Protestos do 15 de março foram orquestrados pela mídia, dizem jornalistas ativistas
Escrito por: Daniella Franco
Fonte: RFI
Fonte: RFI
O clima de festa mostrado pela grande mídia brasileira não é nada parecido com o veiculado pela mídia alternativa, que mostrou uma falta de cultura política de muitos participantes, um clima agressivo, e um protesto com pautas contraditórias.
Um clima de festa, uma militância vestida de verde amarela, uma
participação de massa, pacífica e contra a corrupção. Foi essa a imagem
que a grande mídia brasileira mostrou das manifestações que levaram
milhares de brasileiros às ruas no último domingo, dia 15 de março. Um
retrato nada parecido com o veiculado pela mídia alternativa ou pelas
redes sociais, que mostrou a falta de cultura política de muitos
participantes, um clima agressivo, e um protesto com pautas
contraditórias. Muitos manifestantes pediam reforma política, outros o
impeachment da presidente Dilma Rousseff, e alguns se manifestaram pelo
restabelecimento da ditadura militar.
Para o jornalista Bruno Torturra, da agência de notícias Fluxo, faltou
um espírito crítico e honesto na cobertura da mídia tradicional das
manifestações de 15 de março. "A falta de visão crítica da mídia antes e
durante os protestos foi fundamental até para as pessoas irem às ruas.
Na televisão, havia esse sentimento de festa, de celebração e essa
insistência de que as manifestações eram seguras, de que as famílias
estavam participando, de que tudo era muito lindo", ressalta.
Essa também não foi a impressão da jornalista Larissa Gould, do
coletivo Jornalistas Livres, que cobriu a manifestação de São Paulo.
"Conversei com pessoas de todas as frentes, mas, em comum, está a
ausência de propostas. Todos estão insatisfeitos, o que é legítimo,
porque, de fato, o país passa por um momento crítico de corrupção. Mas
quando eu perguntava : ‘mas se sai a presidente Dilma, o que se faz ?’
Ninguém sabia responder".
Para Larissa, a cobertura jornalística da grande mídia falhou ao não
mostrar o lado negativo dos protestos. "Houve violências, agressões,
bandeiras de partidos sendo rasgadas. Mas só o que se viu,
principalmente na televisão, foi a grande festa da democracia e a
insatisfação plena contra o governo", diz.
A jornalista também critica a falta da cobertura das manifestações de
sexta-feira (13), convocada pela Central Única dos Trabalhadores (CUT)
pela defesa da Petrobras, dos direitos trabalhistas e da reforma
política.
Debate político carregado de ódio
"Há muita sede de participação e de opinião, mas há pouca compreensão
das regras básicas da política e até mesmo das próprias eleições", diz
Bruno Torturra. Para ele, o debate político no Brasil ainda é carregado
de ódio, o que é preocupante. "As pessoas confundem raiva com
politização, caças às bruxas com opinião política", observa.
O jornalista acredita que é controverso que a grande mídia tenha
classificado as manifestações de pacíficas. "É relativo chamar de
pacífico um protesto que prega o ódio, que pede a volta do regime
militar ou que expulsa um manifestante que está vestido de uma cor
diferente da maioria", declara, referindo-se aos casos de violência
contra as pessoas vestidas de vermelho durante a mobilização de domingo.
Função de um partido político
Segundo o professor Nildo Ouriques, do Instituto de Estudos
Latino-Americanos (IELA), da Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC), a convocação das manifestações foi essencialmente realizada
pelas grandes mídias brasileiras. O fenômeno, para ele, é uma prova de
que os partidos políticos estão sem capacidade de mobilização. "A
televisão cumpriu, pela primeira vez, a função de um partido político",
ressalta.
O professor também critica a insistência da televisão em mostrar uma
participação de massa dos brasileiros nos protestos de domingo. "Foi uma
manifestação muito pequena. Reunir 210 mil pessoas em São Paulo é muito
pouco. No resto das cidades, o número de pessoas foi pífio", observa.
Muito além do que criticar um protesto das classes mais altas, para
Ouriques, a grande questão é porque as classes populares ainda não
acordaram. "Há 40 milhões de pessoas que não votaram nem na Dilma ou no
Aécio. Ou seja, o silêncio no Brasil ainda é muito maior do que a
manifestação da elite branca, empresarial e pró-Washington", finaliza.
Nenhum comentário:
Postar um comentário