Quais os objetivos políticos do golpe?
Pedro Paulo Zahluth Bastos (Professor Livre-Docente do Instituto de Economia da UNICAMP)
Com o impeachment, os golpistas têm 3 objetivos principais: a prisão de Lula, o fim da Lava-Jato e a 'reforma política' no estilo PMDB-PSDB
Pedro Paulo Zahluth Bastos (Professor Livre-Docente do Instituto de Economia da UNICAMP)
A mensagem à Nação que o vice-presidente Michel Temer deixou vazar para a imprensa no dia 11 de abril deixou claro o aceno ao capital externo: “a mudança pode gerar esperança e que, gerando esperança, isso pode gerar investimentos, não só investimentos nacionais, mas investimentos estrangeiros... eu fiz muitas viagens internacionais no primeiro mandato e verifiquei o quanto os outros países, que têm muito dinheiro em suas mãos, querem fazer aplicando no Brasil.”
Essa mensagem está inteiramente em linha com o programa do PMDB lançado em novembro de 2015, Uma Ponte para o Futuro. Aponta para um modelo de desenvolvimento com retração da intervenção estatal e abertura de novos espaços para o investimento privado. A mensagem é importante, contudo, também pelo que ela não alude: a enorme crise política provocada pela Operação Lava Jato. Como Temer poderia resolver essa crise política?
Uma resposta pode ser dada pela identificação dos aliados e rivais de Temer. Seu rival principal é, evidentemente, o PT e sua principal figura. Lula já avisou que, se Dilma for derrotada, não cairá no conto da “unidade nacional” proposta por Temer e voltará às ruas para combater um governo ilegítimo. A última pesquisa do Datafolha, aliás, comprova que Lula é favorito para a próxima eleição presidencial.
Os aliados de Temer, por sua vez, são o conjunto de partidos diretamente ameaçados pelo transbordamento da operação Lava Jato para a investigação das relações promíscuas entre as grandes empreiteiras e os políticos. Esses querem sobreviver a qualquer custo. Para isso, nada melhor que a operação Lava-Jato seja interrompida em meio à “pacificação nacional” proposta por Temer.
Não é possível interromper a operação Lava-Jato sem que, antes, ela produza grandes bodes expiatórios. Lula é o principal candidato a bode expiatório. Se levarmos em conta o esforço do juiz Sergio Moro para evitar que Lula assumisse o ministério da Casa Civil, e o apoio que o procurador geral Rodrigo Janot passou a dar para bloquear a nomeação, a operação chegaria ao clímax e poderia ser encerrada com louvor depois de colocar um ex-presidente na cadeia, como nunca antes na história desse país. Nessa circunstância, o Quarto Poder da grande mídia contribuiria para louvar a Lava Jato mesmo que ela seja interrompida precocemente.
Se Lula não chegar a ser preso, torná-lo um político “ficha-suja” já estaria de bom tamanho. Isso alijaria o principal desafio à reprodução, nas eleições de 2018, da “aliança nacional” proposta por Temer com o PSDB e partidos menores de direita. O que essa aliança quer?
A “reforma política” dos sonhos do bloco PMDB-PSDB
Golpistas não se arriscam por prêmios medíocres, e melhorar o processo orçamentário não é seu objetivo. A pauta é mais ampla. A julgar pelos projetos legislativos patrocinados por Eduardo Cunha que poderiam ser vetados por Dilma Rousseff, o alinhamento do Executivo e da maioria do legislativo representa um enorme risco de regressão: terceirização sem limite; prevalência do negociado sobre o legislado nas relações trabalhistas; jornada flexível de trabalho; maior criminalização do aborto; exploração do pré-sal seja feita sob o regime de concessão; privatização de todas as empresas públicas; independência do Banco Central; limite draconiano para a dívida pública; retirada do direito de greve dos servidores etc.
Essa pauta é a favorita dos empresários. Todavia, os políticos não são apenas instrumentos dos empresários que financiam suas campanhas, mas buscam também atender a seus próprios interesses e, no mínimo, se reproduzir no cargo. Se puderem fazer as duas coisas ao mesmo tempo, tanto melhor.
Sendo assim, a reforma das reformas para os golpistas é aquela anunciada por Michel Temer no discurso vazado: a reforma política. Não se sabe o que dela consta, mas provavelmente envolveria impor limites para os pequenos partidos e cláusulas eleitorais que favoreçam os grandes.
Além disso, duas mudanças favoreceriam o conjunto dos deputados “fisiológicos”, independentemente do tamanho do partido, impedindo completamente a reforma das relações entre políticos e empresariais que a operação Lava Jato deixou às claras.
Primeiro, o semiparlamentarismo anunciado por Temer em novembro de 2015 ao apresentar o programa Ponte para o Futuro: um orçamento inteiramente impositivo cuja execução seria fiscalizada por um nova Autoridade Orçamentária subordinada ao Congresso Nacional. Na prática, isso daria segurança ao parlamentar de que suas emendas orçamentárias serão executadas. Dado esse passo, quem sabe não eliminar o presidencialismo e instituir o parlamentarismo por inteiro, se o STF não vetar?
Segundo, o objetivo é voltar a autorizar o financiamento empresarial de campanhas, em um volume muito superior ao limite anterior, de maneira a acomodar os recursos que deixarão de fluir pelo caixa 2. O veto presidencial ao dispositivo da Reforma Eleitoral que previa doações empresariais de campanhas políticas, em 29 de setembro de 2015, parecia concluir uma luta política travada entre o PMDB e a presidenta desde as jornadas de junho de 2013. Se o impeachment passar, o alinhamento do Executivo e da maioria do legislativo elimina a possibilidade de novo veto presidencial. E se o STF vetar, por que não aumentar o número de ministros do STF, de modo que representem melhor a “vontade popular”? Uma vez controlado o Poder Executivo, o que impediria a aliança PMDB-PSDB de avançar também sobre o Poder Judiciário?
