segunda-feira, 31 de maio de 2021

"É esse o caminho: o pesquisador tuiteiro?".

 

“É esse o caminho: o pesquisador tuiteiro?”, questiona Luis Felipe Miguel a Felipe Neto

 
Felipe Neto. Foto: Reprodução/YouTube

O professor Luis Felipe Miguel publicou nessa segunda-feira (31), em seu Facebook, uma resposta às críticas que Felipe Neto fez aos intelectuais em seu Twitter. Leia:

Dia desses, Felipe Neto – a quem elogio constantemente, aliás – publicou um tuíte agressivo dirigido a um “vocês” que, imagina-se, éramos nós, cientistas da área de Humanas.

“Vocês” seríamos os culpados de “a maioria do povo continuar batendo palma pra execução de criminoso” porque não saíamos “dessas merdas desses tronos academicistas, falando em termos difíceis apenas pra quem estudou sociologia”.

E lacrou, no final: “Quem sobe no pedestal do intelecto não se comunica com quem tá na rua”.

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“Quem sobe no pedestal do intelecto não se comunica com quem tá na rua”, diz Felipe Neto

Há pelo menos três equívocos óbvios no tuíte do youtuber (além, é claro, do tom).

Primeiro, a crença ingênua no poder da palavra de acadêmicos. Mano, os cientistas estão dizendo há séculos, de jeitos bem simples, que a terra é redonda – e ainda assim estamos onde estamos.

Vivemos um momento de guerra ao capital cultural. O prestígio acadêmico está longe de ser garantia de receptividade da audiência.

Depois, a ideia de que a complexidade do pensamento é necessariamente uma veleidade de quem quer “subir no pedestal do intelecto” – e não um reflexo da complexidade do mundo social.

Há setores da academia que são vulneráveis ao culto da complexidade pela complexidade, que acham que ela confere status (além de esconder o caráter muitas vezes pedestre do que de fato está sendo dito), que gozam com palavras difíceis e frases enroladas, que se refocilam num jargão impenetrável e desnecessário, de preferência em estrangeiro? Sem dúvida. (Não todos, felizmente.)

Mas isto não quer dizer que o treinamento acadêmico seja dispensável e que todo o conhecimento produzido na área das Ciências Humanas seja imediatamente acessível a qualquer um.

Acredito que quase tudo que se produz nas Humanas pode chegar ao leitor culto não especializado – desde que este leitor esteja disposto ao esforço intelectual necessário.

A vontade de buscar a melhor comunicação possível não pode se tornar uma exigência de simplificação. Afinal, nos esforçamos para entender a complexidade do mundo não por vaidade ou preciosismo, mas porque precisamos disto para melhor agir no sentido de transformá-lo.

A ciência opera na contramão do senso comum – por isso, é frequentemente preciso mais esforço para entendê-la do que para abraçar os preconceitos correntes.

O ambiente raso do “debate” nas redes sociais não é favorável ao exercício do pensamento crítico. Em 280 caracteres ou em um vídeo de 16 segundos, é mais fácil reproduzir slogans reacionários do que desconstruí-los. É mais fácil dizer que “bandido bom é bandido morto” ou que “pessoas de bem devem se armar para se proteger” do que explicar as raízes da violência e da criminalidade.

Lembro sempre do experimento de inteligência artificial da Microsoft, em 2016. A robô que devia aprender com a interação nas redes sociais teve que ser desativada em menos de 24 horas: tinha se tornado uma fascista, tuitando lemas da campanha de Trump.

Houve quem extraísse do caso lições sobre a natureza humana. Creio que não – afinal, era uma robô, não um humano. Mas ensina algo sobre a natureza do debate das redes sociais.

Não estou dizendo para desistir do combate, claro que não. Mas não há mágica. E voluntarismo não basta para derrotar o poder da ideologia.

Por fim, meu jovem xará erra na condenação aos pesquisadores que estariam se isolando na torre de marfim, ou melhor, no “pedestal do intelecto”.

Vejo, ao contrário, um esforço enorme de intervenção de uma grande parte dos nossos melhores pesquisadores – em blogs, em canais de Youtube, em podcasts, no Facebook, no Twitter.

