sábado, 16 de agosto de 2014

POLÍTICA - Os dilemas do PSB.

Os dilemas do PSB

Autor: Miguel do Rosário
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Por falta de melhor termo, chamo Roberto Amaral de um presidente (de partido) cristianizado.
Em todas as matérias da nossa imprensa “ancien regime” lá estavam eles, os adjetivos  e adjuntos adnominais.
Na Folha:
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O Globo abusou da estratégia. Onde aparece o nome de Roberto Amaral, segue um adjunto adnominal explicando que ele é “próximo do PT” ou “simpatizante”.
Não ficou só nisso. O jornal fez textos “acusando” Amaral de ser quase um petista.
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A estratégia revela o que, na verdade, sempre esteve por trás do apoio velado de “formadores de opinião” e “mercado” a Eduardo Campos: a intenção de neutralizar os fumos “socialistas” do partido e estimular a sua ala conservadora.
Você não verá nenhum dirigente do PSB ser acusado de “simpatizante do PSDB”, ou pelo menos não de maneira repetitiva, sistemática.
Os códigos da mídia são relativamente fáceis de entender. Se alguém disser, aqui e ali, que você é simpatizante do PT, tudo bem. Mas quando os jornais começam a repetir, a toda hora e a todo momento, mesmo em matérias que não tratam dessa questão, que você é simpatizante ou próximo ao PT, então isso já não é uma descrição. É uma acusação.
É como se Roberto Amaral, um dos quadros mais antigos e mais leais a seu partido, de repente não fosse mais um quadro partidário confiável. Como se ele fosse mais leal ao PT do que ao PSB, o que é uma injustiça absurda, evidentemente. Amaral aceitou estoicamente a presença de Marina e a guinada neoliberal de Eduardo Campos. Com a morte trágica deste último, tudo que ele pedia era: tempo. “Vamos enterrar Campos e depois discutimos”, pedia ele, e foi o que bastou para a mídia lhe acusar de ser “próximo ao PT”.
Roberto Amaral tornou-se um presidente cristianizado, não apenas pelos quadros de seu próprio partido, mas sobretudo pela mídia.
Merval Pereira, no dia seguinte à morte de Campos, falou abertamente, em sua coluna:
“Há um grupo à esquerda no partido que sempre preferiu o apoio à candidatura Dilma, dando continuidade a uma aliança histórica com o PT (…)”
Esse tipo de franqueza não é muito comum em nossa imprensa. Só mesmo uma tragédia para fazê-la abrir a guarda.
Evidenciou-se, portanto, que há, dentro do PSB, uma ala direita, que defende a proximidade com tucanos, e uma ala à esquerda, mais próxima ao PT.
*
Houve um tempo, talvez, em que Campos quisesse se posicionar levemente à esquerda do PT, tentando faturar com o desgaste causado pelas concessões inevitáveis num governo de coalizão.
O socialista, contudo, não conseguiu espaço nessa área e sua candidatura foi sendo empurrada para o campo conservador. Foi aí que ele passou a defender coisas como “autonomia do Banco Central” em reuniões junto ao empresariado.
Sua morte trágica, caindo qual bomba atômica sobre a cúpula do partido, teria o condão de provocar, no mínimo, um momento de reflexão, como parece ter tentado fazer, quase heroicamente, Roberto Amaral.
Ou acelerar o processo na direção do conservadorismo.
Um cientista político, em entrevista à Folha, já tinha previsto o que todos sabiam que iria acontecer: uma pressão insuportável para que Marina fosse a candidata. Insuportável.
Com Marina novamente no páreo, contudo, não há novidade.
Não há nenhuma “nova política”.
Independente de seu passado, Marina surfa na crista de uma onda conservadora, agora tisnada com sangue.
Assim como Gabeira terminou melancolicamente sua carreira sendo chamado de “ex-Gabeira” por um adversário do PSOL durante um debate na TV, é possível que Marina também se torne uma “ex-Marina”.
Aécio Neves aconselhava, semanas atrás, àqueles que via como possíveis aliados, a “sugarem mais um pouquinho” do governo antes de irem para o seu lado.
Talvez seja justamente isso que Marina faça, empurrada pelas pressões, pelas circunstâncias, por suas próprias ambições: irá sugar um pouquinho, ou mesmo um montão, dos votos de Aécio Neves. E depois irá para seu lado, num eventual segundo turno. Dessa vez, ela será obrigada a isso, creio eu, por causa da pressão “insuportável”.
A esta altura, essa pressão insuportável abandonou qualquer escrúpulo e se tornou chantagem. As ordens chegam pelos editoriais. Marina tem que fazer isso, tem que falar aquilo.
Em troca, a imprensa lhe garantirá blindagem e publicidade positiva.
Em meio a tantas névoas, só uma coisa é certa – além da morte e dos impostos, como diria Benjamin Franklin: a propaganda eleitoral obrigatória em rádio e TV.
A tragédia que vitimou Campos renova o interesse pelas eleições, embora com um toque mórbido.
A propaganda eleitoral no Brasil é tão importante porque ela inverte o jogo. A TV, quase sempre um instrumento em prol da antipolítica, se converte, temporariamente, em seu oposto.
Por algumas semanas, abrir-se-á, na democracia brasileira, uma janela para a comunicação direta entre a política e os cidadãos.
Claro, junto a candidatos sérios, aparecerão demagogos, idiotas, malandros, pedindo nosso voto. Mas ambos, os sérios e os malandros, estarão falando diretamente conosco, sem intermédio de nenhum âncora de TV, de nenhum colunista. Isso é o mais importante.

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