sexta-feira, 1 de agosto de 2014

ISRAEL - Como funciona sua propaganda.

Patrick Cockburn: Uma aula sobre como funciona a propaganda de Israel



Perda de Território pelos Palestinos para Israel
Esquecer a História, o direito de retorno, onde ficam as fronteiras e o cerco a Gaza
O relatório secreto que ajuda os israelenses a encobrir atrocidades.

Como Israel fala sobre crimes de guerra.

PATRICK COCKBURN, no Counterpunch.org

Os porta-vozes de Israel têm um modelo para explicar como eles mataram mais de 1.000 palestinos na Faixa de Gaza, a grande maioria civis, enquanto apenas três civis foram mortos em Israel por foguetes e morteiros lançados pelo Hamas. Mas na televisão, no rádio e nos jornais, os porta-vozes do governo de Israel, como Mark Regev, se mostram mais engenhosos e menos agressivos do que seus antecessores, que eram visivelmente indiferentes à quantidade de palestinos mortos.
Existe um motivo para essa melhoria nas habilidades do trabalho de relações públicas dos porta-vozes israelenses. Observando o que eles dizem, o script que estão usando é um estudo profissional, bem pesquisado e confidencial sobre como influenciar a mídia e a opinião pública nos Estados Unidos e na Europa.
Ele foi escrito pelo especialista em pesquisas e estrategista político republicano Dr. Frank Luntz, um estudo encomendado há cinco anos pelo grupo chamado The Israel Project, que tem escritórios nos Estados Unidos e em Israel, para ser usado pelos que “estão na linha de frente da guerra por Israel na mídia”.
Todas as 112 páginas do manual foram marcadas com a frase “não é para ser distribuído ou publicado” e é fácil entender o motivo.
O relatório Luntz, oficialmente intitulado “The Israel project’s 2009 Global Language Dictionary” (Dicionário de Linguagem Global 2009 do Israel Project) foi vazado quase imediatamente para a Newsweek Online, mas sua verdadeira importância foi pouco avaliada.
Ele deveria ser leitura obrigatório de todo mundo, especialmente jornalistas, interessados em qualquer aspecto da política israelense em relação ao “o que fazer e o que não fazer” dos porta-vozes israelenses.
O texto é altamente esclarecedor a respeito do abismo que existe entre o que autoridades e políticos israelenses realmente acreditam e o que eles dizem, formatado em detalhes minuciosos por pesquisas de opinião para determinar o que os norte-americanos querem ouvir.
Certamente nenhum jornalista que entreviste um porta-voz israelense deve levar a entrevista adiante sem antes ler a prévia das muitas frases e temas empregados pelo Sr. Regev e seus colegas.
O livrinho está cheio de conselhos substanciais a respeito de como os porta-vozes devem adaptar suas respostas para diferentes públicos.
Por exemplo, o estudo diz que “os norte-americanos concordam que Israel ‘tem direito a uma fronteira que possa defender’. Mas não ajuda em nada definir exatamente onde deve ser essa fronteira. Evite falar sobre fronteiras em termos de antes ou depois de 1967, porque isso só serve para lembrar os norte-americanos da história militar de Israel”.
Particularmente com a esquerda, isso prejudica. Por exemplo, “o apoio ao direito de Israel de defender suas fronteiras cai de 89% para 60% quando você fala em termos de 1967”.
Que tal o direito de retorno dos refugiados palestinos que foram expulsos ou fugiram em 1948 e nos anos seguintes e que não podem voltar para suas casas?
Aqui o Dr. Luntz tem um recado sutil para os porta-vozes. Ele diz que “o direito de retorno é um assunto difícil para os israelenses tratarem com eficácia porque muito da linguagem israelense soa como o ‘separado mas igual’, vocabulário dos segregacionistas dos anos 50 e dos defensores do apatrtheid nos anos 80. [Nota do Viomundo: Trata-se do fato de que os palestinos são de segunda classe em Israel] O fato é que os norte-americanos não gostam, não acreditam e não aceitam o conceito de ‘separado mas igual’”.
Então, como os porta-vozes devem lidar com o que o guia admite ser uma questão difícil? Eles devem chamá-la de uma “reivindicação”, porque os norte-americanos não gostam de pessoas que reivindicam.