Em suma, o crime perfeito da reforma política proposta por Temer é “alinhar” melhor dois dos poderes e, se possível, todos os três. Assim, em conjunto com o Quarto Poder, será mais fácil legalizar o que é ilegal.
Essa mensagem está inteiramente em linha com o programa do PMDB lançado em novembro de 2015, Uma Ponte para o Futuro. Aponta para um modelo de desenvolvimento com retração da intervenção estatal e abertura de novos espaços para o investimento privado. A mensagem é importante, contudo, também pelo que ela não alude: a enorme crise política provocada pela Operação Lava Jato. Como Temer poderia resolver essa crise política?
Uma resposta pode ser dada pela identificação dos aliados e rivais de Temer. Seu rival principal é, evidentemente, o PT e sua principal figura. Lula já avisou que, se Dilma for derrotada, não cairá no conto da “unidade nacional” proposta por Temer e voltará às ruas para combater um governo ilegítimo. A última pesquisa do Datafolha, aliás, comprova que Lula é favorito para a próxima eleição presidencial.
Os aliados de Temer, por sua vez, são o conjunto de partidos diretamente ameaçados pelo transbordamento da operação Lava Jato para a investigação das relações promíscuas entre as grandes empreiteiras e os políticos. Esses querem sobreviver a qualquer custo. Para isso, nada melhor que a operação Lava-Jato seja interrompida em meio à “pacificação nacional” proposta por Temer.
Não é possível interromper a operação Lava-Jato sem que, antes, ela produza grandes bodes expiatórios. Lula é o principal candidato a bode expiatório. Se levarmos em conta o esforço do juiz Sergio Moro para evitar que Lula assumisse o ministério da Casa Civil, e o apoio que o procurador geral Rodrigo Janot passou a dar para bloquear a nomeação, a operação chegaria ao clímax e poderia ser encerrada com louvor depois de colocar um ex-presidente na cadeia, como nunca antes na história desse país. Nessa circunstância, o Quarto Poder da grande mídia contribuiria para louvar a Lava Jato mesmo que ela seja interrompida precocemente.
Se Lula não chegar a ser preso, torná-lo um político “ficha-suja” já estaria de bom tamanho. Isso alijaria o principal desafio à reprodução, nas eleições de 2018, da “aliança nacional” proposta por Temer com o PSDB e partidos menores de direita. O que essa aliança quer?
A “reforma política” dos sonhos do bloco PMDB-PSDB
Golpistas não se arriscam por prêmios medíocres, e melhorar o processo orçamentário não é seu objetivo. A pauta é mais ampla. A julgar pelos projetos legislativos patrocinados por Eduardo Cunha que poderiam ser vetados por Dilma Rousseff, o alinhamento do Executivo e da maioria do legislativo representa um enorme risco de regressão: terceirização sem limite; prevalência do negociado sobre o legislado nas relações trabalhistas; jornada flexível de trabalho; maior criminalização do aborto; exploração do pré-sal seja feita sob o regime de concessão; privatização de todas as empresas públicas; independência do Banco Central; limite draconiano para a dívida pública; retirada do direito de greve dos servidores etc.
Essa pauta é a favorita dos empresários. Todavia, os políticos não são apenas instrumentos dos empresários que financiam suas campanhas, mas buscam também atender a seus próprios interesses e, no mínimo, se reproduzir no cargo. Se puderem fazer as duas coisas ao mesmo tempo, tanto melhor.
Sendo assim, a reforma das reformas para os golpistas é aquela anunciada por Michel Temer no discurso vazado: a reforma política. Não se sabe o que dela consta, mas provavelmente envolveria impor limites para os pequenos partidos e cláusulas eleitorais que favoreçam os grandes.
Além disso, duas mudanças favoreceriam o conjunto dos deputados “fisiológicos”, independentemente do tamanho do partido, impedindo completamente a reforma das relações entre políticos e empresariais que a operação Lava Jato deixou às claras.
Primeiro, o semiparlamentarismo anunciado por Temer em novembro de 2015 ao apresentar o programa Ponte para o Futuro: um orçamento inteiramente impositivo cuja execução seria fiscalizada por um nova Autoridade Orçamentária subordinada ao Congresso Nacional. Na prática, isso daria segurança ao parlamentar de que suas emendas orçamentárias serão executadas. Dado esse passo, quem sabe não eliminar o presidencialismo e instituir o parlamentarismo por inteiro, se o STF não vetar?
Segundo, o objetivo é voltar a autorizar o financiamento empresarial de campanhas, em um volume muito superior ao limite anterior, de maneira a acomodar os recursos que deixarão de fluir pelo caixa 2. O veto presidencial ao dispositivo da Reforma Eleitoral que previa doações empresariais de campanhas políticas, em 29 de setembro de 2015, parecia concluir uma luta política travada entre o PMDB e a presidenta desde as jornadas de junho de 2013. Se o impeachment passar, o alinhamento do Executivo e da maioria do legislativo elimina a possibilidade de novo veto presidencial. E se o STF vetar, por que não aumentar o número de ministros do STF, de modo que representem melhor a “vontade popular”? Uma vez controlado o Poder Executivo, o que impediria a aliança PMDB-PSDB de avançar também sobre o Poder Judiciário?
Em suma, o crime perfeito da reforma política proposta por Temer é “alinhar” melhor dois dos poderes e, se possível, todos os três. Assim, em conjunto com o Quarto Poder, será mais fácil legalizar o que é ilegal.
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