É um esforço louvável. Nem sempre é coroado de êxito – divulgação científica também exige especialização e treinamento. Mas não dá para dizer que não estamos buscando diálogo com o grande público.

Na verdade, vejo um problema no sentido contrário ao indicado por Felipe Neto: um processo de apagamento da fronteira entre pesquisa científica e vulgarização.

A fronteira existe não por esnobismo ou reserva de mercado – e sim porque existem diferenças quanto ao grau possível de aprofundamento, de sofisticação teórica e metodológica, entre uma e outra.

Mas vejo divulgadores sendo aceitos como “referências centrais” mesmo em trabalhos acadêmicos. Vejo jovens pesquisadores julgando que se tornar guru de Youtube é a melhor maneira de obter consagração acadêmica. Vejo publicações científicas se curvando à lógica imediatista dos likes.

Outro dia, um colega comentou – sem nenhuma crítica aparente, apenas como curiosidade – que havia apresentado uma submissão a uma revista, não sei se brasileira ou estrangeira, e ela exigira que fossem encaminhados também os textos de dois tuítes, para divulgação caso o artigo fosse publicado.

É esse o caminho: o pesquisador tuiteiro? Sei que sou demodê, mas vejo neste processo uma grave ameaça à integridade do discurso científico.

Uma grande qualidade de Felipe Neto é que ele faz autocrítica. Podia fazê-la também em sua condenação apressada aos pesquisadores de Humanas.

Já que ele está preocupado com o discurso punitivista e assassino na segurança pública, podia convidar a seu canal algum especialista. Tem muita gente boa na área, muita mesmo, que faz trabalho sério e se comunica com competência. Com um empurrãozinho do influencer, iam ajudar milhares de pessoas a pensar melhor sobre o tema.

Resposta do Kakay ao Bolsonaro.

 

Em resposta a Bolsonaro, Kakay diz que foi aos protestos contra a cultura da morte e a favor da vida

 
Kakay

Kakay respondeu com exclusividade para o DCM as agressões que recebeu de Bolsonaro na manhã desta segunda. O sujeito reclamou da presença do criminalista nos protestos de sábado, 29.

“Fui a manifestação como cidadão, contra a cultura da morte e a favor da vida”, disse Kakay.

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Aos seus apoiadores, no cercadinho do Alvorada, Bolsonaro disse que a crítica do advogado é “sinal de que está no caminho certo”.

Bolsonaro atacou Kakay sugerindo que os manifestantes foram pagos para participar dos atos. “Tá faltando dinheiro também, para o Kakay estar reclamando, né”, ironizou o genocida.

O criminalista não entrou na pancadaria.

“A CPI já comprovou a responsabilidade criminal do Presidente, especialmente na omissão deliberada na compra das vacinas”, disse. “Estou do lado do povo brasileiro e na defesa da Constituição. Não faço política partidária”.

As mentiras da CPI da Covid e os jogos niilistas em 7 atos.

 

As mentiras da CPI da Covid e os jogos niilistas em 7 atos. Por Lenio Streck

 

Publicado na ConJur

CPI da Covid. (Jefferson Rudy/Agência Senado)

Por Lenio Luiz Streck

1. De como se cometem gestos extraordinários…!

Ouvindo os depoimentos na CPI (Pazuello, Wajgarten, Araujo e Mayra), fico pensando: por qual razão essas pessoas não são contratadas para ensinar réus a enrolarem o juiz em interrogatórios? Ou: por que não abrem um curso de niilismo? Lembremos que o suprassumo do niilismo está no personagem Raskólnikov, de Crime e Castigo (Dostoiesvski). Explico: Depois de matar a dona da pensão, Ralkólnikov diz: eu cometi um gesto extraordinário. Transcendeu a moralidade convencional dos homens comuns, dos coitados. Ele, Raskólnikov, não: ele se considerava superior a tudo aquilo.

Incrível como isso se encaixa: Pazuello, Wajgarten, Araujo e Mayra nada admitem, negam tudo, dão dribles retóricos, como que a dizerem: nós cometemos gestos extraordinários para ajudar o Brasil!