“Então diga ‘os palestinos não estão satisfeitos com seu próprio estado. Agora eles reivindicam território dentro de Israel’”.
Outras sugestões de respostas israelenses eficazes incluem dizer que o direito de retorno deve ser parte de um acordo final “em algum momento no futuro”.
O Dr. Luntz observa que os norte-americanos em geral temem imigrações massivas para os Estados Unidos. Então, mencionar “imigração em massa palestina” dentro de Israel não vai cair bem com eles. Se nada mais funcionar, diga que o retorno dos palestinos “atrapalharia o esforço de atingir a paz”.
O relatório Luntz foi escrito após a Operação Chumbo Fundido, de dezembro de 2008 a janeiro de 2009, quando 1.387 palestinos e nove israelenses foram mortos.
Ele tem um capítulo inteiro sobre “isolar o Hamas apoiado pelo Irã como obstáculo à paz”. Infelizmente, quando veio a Operação Margem Protetora, que começou no dia 6 de julho, os propagandistas israelenses tiveram um problema porque o Hamas se desentendeu com o Irã por conta da guerra na Síria e não teve mais contato com Teerã. Relações amigáveis foram retomadas apenas nos últimos dias – graças à invasão israelense.
Muitos dos conselhos do Dr. Luntz dizem respeito ao tom e à apresentação dos argumentos de Israel. Ele diz que é absolutamente crucial demonstrar empatia com os palestinos: “Convencíveis não querem saber o quanto você sabe mas o quanto você se preocupa. Mostre empatia com relação aos DOIS lados!”.
Isso pode explicar o fato de que um bom número de porta-vozes israelenses quase lastima os problemas dos palestinos, enquanto são martelados por bombas israelenses.
Em uma frase em negrito, sublinhada e em caixa alta, o Dr. Luntz diz que os porta-vozes ou líderes políticos israelenses não devem nunca justificar “o massacre deliberado de mulheres e crianças inocentes” e devem questionar agressivamente os que acusam Israel destes crimes.
Os porta-vozes israelenses se esforçaram para seguir essa recomendação quando 16 palestinos foram mortos em um abrigo da ONU na faixa de Gaza na quinta-feira.
Existe uma lista de palavras e frases a serem usadas e a lista das que devem ser evitadas. A campeã de todas: “A melhor maneira, a única maneira, de atingir uma paz duradoura é com o respeito mútuo”.
Acima de tudo, o desejo israelense de paz com os palestinos deve ser enfatizado todo o tempo. Isso é o que a grande maioria dos norte-americanos quer que aconteça. Mas qualquer pressão sobre Israel para que faça a paz pode ser reduzido dizendo “um passo de cada vez, um dia de cada vez”, o que será aceito como “uma abordagem de bom senso na equação terra-por-paz”.
O Dr. Luntz cita como exemplo de “entrevista israelense eficaz” uma que diz: “Eu particularmente quero me dirigir às mães palestinas que perderam seus filhos. Nenhum pai deve enterrar seu filho”.
O estudo admite que o governo israelense realmente não quer a solução dos dois estados, mas diz que isso deve ser mascarado já que 78% dos norte-americanos a querem. As esperanças de melhoria econômica para os palestinos devem ser enfatizadas.
O primeiro ministro Benjamin Netanyahu foi citado com aprovação por ter dito que “é hora de alguém perguntar ao Hamas: o que exatamente VOCÊ está fazendo para levar prosperidade ao seu povo?”.
Essa hipocrisia é inacreditável, depois de sete anos de cerco econômico de Israel que reduziram Gaza à pobreza e à miséria.
Em todas as ocasiões, a apresentação dos acontecimentos por parte dos porta-vozes israelenses é desenhada para dar aos norte-americanos e europeus a impressão de que Israel quer a paz com os palestinos e está preparada para fazer concessões para chegar lá, quando todas as evidências mostram o contrário. Apesar de não ter tido essa intenção, poucos estudos mais reveladores já foram escritos sobre a Israel moderna em tempos de guerra e de paz.
PATRICK COCKBURN é autor de “The Jihadis Return: ISIS and the New Sunni Uprising”.
Tradução de Heloisa Villela

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