FMI admite que o neoliberalismo é um fracasso
Muitas das descobertas do informe que atinge centro da ideologia neoliberal fazem eco ao que os seus críticos e vítimas vêm criticando há várias décadas.
Benjamín Dangl* - Bitácora
Na semana passada, um
departamento de investigação do Fundo Monetário Internacional (FMI)
publicou um informe no qual admite que o neoliberalismo é um fracasso.
O informe, cujo título é Neoliberalism: Oversold? (neoliberalismo: méritos exagerados?), é um sinal para que se abra uma esperança sobre a possível morte dessa ideologia.
O FMI está atrasado em apenas uns 40 anos. A jornalista canadense Naomi Klein escreveu um irônico comentário sobre o informe em seu twitter: “Então, os multimilionários criados (pelo neoliberalismo) devolverão o dinheiro, não é assim?”.
Muitas das descobertas do informe que atinge centro da ideologia neoliberal fazem eco ao que os seus críticos e vítimas vêm criticando há várias décadas.
“No lugar de promover o crescimento”, segundo o informe, “as políticas de austeridade impulsadas a partir das ideias neoliberais acabaram somente reduzindo as regulações, para limitar o movimento de capitais, o que, de fato, fez com que e aumentasse a desigualdade”.
Essa desigualdade “poderia por si só debilitar o crescimento…”. Portanto, segundo o informe, “os responsáveis políticos deveriam estar muito mais abertos à redistribuição (da riqueza) do que de fato estão”.
Entretanto, o informe omite alguns aspectos notáveis da história e do impacto do neoliberalismo.
O FMI sugere que o neoliberalismo foi um fracasso, mas que funcionou muito bem para 1% da população mundial, algo que sempre foi o propósito do FMI e do Banco Mundial. Tal como informou a organização Oxfam, em relatório difundido nos primeiros meses deste ano, o 1% mais rico da população mundial possui uma quantidade de riqueza equivalente a de todo o resto da população do planeta (do mesmo modo, a jornalista investigativa Dawn Paley comprovou em seu livro Drug War Capitalism (“A Guerra Capitalista Contra as Drogas”) que a guerra contra as drogas, longe de ser um fracasso, foi um tremendo sucesso para Washington e para as corporações multinacionais).
O informe do FMI escolheu o Chile como caso de estudo do neoliberalismo, mas não menciona nem uma só vez o fato de que as políticas econômicas e toda a ideologia neoliberal foram impostas no país durante a ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990), respaldada pelos Estados Unidos, uma omissão muito importante dos investigadores, e que não é casual, pois a ligação entre o terrorismo d Estado e a implantação do neoliberalismo na América Latina é um tema bastante conhecido.
Em 1977, em sua “Carta Aberta à Junta Militar” da Argentina, o valente jornalista Rodolfo Walsh denunciou a repressão desse regime, uma ditadura que organizou o assassinato e a desaparição de mais de 30 mil pessoas.
“Não obstante, esses acontecimentos que comovem a consciência do mundo civilizado, não constituem o maior sofrimento infligido o povo argentino, tampouco a pior violação dos direitos humanos que vocês já cometeram”, escreveu Walsh a respeito da tortura e dos assassinatos. “É na política econômica deste governo onde se percebe não só a explicação dos crimes, mas também uma gigantesca atrocidade que castiga a milhões de seres humanos: a miséria planificada… Basta dar uma volta de algumas horas pela Grande Buenos Aires para comprovar a rapidez com que essa política transformou a cidade numa favela de dez milhões de pessoas”.
Tal como demonstra vividamente a jornalista Noami Klein em sua obra prima Shock Doctrine (“A Doutrina do Choque”), essa “miséria planificada”, formava parte da agenda que o Fundo Monetário Internacional impulsou durante décadas.
Um dia depois de Walsh enviar a carta à Junta pelo correio, ele foi capturado pelo regime, assassinado, queimado e teve seu cadáver atirado num rio, tornando-se outra vítima mais entre as milhões que o neoliberalismo já produziu.
Benjamin Dangl trabalhou como correspondente na América Latina, cobrindo movimentos sociais no continente por mais de uma década. É autor de livros como Dancing with Dynamite: Social Movements and States in Latin America, e também The Price of Fire: Resource Wars and Social Movements in Bolivia. Atualmente é editor do site UpsideDownWorld.org, sobre ativismo e política na América Latina.
