Ao dar uma carteirada e garantir que sua filha caçula não precisasse fazer prova para entrar em uma disputada escola, Bolsonaro ensinou a ela uma grande lição da família: fundamental mesmo é levar vantagem em tudo.
Bolsonaro pediu ao comandante do Exército, general Paulo Sérgio de Oliveira, a entrada de sua filha na sexta série do ensino fundamental do Colégio Militar de Brasília (concorrência de 70,4 candidatos por vaga) sem passar por provas de seleção como todo mundo. Ele defende que tudo foi feito dentro das regras, mas a papelada sobre o processo teve seu sigilo decretado. Com isso, Jair completa uma quina de filhos que levaram vantagem do Estado.
O presidente e sua família nunca entenderam muito bem a saudável separação entre cargos públicos e interesses privados. Não são os únicos políticos a fazerem "confusão", mas insistem nela com frequência.
O senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) e o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) foram envolvidos pelo pai em esquemas de desvios de salários de servidores de seus gabinetes, as chamadas rachadinhas.
Pensando na proteção deles, o presidente deu uma declaração bizarra na reunião ministerial de 22 de abril de 2020, cujo vídeo foi divulgado por decisão do Supremo Tribunal Federal após ter sido apontado pelo ex-ministro Sergio Moro como prova da interferência de Bolsonaro na Polícia Federal.
"Eu não vou esperar foder minha família toda de sacanagem, ou amigo meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence à estrutura. Vai trocar. Se não puder trocar, troca o chefe dele. Não pode trocar o chefe, troca o ministro. E ponto final. Não estamos aqui para brincadeira", afirmou.
Enquanto isso, o filho 04 tem agido como lobista, aproveitando de sua posição. Jair Renan, ganhou de presente a cobertura em foto e vídeo da festa de inauguração de sua empresa. A questão é que a produtora que lhe conferiu o mimo presta serviço ao governo de seu pai, tendo recebido R$ 1,4 milhão neste ano.
A empresa de Jair Renan já havia sido alvo de matéria na Veja. Segundo a revista, o 04 solicitou ao gabinete da Presidência da República uma audiência para que um de seus patrocinadores tratasse de interesses comerciais de sua empresa. O ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, acabou recebendo o mecenas.
Helicópteros da Força Aérea Brasileira foram usados para transportar parentes e amigos para o casamento de outro filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), em 2019. Questionado sobre isso, Jair foi agressivo com a repórter e abandonou a entrevista.
Depois, se justificou dizendo que viaja sempre com dois helicópteros e não viu problemas em dar carona em um deles. "Eu vou negar o helicóptero a ir para lá e mandar ir de carro? Não gastei nada do que já ia gastar". Lembrando que não foi ele quem gastou, mas os cofres públicos.
O presidente cansou de deixar claro que acredita que pode usar o cargo para beneficiar seus filhos. Uma das frases mais famosas foi dada em meio à polêmica sobre a indicação de Eduardo Bolsonaro ao cargo de embaixador nos Estado Unidos. Disse Jair no dia 18 de julho de 2019: "Lógico, que é filho meu, pretendo beneficiar filho meu, sim. Pretendo, se puder, dar filé mignon." Dada a repercussão negativa, o deputado não foi indicado, mas o estrago já estava feito.
O presidente nos ensina com seus exemplos familiares que o que vale no Brasil é a Lei de Gerson, de querer sempre levar vantagem em tudo - da rachadinha nos gabinetes ao uso de aeronaves da FAB para transportar parentes para uma festa ou o cabeleireiro da esposa. E que a meritocracia até existe, mas é hereditária.
O que devem ter pensado os pais que ficaram com seus filhos de fora da seleção do Colégio Militar? "O presidente acha que é melhor que os demais cidadãos" ou "também gostaria de ser presidente para dar uma carteirada assim"?
Tenho medo da resposta.
(Leia a íntegra do texto no post do blog)
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