Culpa por insinuação: Como funciona a propaganda dos EUA
Por Paul Craig Roberts
Por que os EUA não se uniram ao presidente Putin, da Rússia, que exigiu
investigação internacional objetiva, não politizada, feita por
especialistas, do caso do avião da Malaysian Airlines?
O governo russo continua a distribuir fatos, inclusive fotos de satélite
que mostram que havia Buks antiaéreos ucranianos em pontos dos quais o
avião de passageiros pode ter sido abatido por aquele tipo de veículo
armado, e documentos de que um jato de combate ucraniano SU-25
aproximou-se rapidamente do avião malaio antes de o avião ser abatido. O
chefe do Diretorado de Operações dos militares russos disse em
conferência de imprensa em Moscou ontem (21), que a presença do jato
militar ucraniano foi confirmada pelo centro de monitoramento de
Rostov.
O Ministério de Defesa da Rússia observou que, no momento em que o MH-17
foi abatido, um satélite dos EUA sobrevoava a área. O governo russo
exige que os EUA disponibilizem as fotos e dados capturados por aquele
satélite.
O presidente Putin já repetiu várias vezes que a investigação do voo
MH-17 requer “um grupo representativo de especialistas trabalhando
juntos sob orientação da ICAO ( International Civil Aviation
Organization ).” Putin, ao exigir investigação independente pelos
especialistas da ICAO não age como quem tenha algo a esconder.
Falando diretamente a Washington, Putin disse: “Até que se conheçam os
resultados dessa investigação, ninguém ( nem a “nação excepcional” ) tem
o direito de usar essa tragédia para fazer avançar seus objetivos
políticos egoístas estreitos.”
Putin relembrou aos EUA: “Nós várias vezes pedimos que os dois lados
suspendessem imediatamente o banho de sangue e sentassem à mesa de
negociações. O que se pode dizer com certeza é que, se as operações
militares não tivessem sido reiniciadas [por Kiev] no dia 28/6 no leste
da Ucrânia, essa tragédia não teria acontecido.”
E o que respondem os EUA?
Só mentiras e insinuações.
Acusações
Anteontem (20), o secretário de estado dos EUA, confirmou que
federalistas pró-Rússia estavam envolvidos na derrubada do avião malaio,
e disse que seria “bem claro” que a Rússia esta[ria] envolvida. Eis as
palavras de Kerry: “É bem claro que há um sistema que foi transferido da
Rússia para as mãos de separatistas. Sabemos com certeza, com certeza,
que os ucranianos não têm tal sistema em ponto algum nos arredores
daquele local naquela hora, portanto é óbvio que há um dedo muito claro
dos separatistas.”
A declaração de Kerry é mais uma da infindáveis mentiras que secretários
de Estado dos EUA mentiram ao longo do século 21. Quem poderia esquecer
o pacote de mentiras que Colin Powell mentiu descaradamente na ONU
sobre as “armas de destruição em massa” de Saddam Hussein? Ou a mentira
que Kerry repetiu incontáveis vezes, de que Assad “usou armas químicas
contra seu próprio povo”? Ou as infindáveis mentiras sobre “bombas
atômicas do Irã”?
Recordem que Kerry, várias vezes, disse que os EUA teriam provas de que
Assad ‘cruzara’ a “linha vermelha” e usara armas químicas. Mas Kerry
jamais conseguiu comprovar o que dizia, nunca apresentou uma única
prova, que fosse. Os EUA não tinham prova alguma a entregar ao
primeiro-ministro britânico, nem mesmo para ajudá-lo a conseguir que o
Parlamento aprovasse a participação britânica ao lado dos EUA, num
ataque militar contra a Síria! O Parlamento então disse ao
primeiro-ministro inglês: “sem provas, nada de guerra”.
Agora, aí está Kerry outra vez a declarar que tem “certeza”, em
‘declarações’ que já foram desmentidas por fotos do satélite russo e
incontáveis provas de testemunhas no solo.
Por que Washington não distribui as fotos do satélite norte-americano?
Mentiras
A resposta é: pela mesma razão pela qual Washington não distribuirá os
vídeos que confiscou e que, dizem os EUA, ‘comprovam’ que um avião de
passageiros sequestrado atingiu o Pentágono dia 11/9. Nenhum vídeo
comprova o que os EUA mentem sobre o 11/9; assim como nenhuma foto de
satélite comprova as mentiras de Kerry sobre o avião malaio.
Inspetores de armas da ONU em campo, no Iraque, relataram que o Iraque
não tinha armas de destruição em massa. Mas esse fato comprovado, porque
desmascararia a propaganda dos EUA, foi simplesmente ignorado. Os EUA
iniciaram guerra terrivelmente destrutiva, baseados numa mentira
intencional mentida em Washington.
Inspetores da Comissão Internacional de Energia Atômica em campo, no
Irã, e todas as 16 agências de inteligência dos EUA relataram que o Irã
não tinha ( como não tem ) programa de armas nucleares. Mas esse fato
comprovado era inconsistente com a agenda de guerra de Washington e foi
ignorado: pelo governo dos EUA e pela imprensa-empresa press-tituta.
Agora estamos testemunhando a mesma coisa, ante a ausência de qualquer
evidência que comprovasse que a Rússia teria algo a ver com a derrubada
do avião malaio.
Nem todos, no governo dos EUA, são tão irresponsáveis e imorais quanto
Kerry e John McCain. Esses mentem. A maioria dos agentes do governo dos
EUA vivem de insinuações.
