Há 20 anos que Mano Brown, o maior rapper do Brasil, canta: "Você sabe o que é frustração? Máquina de fazer vilão". É muito fácil linkar essa frase com a extrema direita, uma fábrica eficaz de ódio, assédio e perseguição a tudo que não corresponde aos seus ideais retrógrados e não raro doentios. Agora, com as eleições se aproximando, essas engrenagens voltam a se mover com força total. Explico a vocês o porquê.
Nesta semana, contei no Intercept a história de um pesquisador que foi ameaçado de morte por simplesmente fazer seu trabalho. Imagine acordar, ligar o computador e encontrar as seguintes mensagens nas suas redes sociais: "Traidor", "cagueta", "X9", "puta do Alexandre de Moraes" e "seu dia está próximo". Pavoroso e lamentável, sim, mas zero novidade neste Brasil bolsonarista. Sabemos como eles costumam agir. Sabemos como o ódio é vital para eles.
O paulistano Guilherme Felitti é programador e tem como objeto de pesquisa youtubers da extrema direita. Ele criou robôs que monitoram quantos vídeos alguns youtubers publicam, sobre o que falam e o que decidem tirar do ar. Nada disso é ilegal. Pelo contrário. É o próprio Google que fornece esses dados, abertos a qualquer um. Em março, entretanto, Felitti se deparou com um número relevante de vídeos deletados por diversos youtubers. A maioria desses conteúdos criticava o TSE, o STF e enaltecia o deputado Daniel Silveira, do PTB do Rio. Um dos youtubers, o goiano Gustavo Gayer, deletou mais de 50 vídeos sobre esses assuntos em um só dia. Talvez você esteja se perguntando: mas por quê? Porque Gayer e vários desses youtubers estão anunciando pré-candidaturas nas eleições de outubro. E querem evitar problemas com a lei eleitoral.
Ou seja: a coragem deles vai até a página 2, quando cede lugar à conveniência. Vale a pena tirar os ataques do ar porque a turma sabe que pode ser punida e impedida de concorrer pela justiça eleitoral. E sabe como é – não vale arriscar um possível mandato. Em vez de assumir o medo para a bolha que alimentam e instigam, eles resolveram colocar Felitti no papel de cagueta. E, em seus canais, criaram campanhas de assédio direcionado, indiretamente incitando seus seguidores a atacar o pesquisador, ameaçando-o até mesmo de morte.
Não é um caso isolado. Se tem uma coisa que a extrema direita sabe fazer bem, além de propagar o ódio, é tentar meter medo e calar qualquer pessoa que identifique seu modus operandi covarde.
No final de 2021, publicamos uma matéria contando como a produtora audiovisual Brasil Paralelo (que adora ser chamada de "a Netflix da direita") passou a enviar notificações extrajudiciais a pesquisadores de diversas partes do Brasil para impedir que trabalhos acadêmicos em tom de crítica a respeito dela fossem publicados.
Uma dessas pesquisadoras é a historiadora Mayara Balestro. Recentemente, ela foi atacada nas redes sociais de Leandro Ruschel, empresário bolsonarista que vive nos EUA e membro do conselho da Brasil Paralelo. Ele usou seu Twitter para publicar trechos da tese de mestrado da historiadora – que analisa a Brasil Paralelo e a nova direita. O ataque de Ruschel é puro suco da extrema direita: acusou a "extrema esquerda" de utilizar "sua hegemonia nas universidades, uma estrutura que custa bilhões aos cofres públicos, para criminalizar qualquer divergência e atacar seus críticos". Ele fez ataques pessoais à pesquisadora: "Uma rápida pesquisa na internet mostrou que a autora de tal trabalho é claramente militante política". O empresário, então, publicou fotos pessoais que Mayara postou em suas redes sociais, fazendo com que seus mais de 700 mil seguidores se sentissem confortáveis e corajosos o suficiente para atacá-la e amedrontá-la.
Dias depois, Ruschel apagou os tuítes. Assim, se protege de um eventual processo, claro.
Nós já conhecemos a tática da extrema direita, o quanto eles apostam no efeito manada e confiam no ódio como mola propulsora para seus projetos políticos. As eleições estão chegando. Vai piorar. Nós sabemos. E por isso estamos atentos. |
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