A estrutura do caos
Autor: Adriano Benayon
A taxa de juros
SELIC, a taxa base para títulos do Tesouro Nacional já estava demasiado
alta em 11.25 pontos percentuais em novembro de 2014. Após sucessivas
elevações, o COPOM (Conselho de Política Monetária), “orientado” pelo
BANCO CENTRAL a elevou para 12.75 pontos percentuais.
2. A taxa efetiva,
basicamente determinada pelo cartel de bancos credenciados como dealers
desses títulos oficiais, fica, em média, três pontos acima da taxa
básica (hoje quase 16% aa.), ou ainda mais em períodos turbulentos.
3. Tais juros – sem
paralelo em países não submetidos ao império financeiro, controlado pela
oligarquia angloamericana – causam intensa hemorragia nas finanças
públicas, um de cujos efeitos é elevar a conta dos juros a cada ano e
fazer crescer incontrolavelmente o estoque da dívida.
4. Isso se dá em função
da capitalização dos juros através da emissão de novos títulos para
liquidar os que vão vencendo, pois as receitas tributárias (das quais
vem o superávit primário) são, de longe, insuficientes.
5. Para uma ideia do
estrago desencadeado por poucos pontos percentuais na taxa, basta fazer
simulações com a composição anual dos juros.
6. Os juros
incorporados ao principal – supondo que não se liquidassem juros e
amortizações, em dinheiro, durante 30 anos – fariam ascender os 3
trilhões de reais, no momento, da dívida interna), para os seguintes
montantes:
1) 12% aa. = R$ 89,9 trilhões, (multiplicaria a dívida por 30);2) 15% aa. = R$ 198,6 trilhões, (a multiplicaria por 66);
3) 18 % aa. = R$ 430,1 trilhões (a multiplicaria por 144).
7. Portanto, a cada
três pontos percentuais de aumento, o multiplicador mais que dobraria.
Do jeito que vai a presente taxa efetiva (18% aa.), a dívida atingiria
quantia equivalente a US$ 143 trilhões, ou seja, quantia igual a duas
vezes a soma dos PIBs de todos os países do mundo.
8. Tenho explicado que
os formadores de opinião, montados no monopólio da comunicação social –
cujo negócio é desinformar – fazem a maior parte do público comprar a
ideia de que as elevações das taxas de juros seriam necessárias para
conter a inflação dos preços.
9. As artes da
desinformação incluem fazer acreditar numa entidade misteriosa chamada
“mercado”, a que se atribui exigir os injustificáveis juros
estratosféricos. Então, aos olhos do público esses juros deixam de ser o
instrumento do saqueio cometido pelo cartel dos bancos e são imputados
ao abstrato “mercado” e a supostas leis econômicas, igualmente
abstratas.
10. A armação a serviço
dos concentradores financeiros desvia a discussão do terreno dos fatos
para o das teorias econômicas e para o das doutrinas
político-filosóficas.
11. A questão não é
doutrinária: não são neoliberais nem necessariamente partidários da
direita os defensores e aproveitadores da política de juros altos, tal
como os da política de subsidiar trilionariamente os carteis
transnacionais.
12. Trata-se
simplesmente de arrancar do Brasil quantias e recursos naturais
incalculáveis. É pirataria, assalto, extorsão, reminiscente das proezas
imperiais do século XIX, como as guerras do ópio, que o império
britânico desencadeou contra a China, de 1839 a 1842 e de 1856 a 1860.
13. O objetivo inicial
dessas guerras foi deixar de pagar em ouro (mesmo dispondo a Inglaterra
abundantemente do metal proveniente do Brasil e alhures) as importações
das manufaturas produzidas na China, bem como apropriar-se das
indústrias e roubar-lhe as técnicas de produção, tal como já havia feito
na Índia.
14. Falando nesta, para
produzir o ópio destinado à China, era só explorar os trabalhadores e a
terra da Índia, saqueada de 1757 a 1863, em recursos equivalentes ao
dobro dos investimentos feitos na Inglaterra, inclusive em imóveis.
15. A Grã-Bretanha
havia transformado o grosso de suas importações da Índia em pilhagem
escancarada, deixando de pagar o que quer que fosse por elas. Vide André
G. FRANK, Acumulação Mundial 1492-1789. Rio de Janeiro, 1977, pp. 178
et segs.
16. Ao contrário do que
se imagina, a Índia não era pobre e só no Século XIX é que afundou na
miséria extrema, com milhões com fome, dormindo na rua em Calcultá. Os
incautos admiradores brasileiros do império angloamericano não percebem
que, no curso atual, é para algo assim que o País se encaminha.
17. Os juros abusivos
nos títulos públicos – e mais ainda no crédito a empresas e a pessoas
físicas, bem como os espantosos subsídios às aplicações financeiras e às
empresas transnacionais – são apenas alguns dos mecanismos montados
para tornar falido o Brasil e acelerar sua dilaceração sob as bicadas de
vorazes abutres financeiros.
18. Informa-se agora
sobre propinas na Receita Federal de empresas transnacionais, e bancos
estrangeiros e locais, para deixar de pagar impostos devidos. O mais
notável é que esses bancos e empresas são extremamente favorecidos pela
legislação: para saquear, nem precisam sonegar nem inadimplir impostos,
mas o fazem para aumentar o butim.
19. As transnacionais
são, ademais, cumuladas de inacreditáveis favores fiscais e subsídios,
tendo elas praticamente assumido o poder desde o governo
militar-udenista que derrubou Vargas em 1954.
20. Daí - não obstante
a quantidade colossal das exportações agrícolas e minerais - continua
crescendo até hoje, agora em ritmo acima de mais de US$ 90 bilhões/ano,
o déficit de transações correntes com o exterior, por causa das
transferências ao exterior dos imensos lucros das transnacionais, sob as
mais diversas formas contábeis.
21. Mesmo alguns
governos militares que tinham a meta de ampliar o poder nacional através
de estatais, especialmente em áreas estratégicas, viram-se frustrados
pela armadilha da dívida externa, ficando reféns do “sistema financeiro
internacional” a comandar a área financeira do governo.
22. Esse sistema
engendrou a Nova República e, mediante a mesma chantagem da dívida,
desnacionalizou mais segmentos da economia, inclusive estatais, ficando
as eleições dependentes do poder financeiro concentrado e da grande
mídia, sempre a serviço do império.
23. A corrupção é,
pois, sistêmica, e os desmandos na Petrobrás são uma de suas menos
expressivas manifestações. Mas servem aos agentes do império e a seu
cartel do petróleo para apossar-se de uma das maiores reservas, do
mundo, dessa altamente estratégica fonte de energia.
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Adriano Benayon é doutor em economia pela Universidade de Hamburgo e autor do livro Globalização versus Desenvolvimento.
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