quarta-feira, 13 de março de 2024

Petrobras e os dividendos

 

Petrobrás pagou mais dividendos que as 5 Irmãs

Discussão sobre dividendos enfraquece Prates; Lula criticou 'choradeira' do mercado e defendeu mais investimentos

Publicado em 12/03/2024
Edifício Sede (EDISE) - Petrobrás
Foto: Flavio Emanuel / Agência Petrobras

A Petrobrás foi a empresa de petróleo que mais pagou dividendos aos acionistas em 2023 quando comparado com outras cinco grandes companhias do setor (Chevron, BP, Total, Shell e Exxon Mobil, conhecidas por 5 Irmãs), segundo levantamento da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (Aepet). Enquanto a estatal brasileira pagou US$ 20,28 bilhões, a segunda colocada, que foi a Exxon, pagou U$S 14,95 bilhões em dividendos.

“Em 2023, a Petrobrás, apesar de ter a menor receita entre as seis empresas, pagou o maior montante em dividendos. Além disso, foi a petrolífera que realizou o menor investimento líquido”, afirmou o presidente da Aepet, Felipe Coutinho.

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Segundo Coutinho, a redução dos investimentos foi o principal fator que possibilitou pagamentos de dividendos altos e insustentáveis pela Petrobrás em 2021 e 2022. “A mesma política continua acontecendo na Petrobrás até o fim de 2023; investimentos muito baixos possibilitaram pagamento alto e insustentável de dividendos”, criticou.

Em 2023, a Petrobrás investiu US$ 12,7 bilhões, um crescimento de 29% em relação ao ano anterior. Apesar do aumento nos investimentos, o economista do Observatório Social do Petróleo, Eric Gil Dantas, em entrevista à Agência Brasil, avaliou que eles ainda são baixos de considerados os planos da companhia.

“Não faltam projetos que estão sendo tocados, são refinarias, eólicas, novas fronteiras exploratórias, novos produtos ligados à transição energética. Se a Petrobrás não controlar o pagamento dos seus dividendos, ela terá que se endividar para fazer esses investimentos”, avaliou Dantas.

Valor de dividendos deixou presidente da Petrobras em baixa no governo

O valor a ser distribuído em dividendos provocou divisões na Petrobrás e levou o presidente da estatal, Jean Paul Prates, a ser convocado para uma reunião com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva nesta segunda-feira.

Prates se absteve de votar sobre a questão na reunião do Conselho de Administração, contrariando orientação do governo. Nesta segunda-feira, o presidente Lula disse que a Petrobrás tem de pensar nos 200 milhões de brasileiros que são donos da empresa, e não somente nos acionistas.

Lula disse que a Petrobrás tem de fazer investimentos e criticou a “choradeira” do mercado financeiro, o qual classificou de “dinossauro voraz”.

Por sua vez, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, afirmou, ao lado do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que “investidores sabem que governo é controlador” da empresa.

O mercado financeiro vem insistindo, através da mídia, que a Petrobrás “perdeu” R$ 63 bilhões, o que é um equívoco. Nem a estatal, nem os acionistas, perderam dinheiro – a perda para os investidores é potencial, ou seja, só ocorrerá se venderem agora as ações da empresa.

A queda no valor de mercado, tão criticada, ocorre depois de a Petrobrás alcançar o maior valor de mercado da história. Assim, na pior das hipóteses, hoje a estatal teria preço em Bolsa de Valores similar ao do início de 2023, quando Lula tomou posse, e analistas de mercado previam que as ações da companhia teriam forte queda, no que estavam enganados.

Nesta segunda-feira, a ação PN (PETR4) teve queda de 1,3%, para R$ 35,65. Entre as ações mais negociadas na Bolsa de Valores, a Petrobrás teve retração menor que a Vale (3,11%) e Magazine Luiza (2,44%)
Reação negativa do mercado financeiro para forçar mais dividendos

A Petrobrás anunciou, na última semana, o resultado financeiro da companhia em 2023 com um lucro líquido de R$ 124,6 bilhões, segundo maior valor da história. Ainda assim, as ações da petroleira caíram 10% na sexta-feira (8).

Analistas da imprensa especializada em mercado financeiro atribuíram a queda à decisão da companhia de reter os dividendos extraordinários, avaliados R$ 43,9 bilhões, adiando o pagamento desses recursos para o futuro. Os dividendos são a parte do lucro que é repassada para os acionistas da empresa.

Para entender esse movimento, a Agência Brasil ouviu três especialistas em economia e mercado de petróleo. Eles avaliaram que a reação do mercado financeiro à retenção dos dividendos foi uma resposta às mudanças na gestão da Petrobras em relação ao governo anterior, que dava maior prioridade ao pagamento dos acionistas.

