O uso do dinheiro não contabilizado (caixa-dois) decorre do nosso sistema político, pelo qual empresas doam dinheiro para candidatos em campanha eleitoral. Empresas doam dinheiro para candidatos, não por ideologia, pois doam para vários candidatos. Empresas doam porque têm interesse, não paixão política. Interesse de empresa é lucro, jamais o bem comum.
O PT, para quem não sabe, sempre defendeu o financiamento público exclusivo de campanha.
Ora, quando um partido tem um candidato a presidente, precisa fazer aliança com outros partidos, tanto para ajudar a eleger o candidato como para formar a base aliada a fim de garantir a tal governabilidade. Ou seja, para que o/a presidente eleito/a consiga aprovação de suas propostas no parlamento. No sistema presidencialista é assim; o chamado "governo de coalizão, diferentemente dos sistemas parlamentaristas. Nestes, após a eleição do presidente o povo vota em deputados de partidos afinados com o partido do presidente eleito.
Por que em nosso sistema político um partido precisa ajudar os partidos aliados numa campanha eleitoral? Ora, não sejamos hipócritas. Precisa "comprar" o apoio dos aliados. Nenhum partido vai fazer campanha para eleger o candidato de outro partido de graça, pelo simples fato de que, além de ter interesse em eleger o máximo de seus candidatos para ter mais poder político, precisa eleger parlamentares para formar a base aliada. Sabemos que sem dinheiro ninguém consegue se eleger.
O voto ideológico no Brasil é muito restrito. Uma campanha demanda dinheiro para pagar pesquisas, material de campanha, alimentação, combustível, propaganda, cabos eleitorais para fazerem o trabalho de convencimento nas bases, enfim, só no gogó em palanques, em caminhadas e no horário eleitoral na rádio e na TV ninguém ganha eleição. O partido de Roberto Jefferson foi um dos que se aliaram ao PT para eleger Lula e parte do dinheiro que recebeu, o "delator do mensalão" colocou no próprio bolso.
Quando se pretende desmascarar a farsa do mensalão é porque o dinheiro repassado para parlamentares de outros partidos era dívida que o PT tinha ainda com esses partidos, não desvio de dinheiro público para "comprar apoio no parlamento" através de pagamento a cada votação de interesse do governo Lula. Se houve um crime, como assumiu de forma corajosa Delúbio Soares durante os trabalhos da CPI, foi o crime de caixa-dois, um crime eleitoral, não da esfera do Direito Penal. Um crime que praticado por todos os partidos, que sempre existiu e vai continuar existindo caso não seja realizada uma reforma política e eleitoral neste país.
Mas a montagem de um pacote chamado "mensalão" com um chefe de uma grande quadrilha, com vários núcleos (político, publicitário e operacional) foi muito bem arquitetada e no fundo tinha um único objetivo que era, inicialmente, chegar ao impeachment de Lula. Como perceberam que isso poderia ter consequências desastrosas, então o negócio foi preservar Lula e começar por destruir o homem forte do governo: Zé Dirceu, o "chefe da quadrilha". Tinham a certeza de que Lula não seria reeleito, o que não aconteceu. Depois achavam que o "escândalo do mensalão" impediria que Lula não elegeria sua sucessora. O que não aconteceu. Depois acharam que um julgamento em plena campanha eleitoral impediria que o PT elegesse Fernando Haddad. O que não aconteceu.
Findo o "maior julgamento da história", encontram-se presos hoje José Dirceu, Genoino (em prisão domiciliar provisória), Delúbio Soares e João Paulo Cunha. Cada um deles com uma história de luta no partido e pela democracia. Um julgamento que se mostrou político do início ao fim e que continua político e de exceção na fase de execuções penais, desde a prisão de José Genoino e José Dirceu num feriado da Proclamação da República até agora, com as flagrantes arbitrariedades que têm sido cometidas contra Delúbio Soares e José Dirceu, num claro indício de uma sanha persecutória do presidente do STF, que cometeu um gravíssimo desrespeito aos seus pares e à própria instituição quando, após proclamar o resultado do julgamento dos embargos infringentes, que absolveu os réus acusados do crime de formação de quadrilha, afirmou que os votos da maioria dos ministros basearam-se em “argumentos pífios” de uma maioria composta “sob medida”. Acusou Barroso, reconhecidamente um dos maiores constitucionalistas do país, como Teori Zavascki, proveniente do STJ, não apenas de serem ministros vendidos, mas de comporem com os ministros que já tinham absolvido, uma maioria de conveniência.
Triste tarde para o STF, para a democracia, para o Estado democrático de Direito e para nação quando aquele que preside um dos três poderes da República se arvora a praticar tamanha afronta. Nem no tempo da ditadura coisa semelhante aconteceu. Isso prova o que tanta gente afirmava: que Joaquim Barbosa atuou como um membro do MP, não como magistrado. Seu objetivo nunca foi julgar os réus da AP 470, mas condenar e prender os réus do “mensalão” e, pelo jeito, com pretensões eleitorais.
Enfim, não sejamos hipócritas. Sem o caixa-dois e sem o financiamento de partidos aliados Lula não teria sido eleito. Nem o país teria hoje 40 milhões de pessoas que saíram da linha da pobreza extrema, só para citar um exemplo dos avanços dos governos Lula e Dilma. Antes que alguém diga que os fins não justificam os meios, digo logo que o recurso a esta frase muitas vezes denota a pura hipocrisia dos que sempre valorizaram muito mais os meios do que os verdadeiros fins da política.
No fundo, a oposição não tem ódio da "falta de moral" do PT. É ódio ao PT. O apelo ao discurso da moral e da criminalização do PT é meramente um expediente, uma reação dos que não se conformam em ter deixado de conduzir o país a partir da casa grande. O ódio é porque o PT chegou ao poder. É preconceito ideológico e ódio de classe. Para essa gente o PT bom era o PT que vivia de vender camisetas e estrelinhas em tempo de campanha. O PT que não tinha cacife para chegar ao Planalto, esta é a verdade. O discurso moralista que grassa na imprensa contra a absolvição pelo crime de quadrilha é a reação dos que queriam formar uma opinião generalizada sobre o PT como uma grande quadrilha, a fim de influir na reeleição de Dilma. O sonho dos que queriam se ver “livres dessa raça” por uns 30 anos começa a se tornar pesadelo com a perspectiva das revisões criminais e dos recursos às cortes internacionais.
O julgamento da AP 470 com a condenação dos réus petistas fez com que muita gente achasse que a militância fosse ficar constrangida, acuada e envergonhada do próprio partido. Pelo contrário. Fortaleceu e uniu uma militância extremamente politizada que não aceita e nem aceitará os erros de tal julgamento nem a injustiça dele decorrente. Uma injustiça que ameaça a democracia, pois a injustiça que se pratica a um e a alguns é uma ameaça que se faz a todos e a cada um no Estado democrático de Direito.
Petistas têm admiração, respeito e orgulho pelos companheiros que estão presos. Têm orgulho de ser petistas, de defender a política e a democracia. Ao contrário dos que os acusam. A estes sim falta dignidade, a coragem e a competência necessárias para a disputa verdadeiramente política, posto que só sabem fazer a disputa política pela via do denuncismo, da acusação, do golpe baixo e do moralismo fácil e barato. Talvez seja por isso que se dizem “apartidários”.
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