O Jornal Nacional foi ao Panamá e dedicou uma reportagem de 6 minutos
-- uma enormidade em termos de televisão -- ao escândalo do dia: a
estrutura societária do hotel que cometeu a ousadia de oferecer um
emprego a José Dirceu.
Seguindo o conhecido script, o senador tucano Álvaro Dias (PSDB/PR)
foi ao plenário repercutir a matéria, dizendo que "o Jornal Nacional
fez uma denúncia da maior gravidade, desenhando os caminhos da
ilegalidade que levam esse empreendimento hoteleiro a uma arapuca no
Panamá"; o que certamente será repercutido pela mídia num processo de
auto-referência.
Se esta é uma denúncia da "maior gravidade", o que podemos dizer do
helicóptero de um aliado de Aécio, apreendido com 445 quilos de
cocaína? Ou o "mensalão" tucano, mais antigo do que o petista, e que
ainda não foi julgado? Ou a acusação -- ou melhor, confissão -- de
propinas pagas nas licitações do metrô de São Paulo?
Nada disso recebeu atenção equivalente da Globo, o que demonstra
uma das formas mais insidiosas de manipulação na mídia brasileira:
"agenda-setting" -- a capacidade da mídia de ditar o que é ou não
relevante na agenda de discussão pública.
"The media doesn’t tell us what to think, but what to think about.”
("A mídia não nos diz o que pensar, mas sobre o que pensar")
Se a imprensa é um espelho do que se passa numa sociedade, a
imprensa brasileira é um espelho deformado; e tão revelador quanto o que
ela mostra, é o que esconde, revelando quem manipula o espelho --
aquele que nunca aparece em seu reflexo.
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