Sua Excelência, o cínico. Com Lula pode, comigo, não pode
O futuro ministro da Justiça, Carlos Velloso, acha que o destacamento policial fortmente armado, que chegou antes de 6 horas da manhã ao apartamento de Lula, no dia 4 de março do ano passado, foi apenas fazer-lhe “um convite” para prestar depoimento.
Ele diz que o juiz Móro (assim ele pronuncia) não mandou conduzir o ex-presidente, mas convidá-lo e, se ele não quisesse ir, aím sim, empurra-lo num camburão.
Já daria vergonha ter um ex-ministro do Supremo Tribunal Federal e futuro Ministro da Justiça capaz de tanto cinismo.
Mas um post que Luiz Nassif republica hoje (o original é de março, logo após a entrevista em que Velloso diz aquilo da quase prisão de Lula) mostra que ao cinismo se junta a hipocrisia, ao lembrar que o próprio Velloso revoltou-se quando a Polícia Federal, no curso de uma investigação, reagiu, furioso, a ter recebido um convite (aí sim, um convite) para depor, daí a dois dias, sob pena de sujeitar-se à condução coercitiva.
Em 2008, já aposentado do STF,
Velloso foi intimado pela Polícia Federal a depor em inquérito da
Operação Pasárgada, que investigava o desvio de recursos do FPM (Fundo
de Participação dos Municípios). Ele tinha sido consultado por um dos
acusados para pegar sua causa.
Ele estava sendo intimado
pacificamente. Sua reação foi clara: não iria comparecer e só
compareceria em local e data que ele definisse.
Velloso foi se queixar ao então presidente do STF, Ministro Gilmar Mendes (http://migre.me/tcaWj) do abuso da mera intimação.
Imediatamente Gilmar enviou ao
presidente Lula a recomendação para edição de um projeto de lei punindo
autoridades por vazamentos em operações sigilosas. Mendes declarou que
estava disposto a combater vazamentos e prisões desnecessárias.
No dia 27 de junho de 2008, o site do STF publicou mensagem de Velloso a Gilmar (http://migre.me/tcb4W).
“Não pude aceitar os termos da
intimação que me enviou a Polícia Federal, deixada em meu apartamento e
recebida ontem à noite, quando cheguei a Belo Horizonte para participar
do casamento de um sobrinho. O mandado de intimação, datado de 25 do
corrente, marcava meu depoimento para o dia 27, sexta-feira, às 9 horas
da manhã, na sede da Superintendência em Minas Gerais, com a advertência
de que o meu não comparecimento, sem motivo justificado, poderia ser
passível de condução coercitiva, caracterizando ocorrência de delitos de
resistência (art. 329), desobediência (art. 330) e desacato (art. 331),
todos do Código Penal. Não é desse modo, evidentemente, que a Polícia
deve se dirigir a um ex-presidente do Supremo Tribunal Federal e
ex-presidente do Tribunal Superior Eleitoral”.
Veloso tem tida a razão. Nada custa o tratamento civilizado a
ninguém, tanto que a condução coercitiva é algo que tem sentido apenas
quando o investigado se recusa a prestar declarações. Mas vão é possível
que ele se insurja contra um ofício marcando data se considera “normal”
que um esquadrão militar madrugue na casa de um ex-presidente da
República e diga: “o senhor está convidado a vir agora e se não quiser
vir agora, vai agora também, e arrastado, algemado”.Veja a cena de Velloso dizendo que “Lula foi convidado”, na sua entrevista ao Roda Viva. E com a ressalva de que não faria assim, que preferia mandar ofícios “e deixar o sujeito sangrando”. Que alma generosa!
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