Por Wagner Iglecias, especial para o Maria Frô
Pode-se criticar Aécio por muitas
coisas, mas pelo menos ele não esconde o jogo. Há alguns meses ele
declarou que se eleito vai tomar “medidas impopulares”, provavelmente
convencido de que é preciso fazer um ajuste nas contas do governo e que
este trará, inevitavelmente, perdas. No caso, ao povo. Por uma escolha
política, obviamente. E quais seriam estas perdas? Desemprego? Redução
do crédito subsidiado? Corrosão do salário mínimo e do poder de compra?
Não se sabe. Mas a declaração foi feita.
Aécio tem em Armínio Fraga,
ex-presidente do Banco Central durante o governo FHC e hoje em dia um
muito bem-sucedido operador do mercado financeiro, aquele que talvez
seja seu principal conselheiro em matéria de economia, e provavelmente
um dos mais destacados formuladores de seu programa de governo na área.
Em recente entrevista ao Estadão Armínio mostrou-se preocupado com a
atual situação fiscal do governo, falou em autonomia do Banco Central,
racionalização da atuação dos bancos públicos, privatização de
infra-estrutura, relacionou ganhos reais do salário mínimo a
“engessamento do mercado de trabalho” e criticou a atual política
externa brasileira, na visão dele distante “das grandes locomotivas
mundiais” e próxima de regimes autoritários e exóticos. Aécio não o
desmentiu.
Por falar nisso, em política
externa, Aécio se mostra francamente favorável a um alinhamento com USA e
União Européia, como bom tucano que é. Em postagem feita em sua página
oficial no Facebook, nesta 2ª feira, por ocasião de encontro com o
presidente da Comissão Européia, o conservador José Durão Barroso, Aécio
foi mais uma vez direto: “Reiterei minha convicção de que estamos
atrasados com a negociação com a União Europeia, que poderia estar
ampliando nossos mercados. Lamento o desinteresse do atual governo pelo
tema, adiando mais uma vez, agora para o próximo ano, a conclusão dessas
negociações. Enquanto isso, a União Europeia avança seus entendimentos
com outras regiões do mundo, em especial com os Estados Unidos. Em um
governo do PSDB, esse tema será tratado como prioridade.”
Embora franco, Aécio equivoca-se. O
Brasil precisa mesmo é aprofundar as relações com os BRICS, fortalecer
as relações Sul-Sul e liderar o processo de integração da América do
Sul, como tem feito. E pra isso nem é preciso abrir mão das relações com
europeus e norte-americanos, que continuam sendo cultivadas
normalmente. Num mundo multipolar como o deste século XXI, o alinhamento
automático e ideológico a uma ou outra potência não faz mais qualquer
sentido. Que o diga o México, que “casou-se” economicamente com os USA
através do NAFTA em 1994 e vinte anos depois convive com uma profunda
dependência do mercado norte-americano, o que acarreta ao país
fragilidade econômica e gravíssima crise social, com mais de 51% de seus
cidadãos vivendo abaixo da linha da pobreza, segundo dados oficiais.
Diferentemente de outros candidatos
do passado, que dissimulavam suas propostas, Aécio tem sido franco com o
eleitorado. Se vier a ganhar a eleição ninguém poderá argumentar que
tratou-se de estelionato eleitoral. O tucano está dizendo com todas as
letras qual o seu projeto de país. E nem é preciso tanto esforço assim
para entender.
*Wagner Iglecias é doutor em Sociologia e professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP.
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