sábado, 13 de dezembro de 2014

ECONOMIA - Estabilidade monetária.


12/12/2014 - Copyleft

Estabilidade monetária: A fraude dos dogmas

É a execução da política monetária de 1999, com um diagnóstico exclusivo da inflação (de demanda) e a centralidade da dívida pública nas contas nacionais.


Paulo Rubem Santiago
Arquivo

Sob pressão dos bancos, consultorias financeiras, agências internacionais de classificação de risco (risco para quem e em relação a que?) e da mídia econômica, a Presidenta reeleita escolheu Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda.

Aplausos foram ouvidos, vozes do ramo idem, como a de Edmar Bacha, dizendo que Levy deverá ter “espaço” para desenvolver seu trabalho ou sairá, caso a Presidenta não lhe garanta essa condição, numa inovadora defesa, agora, da autonomia do Ministério da Fazenda para combater a inflação e elevar o superávit primário necessário à manutenção da relação dívida/PIB em patamares declinantes.

Renovar-se-ia assim a execução da política monetária de 1999, com um diagnóstico exclusivo da inflação (de demanda) e a centralidade da dívida pública nas contas nacionais. Nesse contexto a indexação dos preços administrados, permitida pelo Plano Real, permanece esquecida, como bem relatou Carvalho (2014) embora precisasse ser revista para o controle da inflação como apontaram Sicsú &Vidotto (2007)  e Paulani (2007),  ao afirmar, por sua vez,  que  “ num contexto de economia aberta, regime cambial flutuante e parcela substantiva dos preços operando em regime administrado, (...) apenas uma parcela muito pequena dos preços pode ser reativa à utilização dos juros como arma de controle inflacionário”.

Diversos equívocos são apontados nesse modelo de estabilidade. O privilégio dado às instituições de mercado na formação da chamada “ expectativa da inflação” é um deles, como assinalado por Oreiro & Passos (2005)  no artigo “ A governança da política monetária brasileira, análise e proposta de mudança” , no qual perguntam se “ essas expectativas refletem, de fato, a percepção dos agentes com efetivo poder de formação de preços a respeito da evolução futura da taxa de inflação, ou se elas refletem apenas as opiniões vigentes entre os operadores do mercado financeiro? ”.

Além disso, para ambos, no atual regime de metas de inflação, há pouco espaço para a acomodação dos choques de oferta, já que o Banco Central usa o índice cheio do IPCA como referência. Também para os autores “no caso específico da política monetária, os objetivos desta devem refletir um equilíbrio obtido por consenso entre o “grau de aversão social” à inflação e o “grau de aversão social” às perdas de produção e de emprego decorrentes de toda a política de desinflação “(p.5). Segundo ambos a composição atual do Conselho de Política Monetária não enseja a busca desse equilíbrio. Além disso percebemos que o aumento recente da taxa de juros para 11,75%, óbvio, elevará a dívida pública, requerendo mais superávit primário, (a nova gestão da Fazenda mira um superávit de 2% em até dois anos), mais centralidade no tema fiscal e no curto prazo.

Oreiro & Passos lembram, ainda, referindo-se a Paul Bernancke et ali (1999, p.221), que a condução da política monetária via sistema de metas de inflação não implica que as autoridades monetárias devem ignorar o objetivo tradicional da estabilização do nível de produção e de emprego. Por isso defendem uma nova governança para a área, ampliando-se o Conselho Monetário Nacional com os agentes que atuam na formação de preços (comércio, indústria, agricultura e trabalho) e a desconexão no cálculo do IPCA dos bens sujeitos a choques de oferta e flutuações inflacionárias de curto prazo, levando-se a definição dos objetivos da política monetária ao Congresso Nacional, por proposição do Poder Executivo.

Segundo os autores “(...) o sistema financeiro brasileiro pode influenciar a decisão do Banco Central a respeito da fixação das taxas de juros, pois se os bancos entrarem em acordo entre si eles podem “forçar” um aumento da taxa de juros por intermédio de uma “revisão para cima” de suas expectativas de inflação. Propõem, assim, caminhos bem diferentes dos dogmas pró-mercados que imperam desde 1999, com algumas diferenças desde então. Por isso concordamos com Paulani (2007, p.122), quando afirma que “para a construção de um modelo alternativo de política econômica, o primeiro passo é discutir formas de libertar o funcionamento da economia dos interesses financeiros, que já há algum tempo prevalecem”.  Sem esse caminho perpetuar-se-á a inércia monetária a favor dos mercados e do rentismo que lhes é próprio.

Referências

BERNANKE, B. et al. Inflation targeting: lessons from the international
experience. Princeton: Princeton University, 1999.

CARVALHO,A.R. – “A persistência da indexação no Brasil pós-Real “, Revista de Economia Política, Volume 24, No. 02, abril/junho de 2014

OREIRO,J.L. ; PASSOS, M. – “A governança da política monetária brasileira: Análise e proposta de mudança”, Indicadores Econômicos, FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 1, p. 157-168, jun. 2005

PAULANI,L. M. – “Alternativas para o Brasil no século XXI”, p.121-129, in “Arrecadação: De onde vem? E Gastos Públicos: Para onde vão? “, Boitempo Editorial, São Paulo, 2007.
SICSU,J.;VIDOTTO,C. – “A administração fiscal no Brasil e a taxa de juros”, p.111-120, in “Arrecadação: De onde vem? E Gastos Públicos: Para onde vão? “, Boitempo Editorial, São Paulo, 2007.

 
(*) Deputado Federal PDT-PE

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