá incidir.
Com isso, acaso haja uma solicitação ou aceitação da promessa é indiferente se houve posterior recebimento da vantagem. No caso da consecução dos verbos solicitar ou aceitar o verbo aceitar cuida de mero exaurimento do crime, ou post facto impunível, vale dizer, um indiferente penal. Logo, nesse caso o recebimento não se prestará para fixar a lei penal aplicável já que NÃO SERÁ CRIME, que já se operou anteriormente com a simples aceitação de promessa ou solicitação.
3 - no caso da ap 470 o barbosa entendeu que o bispo rodrigues não solicitou ou aceitou a promessa de vantagem. Com isso para ele teria havido apenas a conduta de receber, que teria se dado em dezembro de 2013, na vigência da lei mais grave.
Barbosa argumenta que o bispo rodrigues teria afirmado em seu interrogatório que não participou de nenhum ajuste com o pt no ano de 2002, quando da eleição, afirmando que por não ter apoiado o pt em nível nacional, já que tinha apoiado o garotinho, o bispo não teria participado da solicitação ou aceitação da vantagem indevida ainda em 2002.
4 - contudo, é a própria denúncia, não a defesa, que afirma que o acordo criminso foi acertado na época da campanha eleitoral para a Presidência da República em 2002 quando o PL (partido do bispo rodrigues) participou da chapa vencedora (fl. 55188)
5 - mas a contradição continua. O barbosa fundamenta que o bispo rodrigues não apoiou o lula na eleição de 2002 com base no interrogatório daquele. Indo a esse interrogatório o bispo afirma que não apoiou o pt no 1o turno porque tinha um candidato a senador (marcelo crivela) e, apenas se o pt retirasse o o apoio ao senador indicado no rj, facilitando a vida do crivela, ele apoiaria o pt no 1o turno. Como isso não houve o apoio.(1o turno das eleições de 2002)
Mas segue o bispo, no mesmo interrogatório (e aqui vai a contradição do acórdão), afirmando que após o 1o turno foi chamado na sede do pt e indagado porque não tinha apoiado o partido, quando o bispo afirma que apoiou o crivela para o senado e por isso não apoiou o pt no rj, dizendo que como o crivela já tinha sido eleito estava pronto para cerrrar fileiras com o pt, indagando sobre o recebimento do material para campanha do lula no 2o turno, já que tinha esgotado os recursos do pl na eleição do crivela.
Portanto, o que a defesa aponta nos embargos de declaração é que se o interrogatório do bispo foi tomado para afastar o ajuste da corrupção, já que se concluiu pelo não apoio ao pt no 1o turno, há contradição na falta de reconhecimento de que no mesmo interrogatório consta que no 2o turno o bispo apoiou o pt, tendo aí concretizado o ajuste considerado como corrupção.
6 - e pior, o acórdão afirma que o bispo não teria apoiado o pt no 2o turno porque aquele teria afirmado ter apoiado garotinho para presidência. Ocorre que garotinho não disputou o 2o turno. Outra contradição explícita sanável pelos embargos de declaração.
7 - como se não bastasse foram colhidos vários depoimentos, em juízo, sob contraditório e pena de falso testemunho, de membros do pl afirmando que receberam valores para realizar a campanha do pt no 2o turno. Até porque o pl era o partido de ninguém menos do que o vice-presidente, josé alencar. Imaginar que o pl do rj não apoiou o josé alencar no 2o turno, quando o crivela já tinha sido eleito, é algo totalmente teratológico, que além de não estar nem indiciado nos autos precisaria de uma razão muito forte para que ocorresse. A isso se chama omissão do julgado, o não exame de uma prova de defesa contundente.
8 - em suma, o acórdão afastou o ajuste prévio do pl com o pt porque considerou que não existiu apoio do pl ao pt na eleição de 2002. Mas para isso se vale do interrogatório do bispo que afirma não ter apoiado o pt apenas no 1o turno, já que no mesmo interrogatório aquele acusado afirma que fez campanha no 2o turno para o lula. Portanto, se decotou uma parte do interrogatório e se desconsiderou o restante, o que significa obscuridade, sanável pela via dos embargos de declaração.
O acórdão motiva ainda que não houve apoio do bispo ao pt no rj porque aquele teria apoiado o garotinho. Mas esse apoio ocorreu apenas no 1o turno, já que garotinho não disputou o 2o turno. Aqui ocorre contradição no julgado, sanável pelos embargos de declaração.
Por fim, vários depoimentos de membros do pl, em juízo, nenhum deles contraditados pelo mpf (não se alegou suspeição dos depoentes) e todos realizados sob a pena do falso testemunho ratificam que aqueles receberam, ainda em 2002, valores para fazer a campanha no 2o turno em favor do lula. Tal fato além de estar provado é notório, já que o pl era o partido do vice de lula, josé alencar. Aqui ocorre omissão do julgado, sanável pela via dos embargos de declaração.
Esses são os vícios que existem no acórdão da ap 470 e que causaram perplexidade na sessão do stf. Cabe a corte decidir se há contradição, omissão ou obscuridade junto aos fundamentos que afastaram o ajuste do pl com o pt ainda em 2002, ajuste que faz incidir a lei penal mais benéfica.
Não se cuida de reexaminar provas, mas de constatar se a motivação do acórdão está isenta dos vícios que dão ensejo ao cabimento dos embargos de declaração. Se constatado que a motivação do acórdão tem algum vício de contradição ou contradição internas, ou omissão na análise de provas, a jurisprudência é inteiramente pacífica para se conferir efeito infringente ao julgado e se modificar a conclusão daquele. Não há rigorosamente nenhuma novidade nisso.
Portanto, nunca se cuidou de uma mera chicana processual, mas do exame sobre vícios explícitos que a própria fundamentação do julgado conteria, violando o princípio do devido processo legal em razão do não atendimento da garantia da motivação das decisões judiciais.