segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

A ERA CLINTON, PARTE 2?

O presidente eleito Barack Obama fundamentou a sua campanha na promessa de trazer “mudança” para Washington. Ao vencer Hillary Clinton nas primárias democratas, argumentou frequentemente que a sua opinião de oposição à invasão do Iraque superava a “experiência” de Clinton enquanto íntima de Washington que apoiou a guerra.

Aparentemente, isso era antes.

Estamos agora. Quando Obama se prepara para nomear Clinton para ser a sua secretária de Estado, parece que toda a postura de Obama contra Clinton foi a conversa fiada de uma campanha bem orquestrada, que em última instância não significava nada.

Além da nomeação de Hillary Clinton, Obama parece estar a fazer o que a própria Clinton tinha planeado se tivesse ganho as eleições – restaurar a presidência de Bill Clinton em Washington.

Praticamente cada posto principal na administração Obama está a ir para um rosto associado com a Casa Branca de Clinton dos anos 1990. Rahm Emanuel, frequentemente chamado consigliere de Clinton, será o chefe de gabinete da Casa Branca de Obama. Espera-se que Bill Richardson, embaixador da ONU e secretário da Energia de Clinton, seja nomeado secretário do Comércio. O secretário do Tesouro de Clinton, Lawrence Summers, encabeçará o Conselho Económico Nacional de Obama. O advogado de Clinton e funcionário do Departamento de Justiça Eric Holder é, segundo as notícias, a escolha de Obama para Procurador-geral [1]. E a lista continua.

Possivelmente a maior não-mudança estará na arena da política estrangeira, onde permanece a especulação de que Robert Gates, o secretário da Defesa de George W. Bush, vai conservar a sua posição pelo menos nos primeiros meses e anos de uma administração Obama. A equipa principal de transição de Obama em questões de serviços de informações é liderada por John Brennan, um oficial da CIA que trabalhou sob as ordens de George Tenet, antigo director da agência na era de Bill Clinton e George W. Bush, que esteve totalmente implicado em todos os horrores da agência, desde a tortura na Baía de Guantánamo até às “entregas extraordinárias”.

A lista dos falcões da guerra do Iraque que irão rodear o opositor à guerra Obama, não pode certamente constituir uma mudança para alguém que votou por Obama pensando que ele acabaria com a guerra. «É assombroso que nem um dos 23 senadores, ou dos 133 deputados que votaram contra a guerra faça parte do elenco», afirmou Sam Husseini, do Instituto de vigilância dos meios de comunicação para a Exactidão Pública, ao Los Angeles Times.
* * *

O que podemos retirar de tudo isto? Foi a campanha de Obama simplesmente uma grande operação de simulação?

Apesar da sua retórica elevada e da crítica frequentemente acérrima à administração Bush, Obama cingiu-se a uma lista suficientemente discreta e bem estabelecida de políticas que disse que implementaria se fosse eleito. Apesar de as pessoas terem razão em pressioná-lo para agir no sentido das suas expectativas de mudança, Obama sempre se ficou por posições que estão bem aquém dessas altas expectativas.

Assim, por exemplo, num debate com John McCain, Obama disse que considerava os cuidados de saúde um direito de todos os americanos. Contudo, o plano de cuidados de saúde que planeia oferecer fica aquém do elevado objectivo.

Todos os que acreditaram nas palavras de Obama têm razão de se sentir preocupados – se não ultrajados – pelo número de personagens da era de Clinton e íntimos de Washington que estão a aparecer na sua administração. Ainda assim, isso não significa que a administração Obama irá ser uma reprodução dos anos Clinton.

A orientação política de Clinton – chamemo-la “clintonismo” – foi forjada nos anos 1980, um período de três derrotas consecutivas dos democratas para as eleições presidenciais nas mãos dos republicanos Reagan-Bush. Para uma parte dos democratas conservadores, a prioridade estratégica máxima era “reorientar” os democratas para torná-los competitivos no apoio dos grandes negócios.

No poder, o clintonismo tornou-se sinónimo de comércio livre globalizante, dos mais baixos níveis de despesa governamental desde a administração Eisenhower, e do que foi conhecido como as micro-iniciativas – desde créditos fiscais do ensino à licença médica não paga – para ir ao encontro dos problemas sociais.

Tudo isso pareceu funcionar num ambiente em que o conservadorismo parecia ser a principal força política – ao qual o liberalismo teria de cortar as asas.

Contudo, a administração Bush deixou um tal desastre que até sectores importantes do grande negócio estão a promover um ressurgimento democrata. E, no dia 4 de Novembro, os eleitores comuns fartos da guerra no Iraque e da crise económica deram aos democratas um mandato claro para ir numa nova direcção.

A “triangulação” clintoniana e as micro-iniciativas já não são uma opção, e nem o grande negócio as quer. «Não vivemos num tempo que permita o incrementalismo», afirmou David Axelrod, o principal conselheiro de Obama, ao New York Times. «O objectivo [de Obama] é formar um consenso bipartidário. Não penso que esse objectivo seja mais importante do que a obtenção de um resultado».

O grande negócio sabe que enfrenta uma crise de proporções históricas, e a única chance de resolvê-la requer acção concertada do governo. É por isso que as panaceias neoliberais dos anos 1990 – muitas das quais se tornaram sinónimos da orientação da administração de Clinton – nem sequer estão a ser consideradas como sendo hoje sérias candidatas.

É interessante observar que o designado secretário do Tesouro de Obama, Timothy Geithner, foi um funcionário público competente que essencialmente executou a política estabelecida por outros. Sob a administração Obama, parece determinado a executar as políticas do seu chefe, Obama, e Summers, actuando como dirigente da política económica no Conselho Económico Nacional.

Embora Summers seja um Clinton recauchutado que está implicado em todas as políticas neoliberais e desreguladoras daqueles anos, tem vindo, há mais de um ano, a soar o alarme sobre a extensão da crise económica e a pedir a recapitalização dos bancos, a regulação do sector financeiro e o estímulo maciço do governo para prevenir uma quebra mais profunda.

Tal como Robert Borosage, da Campanha liberal para o Futuro da América, afirmou:

«A era do grande governo acabou. Na crise, como Richard Nixon uma vez disse, somos «todos keynesianos agora». Os antigos Secretários do Tesouro de Clinton, Robert Rubin e Lawrence Summers, falcões do défice até há pouco tempo, agora pedem um incentivo fiscal substancial – gastos federais financiados pelo défice – para manter a economia a funcionar.

A julgar pela grande reanimação de Wall Street que acompanhou a informação de 21 de Novembro sobre a escolha iminente de Geithner por Obama, parece que o grande negócio concorda com o Summers actual.

Uma última diferença distingue os anos Obama dos anos Clinton – e esta leva-nos para fora do reino da politiquice.

É que para milhões de americanos, a eleição de Obama reflectiu um despertar político. Eles votaram por “mudança”, e sentem que estão a nadar com a corrente da história.

De muitas e variadas maneiras, durante os próximos anos, as pessoas comuns – como as que se mobilizam para a igualdade no matrimónio na sequência da aprovação da Proposta 8 da Califórnia – pressionarão a administração para agir. E até as personalidades da era Clinton terão de prestar atenção a isso.

Agradecimentos a Joel Geier pelas suas informações sobre a emergente equipa económica de Obama.
Fonte:Informação Alternativa.

Nenhum comentário: