terça-feira, 23 de junho de 2009

APOLÔNIO DE CARVALHO - A vida do revolucionário daria um filme.

Luiz Augusto Gollo

Repórter da Agência Brasil

Rio de Janeiro - Apolônio de Carvalho, a exemplo de Luiz Carlos Prestes, Carlos Lamarca e o historiador Nelson Werneck Sodré, foi oficial do Exército e comunista, condições inconciliáveis que levaram os quatro ao expurgo das Forças Armadas, quando não ao ostracismo, como no caso do historiador, que alcançou a patente de general.

Filho de soldado, nascido em Corumbá (MS) em 1912, Apolônio fez os estudos militares e era oficial em 1933, “já pensando que era necessário mudar a sociedade brasileira”, como declarou em entrevista à revista Teoria e Debate, publicada em 1989. A “paixão libertária” se manifestou em 1935, quando ajudou a consolidar a Aliança Nacional Libertadora (ANL) em Bagé (RS), orientado por um capitão, que servia na mesma unidade.

A ANL defendia a suspensão do pagamento da dívida externa, a nacionalização das empresas estrangeiras, a reforma agrária e a proteção aos pequenos e médios proprietários, a garantia de amplas liberdades democráticas e a constituição de um governo popular. Fazia contraponto à Ação Integralista Brasileira, fundada três anos antes por Plínio Salgado e de nítida inspiração fascista. Em julho de 1935, a ANL promoveu homenagem pelos aniversários dos levantes tenentistas de 1922 e 24, e foi lido manifesto de Prestes propondo a derrubada do governo.

O texto foi a senha para o presidente Getulio Vargas decretar a ilegalidade da aliança, mas o grupo teve forças para o levante (Intentona) comunista de novembro, em Natal (RN), e mais dois, em Recife e no Rio de Janeiro. O governo desfechou ações fulminantes, desbaratando a ANL e prendendo seus membros, entre eles Apolônio de Carvalho.

Solto em junho de 1937 e já expulso do Exército, entrou para o Partido Comunista Brasileiro (PCB) e seguiu num grupo de 20 brasileiros para a Brigada Internacional em defesa da causa republicana na Guerra Civil espanhola, contra os fascistas comandados pelo general Francisco Franco. Em fevereiro de 1939, com a vitória de Franco, os integrantes da Brigada Internacional fugiram para a França, onde foram presos no campo de refugiados espanhóis em Gurs, nos Alpes franceses.

Em maio do ano seguinte, Gurs transformado em campo de concentração dos nazistas que ocuparam o país. Apolônio de Carvalho conseguiu escapar para Marselha. Em 1942, entrou para a Resistência Francesa, o movimento patriótico contra a ocupação alemã, e em pouco tempo se tornou comandante para a região sul, com base em Lyon.

Foi nesta época que o guerrilheiro brasileiro conheceu a jovem resistente francesa Renée Laugery, sua companheira por mais de 60 anos, mãe de seus filhos René-Louis e Raul. Até o fim da Segunda Guerra Mundial, o casal participou da libertação de presos políticos em Nîmes, Carmaux, Albi e Toulouse. Em 1946, já com o menino mais velho, os dois viajaram para o Brasil, onde nasceu Raul, no ano seguinte.

A família viveu na clandestinidade, na militância comunista entre o Rio de Janeiro e São Paulo, até 1953, quando Apolônio seguiu para Moscou para um curso de quatro anos. Renée e as crianças se juntaram a ele em 1955. Dois anos mais tarde voltaram ao Brasil para uma vida de semi-clandestinidade que durou até o golpe militar de 1964.

Apolônio de Carvalho enfrentou, a partir de então, não só a perseguição política que o separou da família e o atirou na absoluta clandestinidade como também as divergências profundas dentro do Comitê Central do PCB, do qual fazia parte. Em 1967, à frente da Corrente Revolucionária do Estado do Rio de Janeiro, se desligou do partido e no ano seguinte, em abril, fundou o Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR), com Mário Alves, Jacob Gorender e outros líderes.

Em janeiro de 1970, já com a luta de guerrilha em andamento, sobretudo a do Araguaia, na região do Bico do Papagaio, extremo norte do Tocantins, os três dirigentes comunistas foram presos e torturados e Mário Alves acabou assassinado. No mês seguinte, René-Louis e Raul foram também presos.

Em junho, juntamente com mais 39 presos políticos, Apolônio de Carvalho foi para a Argélia, trocado pelo embaixador alemão Ehrenfried Von Holleben, sequestrado no Rio de Janeiro. Raul entrou na lista de presos políticos trocados pelo cônsul suíço no Rio, Giovanni Bücher, em 1971, e René-Louis foi solto no ano seguinte. Somente então Renée seguiu ao encontro do marido em Paris, onde a família viveu até a anistia de agosto de 1979.

Em fevereiro de 1980, Apolônio de Carvalho participou da fundação do Partido dos Trabalhadores (PT) como filiado nº 1 e foi vice-presidente e diretor até 1987, quando a saúde precária o afastou da vida partidária, mas não da política. Até a morte, em setembro de 2005, apoiou o partido e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Renée tem hoje 87 anos e vive no Rio de Janeiro.

Um comentário:

Paulo ribeiro disse...

Já existe um documentário sobre sua luta.
"Vale a Pena Sonhar"(2003) dirigido por Sandra Grisotti e Rudi Böhm