A questão é que, no famoso romance de Dostoievski, o personagem Raskólnikov matou a velha usurária e a coitada da irmã que nada tinha a ver com o assunto. Daí a minha pergunta: qual é o saldo de nossos mortos mesmo? Raskólnikov tirou suas ideias niilistas de livros e tinha um busto de Napoleão. Aqui, nossos pequenos Raskólnikovs leram bula de cloroquina e têm como ídolo um comerciante que se veste de Zé Carioca e que faz Tik Tak com Tirulipa.

2. E as pessoas se grudavam nas pernas da doutora

A dra. Mayra, secretária do Ministério da Saúde, esmerou-se. Primeiro exaltou o seu próprio trabalho na crise de Manaus. Disse que isso ficará marcado na história. Claro, Doutora. Claro que ficará. As pessoas morreram por falta de ar. Agonizando. Foi um gesto extraordinário do Ministério da Saúde. Ela diz que o Ministério fez um excelente trabalho. Minutos depois diz que as pessoas se penduravam nas suas pernas porque estavam agonizando. E nega que tenha podido perceber que ali existia o caos. Extraordinário isso. Um “gesto extraordinário”. Inclusive quanto ao tapete e o pênis da/na Fiocruz.

3. Truques retóricos “off label”: “Eu preciso contextualizar”…!

Palavras como “preciso contextualizar”, truques retóricos, enfim, dribles da vaca aplicados off label. O sujeito que treinou os depoentes ensinou que cada resposta tinha que começar com “deixa eu mostrar o contexto”. É claro: “o contexto” explica qualquer coisa. Vamos ver “o contexto” de Raskólnikov. Claro.

Por que nenhum senador perguntou sobre o contexto de mais de 450 mil mortes… Qual seria o contexto? Qual é o contexto de quem morreu sem ar em Manaus?

Com as lições de rebimbocas das parafuzetas dos depoentes, um interrogatório sobre furto poderá ser (depois das aulas com os professores Araújo, Mayra, Pazuello e Wajgarten) assim:

Juiz pergunta: ” — O senhor praticou o furto?”

Resposta: ” — Preciso contextualizar. Na verdade, no âmbito do direito de propriedade em um país periférico e levando em conta a distribuição de determinados bens, penso que o aliviamento de pequena parcela do patrimônio pretensamente pertencente à vítima é contestável em termos de análise off label da Lei Penal (off label é legal, não?). Porque primeiro a vítima terá que demonstrar que… blá, blá. Ao final, de forma contextual… provavelmente a vítima…”

Sim, é tudo uma questão de “contexto”. O “contexto” explica. Explica tanto que explica qualquer coisa. E já não explica nada. Ou seja: é a desculpa perfeita para quem é indesculpável. Qual “contexto” explica esse espetáculo de mentira num país que já não tem mais onde enterrar seus mortos?

4. De como “não recomendamos e só orientamos”

A Dra. Mayra simboliza off label o contexto (ups) dos truques retóricos. O auge foi: nós não recomendamos o uso de cloroquina; só orientamos. Bingo! Agora a vítima foi a língua portuguesa. Deve ter sido o princípio da ipseidade. O princípio da ipseidade é o contrário do princípio da mesmidade (também conhecido como princípio da identidade-idem).1 O “contexto” explica essa frase? Não recomendamos, só orientamos, diz a “doutora”. Genial.

5. Como se reprime excentricidades e tolices (ou não)

Dia desses o Helio Schwartsman lembrou como o filósofo Henri Bergson mostrou que o medo de se tornar objeto do riso alheio faz com que o indivíduo reprima suas excentricidades. Ninguém quer virar piada. Quer dizer… é mais ou menos assim.

As redes sociais ajudam a que uma sandice ou um conjunto de enrolações (embromations) tenha terreno fértil para se desenvolver.

Uma coisa que antes era motivo de vergonha agora tem apoio e por isso “se sustenta”. É aquela história do idiota que encontra outro idiota e diz: você me representa porque pensa como eu. E, é claro, na sequencia abrem um grupo de whatsapp.

Hélio lembra o exemplo de teses como terra plana. Era ridícula… e agora possui milhares ou milhões de adeptos.

6. De como só a vergonha pode (nos) salvar

O sentimento da vergonha antigamente produzia bloqueios e recuos. No livro de Kwame Appiah, O Código de Honra, consta como algumas práticas envergonhantes foram abandonadas a partir do constrangimento que causavam. O constrangimento é uma arma poderosa. Por isso é que criei um verbete chamado constrangimento epistemológico no meu Dicionário de Hermenêutica.

