segunda-feira, 27 de outubro de 2014

POLÍTICA - A vitória "ilógica" de Dilma.



Após vitória 'ilógica', Dilma deve qualificar governo para enfrentar oposição fortalecida


Analista sustenta que erros tucanos e acertos petistas levaram a reeleição da presidenta, que contou com apoio de movimentos sociais e agora terá de investir no diálogo para governar

por Redação RBA publicado 27/10/2014 13:19
 


Paulo Pinto/Fotos Públicas
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Militantes festejam vitória de Dilma em São Paulo: analista prevê segundo mandato melhor
São Paulo – O professor da Fundação Escola de Sociologia e Política (Fesp) de São Paulo, Aldo Fornazieri, disse hoje (27) que o triunfo da presidenta Dilma Rousseff (PT) contrariou a conjuntura eleitoral. “Foi uma vitória contra a lógica. Havia anseio de mudança em 70% da população. E houve uma ampla aliança em torno do candidato do PSDB, Aécio Neves”, analisa. “Foi um resultado contra os poderosos do país, que não conseguiram encarnar a mudança. Isso se deve a acertos na campanha petista e erros na tucana.”
Para Fornazieri, Dilma acertou ao trazer o debate eleitoral para “perto” dos eleitores ao insistir em temas como a valorização do salário mínimo e o aumento da renda dos trabalhadores, êxitos dos governos do PT. “Aécio errou ao falar de mudança sem explicar o que seria essa mudança nem para onde o país iria”, observa o professor da Fesp. “O tucano também errou ao insistir no tema da corrupção. Parte do antipetismo se deve à ideia de que o PT é corrupto, mas seu discurso ficou limitado pelas revelações do aeroporto de Cláudio (MG). Ele tem telhado de vidro.”
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Outro erro de Aécio, continua, se deveu à nomeação prematura do ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga, como futuro ministro da Fazenda em caso de vitória tucana. “Armínio disse que o salário mínimo estava muito alto e que reduziria papel dos bancos públicos. Assim, vulnerabilizou a campanha do PSDB”, pondera Fornazieri. “Dilma desconstruiu a fama de bom gestor de Aécio, lembrando que não investiu corretamente em saúde e educação quando era governador de Minas Gerais. A petista também frisou que havia vencido o tucano no estado, onde as pessoas o conheciam.”
Entre erros e acertos, Dilma Rousseff acabou com 51,64% dos votos válidos. Aécio Neves, com 48,36%. A diferença de apenas 3,28 pontos percentuais – ou 3.459.963 votos – transformou o pleito de 2014 num dos mais acirrados desde a redemocratização. “Essa votação apertada é boa para o Brasil”, acredita Fornazieri. “Uma oposição forte e bem constituída fará com que o governo seja mais ativo, porque será mais cobrado. O discurso da unidade não é muito positivo. A democracia se forja na divergência, no conflito. Se o governo não tem oposição forte, ele se acomoda.”
Esse é um dos motivos que levam o professor a apostar que o segundo mandato de Dilma será melhor. “A presidenta tem que nomear um ministério mais qualificado e dar mais autonomia aos ministros ao invés de centralizar tudo e querer ser onisciente”, afirma. “No discurso de vitória, Dilma prometeu mais diálogo. Houve um tom autocrítico, quando ela disse que será uma presidenta melhor. Reconheceu que seu governo foi burocrático. E apontou para mudanças. Esse resultado apertado foi também sinal de alerta para PT e governo.”
Ao lembrar do papel dos movimentos sociais para o triunfo da presidenta, “porque estão junto com a base votante”, o professor da Fesp sugere que o partido passe por uma “profunda” reforma moral e política. “O antipetismo tem a ver com certo ódio disseminado contra o partido, mas também com o fato de que boa parcela da população identifica no PT um partido corrupto”, interpreta. “É preciso mudar essa percepção urgentemente. Outros partidos com a imagem da corrupção, como PFL, foram perdendo relevância e morrendo.”
Fornazieri lembra que o PT está perdendo simpatia entre a população mais jovem. “Isso é perder perspectiva de futuro”, sustenta, propondo uma guinada. “O partido deve voltar às bases. Até Lula já disse que o PT virou um partido de gabinete, cavando um fosso entre ele e o povo. É preciso voltar a fazer política onde as pessoas estão: nos bairros, sindicatos e movimentos sociais. As pessoas que tomaram o caminho da corrupção devem ser expulsas. É preciso seguir mais de perto a atuação dos parlamentares petistas e não aceitar desvios éticos.”
Sobre as reformas propostas pela presidenta ontem (26), o professor da Fesp se diz “cético” sobre a concretização de mudanças no sistema político-eleitoral. “É muito difícil, ainda mais pela via plebiscitária, como Dilma propõe”, lamenta. “O governo deveria se fixar em outras reformas, como tributária e urbana, com participação mais efetiva da união na segurança pública. São reformas que atingem diretamente a vida das pessoas. E devem ser enfatizadas. Dilma pode ainda acertar o cenário econômico, com ajustes fiscais duros, já no primeiro ano, para usufruir desse freio de arrumação que a área econômica precisa.”
Lembrando o episódio ocorrido nas vésperas do pleito com a revista Veja, que publicou, sem provas, uma capa dizendo que Lula e Dilma sabiam “tudo” sobre o esquema de corrupção na Petrobras, Fornazieri defende a necessidade de regulamentar os artigos da Constituição relativos à radiodifusão. “É preciso fazer não para controlá-los, mas para combater os monopólios. A concentração é perniciosa para a democracia”, argumenta. “O governo não deve ter medo, mas, sem pressão da sociedade, não dá. Quanto mais mobilização houver, melhor para a democracia.”

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