A senadora Diane Feinstein é exemplo perfeito. Entrevistada pelo canal
CNN da imprensa-empresa press-tituta, Feinstein disse: “A questão é:
onde está Putin? Eu diria ‘Putin, seja homem. Você tem de falar ao
mundo. Tem de dizer. Se foi um erro, como espero que tenha sido, diga!”
Putin não faz outra coisa que não seja falar ao mundo, sem parar,
exigindo quese faça investigação por especialistas, não politizada. E
Feinstein a perguntar por que Putin se esconde em silêncio! Feinstein lá
estava para insinuar que ‘sabemos que você é culpado. Só não sabemos se
foi crime deliberado ou acidental.’
O modo como todo o ciclo ocidental de noticiário foi orquestrado para
instantaneamente culpar a Rússia, desde muito antes de que surja
qualquer informação real confiável, sugere que a derrubada do avião
malaio foi operação dos EUA.
É possível, é claro, que a bem adestrada imprensa-empresa press-tituta
não precise de orquestração alguma vinda de Washington, para
imediatamente culpar a Rússia. Por outro lado, alguns dos desempenhos
‘televisivos’ parecem tão bem ensaiados, que simplesmente têm de ter
sido preparados com antecedência.
Manipulação
Também foi preparado com antecedência o vídeo de Youtube montado para
‘mostrar’ um general russo e federalistas ucranianos discutindo que
teriam acabado de, por engano, derrubar um avião de passageiros.
Como já comentei, esse vídeo tem dois vícios insanáveis: já estava
gravado desde antes do acidente; e, ao apresentar o que seria a fala de
um militar russo, esqueceu que qualquer militar saberia ver as
diferenças entre um avião de passageiros e um avião militar de combate. A
própria existência daquele vídeo já implica que houve um complô para
derrubar o avião e culpar a Rússia.
Já vi relatórios que dizem que o sistema russo de mísseis antiaéreos,
como um de seus dispositivos de segurança, faz contato com os
transponders das aeronaves, para verificar o tipo de aeronave que
aparece em seu alvo. Se esses relatórios estão corretos e se os
transpondersdo MH-17 forem encontrados, é possível que lá esteja gravado
o contato.
Já
vi notícias que dizem que o controle aéreo ucraniano mudou a rota do
MH-17 e o mandou sobrevoar diretamente a área de conflito. Os
transponders também indicarão se isso é verdade. Se for, há claramente
uma prova, pelo menos circunstancial, de que foi ato intencional de Kiev
– e ato que teria de ter sido aprovado pelos EUA.
Há notícias ainda de que haveria uma divergência entre os militares
ucranianos e milícias não oficializadas formadas por extremistas
ucranianos de direita, que aparentemente foram os primeiros a atacar os
federalistas. É possível que Washington tenha usado aqueles extremistas
para derrubar o avião malaio, para inculpar os russos e usar as
acusações para pressionar a União Europeia a acompanhar as sanções
unilaterais dos EUA contra a Rússia. Sabe-se que os EUA estão
desesperados para conseguir quebrar os crescentes laços econômicos e
políticos entre Rússia e Europa.
Se havia um complô para derrubar um avião de passageiros, todos os
dispositivos de segurança do sistema de mísseis teriam sido desligados,
para que não abortassem o ataque e para que não houvesse registro de
ataque, não acidental, mas deliberado. Essa pode ser a razão pela qual
os ucranianos mandaram um jato para ‘inspecionar’ de perto o avião
malaio. É possível que o alvo fosse o avião presidencial de Putin, e a
incompetência dos criminosos os tenha levado a destruir um avião de
passageiros.
Há inúmeras explicações possíveis. É importante, agora, manter a mente
aberta e resistir contra a propaganda dos EUA, até que apareçam os fatos
e as provas. No mínimo, os EUA são culpados por usar o incidente para
inculpar os russos ‘antecipadamente’, antes de qualquer prova.
Washington
Até agora, Washington só distribuiu acusações gratuitas e insinuações. E
se Washington continuar a só distribuir acusações e insinuações sem
provas... logo se saberá com certeza de quem é a culpa.
Enquanto isso, lembrem do menino que gritou “lobo!”, sem haver lobo
algum, muitas vezes. Tantas vezes mentiu que, quando o lobo afinal
realmente apareceu, ninguém acreditou nos gritos do menino. Será esse o
destino final de Washington?
Nas guerras que declarou ao Iraque, ao Afeganistão, à Líbia, à Somália e
à Síria, os EUA sempre se esconderam atrás de mentiras. Por quê? Se
Washington quer guerra contra o Irã, a Rússia e a China, por que não
declara guerra?
A razão é que a Constituição dos EUA exige que, para que haja guerra, o
Congresso emita uma Declaração de Guerra. Com esse dispositivo, se
esperava que o Congresso conseguisse impedir que o Executivo fizesse as
guerras que quisesse, para promover as agendas ocultas que bem
entendesse. Agora, quando já abdicou dessa responsabilidade
constitucional, o Congresso dos EUA já é cúmplice nos crimes de guerra
do Executivo.
E ao aprovar o assassinato premeditado de palestinos por Israel, o
governo dos EUA já é cúmplice também nos crimes de guerra de Israel.
Agora, se pergunte a você mesmo e responda: o mundo não seria mais
seguro, lugar de menos mortes, menos destruição e menos refugiados sem
teto, e não seria lugar de mais verdade e mais justiça, se os EUA e
Israel não existissem?
Paul Craig Roberts é um economista norte-americano e colunista do
Creators Syndicate. Serviu como secretário-assistente do Tesouro na
administração Reagan e foi destacado como um co-fundadorda Reaganomics.
Ex-editor e colunista do Wall Street Journal, Business Week e Scripps
Howard News Service.
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