Ciro está preso. Por Carlos Fernandes
Não se comemora o definhamento político de um quadro que, concorde-se ou não com suas posições, possui uma visão do Brasil suficientemente capaz de entender seus problemas e propor soluções.
Mas o fato é que Ciro Gomes se transformou, desde há muito tempo, no seu pior e principal adversário.
Ninguém na política brasileira é mais capaz do que ele próprio de destruir sua biografia que, apesar de pecar rudemente pelo seu início político num partido oriundo da ditadura militar e pelas subsequentes infidelidades partidárias, apresenta inúmeros pontos de inquestionável importância para a democracia brasileira.
Que no passado um jovem e ainda inexperiente Ciro fosse dado a picuinhas menores e arroubos de pura truculência e insensatez, é algo que em geral o amadurecimento natural do ser humano dá conta de resolver.
Mas ao que fica muito claro por suas presentes atitudes, seus cabelos brancos parecem não lhe ter conferido a sabedoria, a resiliência e o comedimento a que a sucessão dos anos generosamente nos oferece.
Ciro, ao contrário do que se deve esperar de um homem vivido, comporta-se ainda mais infantil e birrento do que há décadas atrás.
E isso, para além de ser uma indesculpável falha de caráter, é um pecado mortal para quem se quer um estadista e um líder a governar um país com tantas diferenças de pensamentos e realidades.
Se a sua indefensável fuga para a Europa quando o país mais precisava da união de todas as forças progressistas já dava sinais de que o amor que diz ter pelo Brasil não supera sequer suas frustrações pessoais, foi a partir de seu retorno tardio que seu remorso e rancor sinalizaram o quanto é incapaz de agir sem ser guiado cegamente pela própria vaidade.
Um homem que diante uma mera crítica é capaz de chamar um religioso, democrata e intelectual da envergadura de Leonardo Boff de “bosta”, definitivamente não está à altura das competências civilizatórias minimamente necessárias para a posição na história que desesperadamente tanto busca ocupar.
Mas antes isso fosse o auge de sua agressividade e escassez de tino político.
A sua declaração de que não visitaria o ex-presidente Lula em seu cárcere mesmo se este o pedisse, mostra que Ciro Gomes não é só um poço até aqui de mágoas. Infinitamente pior, falta-lhe um item imprescindível à condição humana: solidariedade.
Ciro simplesmente não consegue entender a força que um humilde, sincero e fraterno abraço representa para um homem que se vê vítima de uma enorme injustiça.
Ciro é incapaz de perceber que ao fazer um gesto de humildade e consideração não se diminui ou se rende a posições que particularmente não concorda, mas que ao contrário, se agiganta e se predispõe a um elevado debate plural.
Mas assim, infelizmente, é Ciro Gomes.
E nitidamente mostrando que não faz concessões à sua brutalidade no agir, que horas depois a essa triste declaração, simplesmente conseguiu destruir um debate realizado no Congresso Nacional de Policiais AntiFascismo, na UFPE, em Recife-PE.
Ao lado de figuras extremamente importantes da esquerda brasileira como os deputados Marcelo Freixo (PSOL) e Maria do Rosário (PT), Ciro, mais uma vez, voltou a dar lições de grosseria e de importunidade política.
O evento, que vinha em alto nível de debate, desandou.
Cena singular do despautério Cirista foi quando enquanto Maria do Rosário e Marcelo Freixo pediam desesperadamente para que as pessoas se acalmassem e todos voltassem aos seus lugares, estava lá Ciro chamando um dos participantes de “merda”, “bosta” e “ladrão”.
Não satisfeito com a declamação de seu palavreado tão peculiar, Ciro ainda ameaçou ir às vias de fato. Com sua arrogância tantas vezes presenciadas, aos berros clamava para que um dos participantes tivesse coragem de ir até onde ele estava.
A coisa toda foi, enfim, vergonhosa.
Não se romantiza de nenhuma forma uma injustiça. Mas enquanto Ciro distribui agressões para todo lado, Lula, de sua cela, começa a costurar alianças políticas contra o fascismo imposto pelo governo Bolsonaro.
Isso equivale a dizer que enquanto Lula – um inegável estadista que sofre as consequências por ter feito o governo mais preocupado com as causas sociais que esse país já viu – liberta-se das correntes que o aprisionam via diálogo com diferentes forças da política, Ciro segue aprofundando a sua rejeição e antipatia nos mais diversos setores democráticos do Brasil.
Em última análise, no fim das contas muito mais preso do que Lula está Ciro.
O que impede o primeiro de voltar ao pleno debate das questões primordiais que impedem o avanço do Brasil como nação são barras de ferro que mais cedo ou mais tarde cairão.
Já a prisão do segundo parece ser intransponível. Ciro está preso à própria arrogância numa pena perpétua.
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