Explicando o Código de Honra de Appiah: durante mais de mil anos os pés das meninas chinesas eram atados, para que não crescessem e ficassem pequenos e delicados, em torno de 7,5 centímetros. A prática durou mais de mil anos e acabou em rápidos 20. Appiah pesquisou e descobriu que outros países estavam se inteirando desse hábito chinês e o repudiavam. Isso constrangeu enormemente os chineses. E foi decisivo. No século XIX, um funcionário chamado Kang consegue convencer o establishment chinês de que a prática de atar os pés era, além de todos os males, ridícula e envergonhante. E o fez comparando outros povos que não amarravam pés. Assim também ocorreu com os duelos na Inglaterra.

Talvez no Brasil as péssimas práticas de não usar máscaras, recomendar tratamentos precoces mequetrefes e coisas do gênero pudessem ser alteradas porque elas nos envergonham e, porque, para outros povos, soam como ridículas. E isso deverá nos causar constrangimentos de tal monta que abandonaremos essa prática. Um deputado do RS chega a sustentar que o uso de máscara agravou o câncer de Bruno Covas. Realmente, só a vergonha pode nos salvar…

7. A “convicção” acerca dos gestos extraordinários

Com meus botões, fico pensando em Crime e Castigo e o niilismo de Raskólnikov. Parece que os personagens atuais estão convictos de que estão cometendo gestos extraordinários.

Gestos extraordinários. Qual é mesmo o “contexto”? É mesmo extraordinário. Ou bem ordinário. A diferença entre as duas coisas é uma questão de… contexto.

Se alguém ainda não sabe o que é niilismo, perguntem para os professores aqui nominados. Especialistas. Extraordinários.


1 Para usar uma epistemic irony: Principle of ipseity (ou Selfhood); o seu antípoda é o principle of sameness. Ver, para tanto, Research Pool on the principle of selfhood – Shimun University Press and Prelinsky Press in press – in chief: Prof. J. Ring

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Anos de Chumbo: Porto de Santos financiou crimes da ditadura.

 

Exclusivo: Direção do Porto de Santos financiou crimes na ditadura. Por Eduardo Reina

 

 

Coronel Erasmo Dias comandava as prisões e a tortura

O Ministério Público Federal na cidade de Santos, litoral de São Paulo, recebe nova leva de documentos que implica a participação da Companhia Docas de Santos (CDS), atual Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), na repressão a trabalhadores durante o período de ditadura militar – 1964-1985.

A CDS financiou o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (Ipês), conforme mostra recibo apresentado, no valor de três milhões de cruzeiros, relativos a “contribuição” para os meses de janeiro a junho de 1965.

Além deste documento, o inquérito civil que apura a responsabilidade da empresa portuária e sua direção na violação de direitos humanos durante o período de repressão, iniciado em 2018, voltou a caminhar.

O procurador Ronaldo Ruffo Bartolomazi retomou sessões para ouvir trabalhadores e pessoas ligadas à direção da companhia.

Está sendo ouvida Elaine Bortone, pesquisadora que estudou a vinculação do Ipês com o golpe de Estado de 1964 e o papel das empresas no apoio à repressão.“Muitas empresas contribuíam de forma dissimulada – porém deixaram os rastros – e outras abertamente como a Companhia Docas que além de financiar, assumiu cargos de direção e planejamento no Ipês”, denuncia Antônio Fernandes Neto, ex-estivador, pesquisador e uma das vítimas que encabeça a representação contra CDS.

Também já foi ouvido Nobel Soares de Oliveira, dirigente da greve portuária de 1980.

A denúncia inicial mostra que dirigentes do Porto de Santos, o maior complexo portuário da América Latina, utilizaram a estrutura da companhia para colaborar com o aparelho de repressão durante a ditadura militar.

Os diretores do complexo permitiram a prisão de funcionários dentro do próprio porto, perseguiram trabalhadores com atuação política e sindical, além de facilitarem a tortura de servidores, produzindo informações e relatórios sobre os trabalhadores, depois encaminhadas aos órgãos militares.