Tradução: Victor Farinelli
O informe, cujo título é Neoliberalism: Oversold? (neoliberalismo: méritos exagerados?), é um sinal para que se abra uma esperança sobre a possível morte dessa ideologia.
O FMI está atrasado em apenas uns 40 anos. A jornalista canadense Naomi Klein escreveu um irônico comentário sobre o informe em seu twitter: “Então, os multimilionários criados (pelo neoliberalismo) devolverão o dinheiro, não é assim?”.
Muitas das descobertas do informe que atinge centro da ideologia neoliberal fazem eco ao que os seus críticos e vítimas vêm criticando há várias décadas.
“No lugar de promover o crescimento”, segundo o informe, “as políticas de austeridade impulsadas a partir das ideias neoliberais acabaram somente reduzindo as regulações, para limitar o movimento de capitais, o que, de fato, fez com que e aumentasse a desigualdade”.
Essa desigualdade “poderia por si só debilitar o crescimento…”. Portanto, segundo o informe, “os responsáveis políticos deveriam estar muito mais abertos à redistribuição (da riqueza) do que de fato estão”.
Entretanto, o informe omite alguns aspectos notáveis da história e do impacto do neoliberalismo.
O FMI sugere que o neoliberalismo foi um fracasso, mas que funcionou muito bem para 1% da população mundial, algo que sempre foi o propósito do FMI e do Banco Mundial. Tal como informou a organização Oxfam, em relatório difundido nos primeiros meses deste ano, o 1% mais rico da população mundial possui uma quantidade de riqueza equivalente a de todo o resto da população do planeta (do mesmo modo, a jornalista investigativa Dawn Paley comprovou em seu livro Drug War Capitalism (“A Guerra Capitalista Contra as Drogas”) que a guerra contra as drogas, longe de ser um fracasso, foi um tremendo sucesso para Washington e para as corporações multinacionais).
O informe do FMI escolheu o Chile como caso de estudo do neoliberalismo, mas não menciona nem uma só vez o fato de que as políticas econômicas e toda a ideologia neoliberal foram impostas no país durante a ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990), respaldada pelos Estados Unidos, uma omissão muito importante dos investigadores, e que não é casual, pois a ligação entre o terrorismo d Estado e a implantação do neoliberalismo na América Latina é um tema bastante conhecido.
Em 1977, em sua “Carta Aberta à Junta Militar” da Argentina, o valente jornalista Rodolfo Walsh denunciou a repressão desse regime, uma ditadura que organizou o assassinato e a desaparição de mais de 30 mil pessoas.
“Não obstante, esses acontecimentos que comovem a consciência do mundo civilizado, não constituem o maior sofrimento infligido o povo argentino, tampouco a pior violação dos direitos humanos que vocês já cometeram”, escreveu Walsh a respeito da tortura e dos assassinatos. “É na política econômica deste governo onde se percebe não só a explicação dos crimes, mas também uma gigantesca atrocidade que castiga a milhões de seres humanos: a miséria planificada… Basta dar uma volta de algumas horas pela Grande Buenos Aires para comprovar a rapidez com que essa política transformou a cidade numa favela de dez milhões de pessoas”.
Tal como demonstra vividamente a jornalista Noami Klein em sua obra prima Shock Doctrine (“A Doutrina do Choque”), essa “miséria planificada”, formava parte da agenda que o Fundo Monetário Internacional impulsou durante décadas.
Um dia depois de Walsh enviar a carta à Junta pelo correio, ele foi capturado pelo regime, assassinado, queimado e teve seu cadáver atirado num rio, tornando-se outra vítima mais entre as milhões que o neoliberalismo já produziu.
Benjamin Dangl trabalhou como correspondente na América Latina, cobrindo movimentos sociais no continente por mais de uma década. É autor de livros como Dancing with Dynamite: Social Movements and States in Latin America, e também The Price of Fire: Resource Wars and Social Movements in Bolivia. Atualmente é editor do site UpsideDownWorld.org, sobre ativismo e política na América Latina.
Tradução: Victor Farinelli
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