Eric Gil Dantas avaliou que a reação negativa do mercado é um movimento especulativo com objetivo de pressionar a empresa a pagar os dividendos de forma imediata. “Há uma pressão para que a Petrobrás pague ainda mais dividendos. Mesmo ela sendo a maior pagadora de dividendos do Brasil, o mercado sempre vai querer que a Petrobrás pague mais, mesmo que isso prejudique o caixa da empresa”, destacou.

“Não parece ter base na realidade uma chantagem de desvalorização da companhia. Primeiro, porque ela é a segunda maior geradora de caixa entre as petrolíferas do Ocidente e também porque ela já é a maior pagadora de dividendos do Brasil”, completou Dantas.

O especialista destacou ainda que a estatal brasileira ficou atrás apenas da petroleira estadunidense Exxon em volume de fluxo de caixa livre em 2023, que é o dinheiro líquido à disposição da companhia.

Interesses de curto prazo

Para o diretor técnico do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (Ineep), Mahatma Ramos, a reação do mercado é a expressão do descontentamento de alguns atores. “Em especial, aqueles acionistas que têm interesses de curto prazo, que ficaram insatisfeitos com a proposta de distribuição do volume de dividendos”, destacou.

Mahatma defendeu que esse descontentamento é desmedido, uma vez que os R$ 43 bilhões retidos devem ficar em uma reserva que é usada para remuneração de acionistas.

“A Petrobrás segue como uma empresa resiliente, lucrativa, com solidez financeira e pagando robustos dividendos, o que, em certa medida, não casa com o descontentamento desses atores de mercado que têm uma visão de que a Petrobrás é uma empresa que deve apenas gerar lucratividade e distribuir dividendos no curto prazo, ao invés de pensar num plano de desenvolvimento energético sustentável de longo prazo para o país”, comentou.

Para o economista André Roncaglia, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a queda no preço das ações é um movimento localizado e circunstancial.

“A tendência é que, conforme a Petrobrás vá se reconsolidando como empresa de energia orientada para a transição verde, esse planejamento estratégico leve os agentes de mercado a mudar sua visão, a mudar a forma como esperam que o valor da empresa deva ser tratado no preço da ação. E aí ela volta a subir”, destacou.

Roncaglia argumentou que a reação do mercado tem relação com o fato da empresa agora está atuando mais condizente sua natureza mista, que busca objetivos privados, mas também precisa atender a interesses públicos.

“A frustração do mercado é porque ele estava acostumado a Petrobrás ter uma natureza extrativista, ou seja, pegar o dinheiro e repassar na forma de dividendos. A nova gestão está olhando mais para o longo prazo, então está retendo mais lucros para poder investir”, destacou.

Justificativa de Jean Paul Prates sobre dividendos

A diretoria da empresa, dirigida pelo presidente Jean Paul Prates, enviou ao Conselho de Administração proposta para pagar 50% dos dividendos extraordinários e reter os demais 50%.

Porém, o Conselho decidiu propor reter todo o valor dos dividendos extraordinários em um fundo de reserva que, segundo o estatuto da própria companhia, deve ser usado para remunerar os acionistas ou, caso necessário, cobrir possíveis prejuízos. Tal proposta ainda precisa ser aprovada pela Assembleia Geral Ordinária, que reúne os acionistas da Petrobrás e se reúne no próximo dia 25 de abril.

O diretor financeiro e de relações com investidores da Petrobrás, Sérgio Caetano Leite, justificou que o Conselho decidiu reter todo o valor para analisar melhor os cenários, levando em conta que estão previstos maiores investimentos.

“Olhando para os dois anos de forte investimento, 2024 e 2025, o conselho pede mais análise. Ele está no papel dele, no direito, talvez até no dever dele, de pedir essas análises. Essas análises vão ser feitas, vão ser levadas para o Conselho”, afirmou Sérgio, que disse saber que a decisão “frustra alguns investidores, mas, na prática, é uma decisão tomada pela alta gestão e que a diretoria vai acompanhar”.

Colchão de liquidez

A direção da empresa sustenta que, como não há previsão de prejuízo no médio ou curto prazo, a reserva para onde devem ir os R$ 43 bilhões de dividendos extraordinários será usada para a remuneração dos acionistas.

Mesmo que não possa usar esses R$ 43 bilhões para outras finalidades, o professor André Roncaglia destacou que a retenção desse dinheiro tem o efeito positivo para empresa de aumentar o “colchão de liquidez”, ou seja, o dinheiro à disposição da Petrobrás, reduzindo incertezas do mercado.

“O colchão de liquidez permite a ela acessar juros mais baixos e diminui a incerteza nos contratos da empresa porque ela tem mais dinheiro em caixa”, comentou.

Fonte(s) / Referência(s):

Marcos de Oliveira

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