Antônio Neto

“Eles sabiam quem eram os trabalhadores comprometidos com a democracia. Para criar um clima de terror dentro da companhia, prendiam a pessoa, torturavam ela. Criou-se constrangimento entre todos e tudo, a partir de ação violenta da polícia portuária”, explica Neto.

O recibo do Ipês, nº 4966, no valor de três milhões de cruzeiros, referente a contribuição para o primeiro semestre de 1965, comprova o engajamento da Companhia Docas no financiamento do aparelho de repressão, destaca o ex-dirigente sindical portuário.

O documento passará agora por análise e autenticação por historiadores.

O valor “doado” ao Instituto era equivalente, por exemplo a 50% do valor de um apartamento com um dormitório, sala, living, cozinha, hall de entrada, banheiro e área de serviço na praia de Embaré, em Santos, na avenida de frente para o mar.

De acordo com imobiliárias dessa região, um imóvel deste tipo, já mobiliado, custava 6 milhões de cruzeiros em janeiro de 1965.

Também equivale a valor menor que o preço de um outro apartamento com living-dormitório, cozinha, banheiro, área de serviço e garagem, também de frente ao mar, na Praia Grande, que era vendido por 2,5 milhões à época.

Embora fundado em 1961, o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (Ipês) desempenhou cruzada para atuar em ampla variedade de ações para penetrar em todas as classes sociais nesse período.

Na ditadura, o Ipês criava publicações, agia como lobby no Congresso Nacional, desenvolvia cursos, com a criação da Universidade do Trabalho, por exemplo, além de incentivar cursos de alfabetização de adultos, preparação de trabalhadores em sindicatos. Tinha até programas em rádios e televisão.

O Ipês foi criado para funcionar como uma agência de inteligência, tendo como ponto de partida a Guerra Cultural e Psicológica de acordo com os princípios do combate ao totalitarismo.Não era propriamente uma agência anticomunista, aliás, como grande parte da literatura historiográfica brasileira tenta argumentar: era muito mais do que isto. Possuía no totalitarismo um conceito de mobilização e se organizava para uma batalha ideológica, cultural e psicológica, explica Elizabeth Cancelli, no livro “O Brasil na guerra fria cultural – o pós-guerra em releitura”, de 2017.

O inquérito que voltou a tramitar no MPF santista tem prazo final para conclusão em 28 de julho deste ano.

No ano passado, ação semelhante em São Paulo envolvendo a Volkswagen foi concluída e definiu acordo milionário de reparação aos trabalhadores pela empresa ter colaborado com a ditadura.

A montadora de automóveis reconheceu cumplicidade com os órgãos de repressão brasileira.

Entre as diversas ações de repressão e perseguição desempenhadas pela CDS está a prisão de trabalhadores.As forças militares utilizaram um navio, chamado Raul Soares, atracado no porto santista entre abril e outubro de 1964.

À época, o coronel Erasmo Dias havia declarado que a finalidade da prisão embarcada era “prender e humilhar” os empregados da companhia.

Documento encontrado no Arquivo Nacional em Brasília também comprova que a comissão de oficiais da Marinha de Guerra, encarregada do “IPM (Inquérito Policial Militar) da Orla do Cais”, realizou seus trabalhos dentro de salas da Divisão de Pessoal da Companhia Docas de Santos na década de 1960.

O trabalho consistia em listar os servidores portuários que, no entender dos órgãos de repressão, estavam atrelados a partidos de esquerda.

A CDS também fornecia veículos da empresa para realização de detenções de servidores e ex-funcionários.

A repressão e monitoramento realizados pela CDS possibilitou prisões em massa de funcionários.Pelo menos 250 pessoas passaram por prisão, tortura e constrangimento, relata a representação base da abertura do inquérito civil pelo Ministério Público Federal de Santos.

A Codesp, hoje denominada Autoridade Portuária – Santos Port Authority (SPA), empresa pública fundada em 1980, tem informado por meio de nota que “desconhece informações a respeito de eventuais atos de repressão que teriam sido praticados pela Companhia Docas de Santos (CDS), empresa privada que administrou o Porto de Santos, em regime de concessão, até o ano de 1980”.

Recibo que é a prova do crime será periciado e autenticado por especialistas