HÉLMITON PRATEADO e DAIANA PETROF – A Organização Não Governamental britânica Oxfan tem um estudo que causa impacto e preocupação pela dimensão da gravidade: a concentração da riqueza no mundo chegará em 2016 à absurda margem de que apenas 1% da população mundial terá em suas mãos a metade da riqueza disponível e corrente no planeta. O relatório tem por base outra investigação científica divulgada pelo conglomerado Credit Suisse, que aponta a mesma concentração de renda nas mãos de poucos e a disseminação da fome em grandezas universais. Em 2014, a concentração é levemente inferior ao que será: 37% das riquezas estão nas mãos desse 1% da população.
O que foi tratado no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, em janeiro desse ano, corrobora essa preocupação dos líderes mundiais e pacifica a certeza de que a cada ano os ricos ficam cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres. A certeza que os estudiosos da ONG Oxfan e do Credit Suisse têm é que em 2016 as 37 milhões de indivíduos, que compõem o 1% das pessoas mais ricas do mundo, concentrarão mais dinheiro do que os 99% do resto de habitantes do planeta.
A riqueza corrente no Planeta em 2013, base do estudo, estimada em 241 trilhões de dólares – 777 trilhões de reais na cotação atual (R$ 3,226) – impressiona pela grandeza e causa maior impacto pela disparidade quando comparados com os indicadores de pobreza, miséria e fome que grassam em todos os cantos da Terra. A mesma estimativa divulgada no estudo da ONG aponta que o número de pessoas que sobrevivem na extrema pobreza, ou abaixo da linha da pobreza, ou mesmo que estão em situação de fome é também impressionante: 1 bilhão de pessoas.
A distância entre os que têm tanto e os que nada possuem aumenta a cada ano, apontam os estudiosos, e poderá ser a causa de acentuados processos de instabilidade social. Guerras civis, conflitos étnicos, confrontos entre nações são resultado das desigualdades e gênese de problemas adicionais.
Reportagem da BBC Brasil reafirmou todos os indicativos de disparidades sociais geradas pela concentração de renda:
Análise do Credit Suisse
Imagine viver em um país no qual uma pessoa que tem bens líquidos acima de 8,6 mil reais é mais rico que metade da população. Essa é a situação existente hoje, se o mundo for tratado como uma unidade. A informação consta do relatório sobre a riqueza mundial produzido pelo instituto de pesquisas do banco Credit Suisse e divulgado na semana passada. Trata-se de mais uma mostra da profundidade da desigualdade no planeta, onde 1% da população mundial detém 46% da riqueza, enquanto 50% dos seres humanos adultos ficam com 1% da riqueza.
As estimativas do Credit Suisse indicam que a riqueza global chegou a 241 trilhões de dólares em 2013, montante 4,9% acima do registrado em 2012. O país com mais riqueza, por adulto, é a Suíça, com uma média de 500 mil dólares, seguida por Austrália (403 mil dólares), Noruega (380 mil dólares) e Luxemburgo (315 mil dólares). No mundo todo, o valor médio de riqueza por adulto é de 51,6 mil dólares.
Na vida real, a renda da maioria está bem distante desses valores. Para ser considerado um integrante da metade de cima da pirâmide social mundial, uma pessoa precisa ter bens líquidos (e descontadas as dívidas) avaliados em 4 mil dólares, o equivalente aos 8,6 mil reais. Para adentrar os 10% mais ricos, é necessário ter bens da ordem de 75 mil dólares, ou 162 mil reais. A barreira do 1% é marcada por bens líquidos depois do pagamento de dívidas em valor superior a 753 mil dólares, ou 1,6 milhão de reais.
O relatório do Credit Suisse (em PDF, em inglês) traz uma pirâmide social do mundo mais elaborada, que serve para mostrar discrepâncias ainda maiores. Na base da pirâmide estão 3,2 bilhões de adultos (68,7% do total) que dividem entre si 3% da riqueza mundial (7,3 trilhões de dólares). No topo da pirâmide estão 32 milhões de pessoas (0,7% do total), cujos bens líquidos somam 98,7 trilhões de dólares, ou 41% do total.
Entre o topo e a base estão dois estratos. No segundo, está 7,7% da população mundial que fica com 42,3% da riqueza. No terceiro, 22,9% da população, com 13,7% da riqueza.
De acordo com o estudo, as pessoas da base da pirâmide são de quase todas as regiões do mundo, mas a Índia e o continente africano têm representações desproporcionalmente altas, ao contrário da Europa e da América do Norte. Nos países desenvolvidos, 30% da população faz parte da base, mas este é um “fenômeno cíclico”, associado com a juventude, a velhice ou períodos de desemprego. Na Índia e na África, 90% da população adulta está na base da pirâmide, sendo que em alguns países africanos quase toda a população integra a parte de baixo da pirâmide social do mundo.
Oportunidades iguais?
O relatório lembra que a pirâmide social se altera muito pouco com o passar do tempo. Na versão 2012 do documento (em inglês), o topo da pirâmide era formado por 0,6% da população, que detinha 39,3% da riqueza mundial, enquanto na base estavam 69,3% dos adultos, com 3,3% da riqueza. Há, entretanto, afirma o Credit Suisse, mobilidade significativa entre os estratos da pirâmide. Esta é mais frequente e de maior magnitude quando a oportunidade é mais igualitária entre as diversas pessoas.
A igualdade de oportunidade, entretanto, tem sido abalada nos últimos anos nos países desenvolvidos, em especial na Europa, o melhor, ainda que imperfeito, modelo de igualitarismo existente. Na semana passada, relatório divulgado pela Federação Internacional da Cruz Vermelha mostrou que as medidas de austeridade aplicadas para conter a crise mundial está afetando as pessoas que já eram mais vulneráveis. De acordo com a entidade, os pobres estão ficando mais pobres, há mais gente cuja renda está abaixo da linha da pobreza e a desigualdade está aumentando. Segundo a Cruz Vermelha, as “consequências a longo prazo” da crise ainda estão por vir, uma vez que a questão do desemprego na Europa é uma “bomba-relógio”.
No Brasil, a desigualdade social tem sido reduzida, por conta de programas sociais como o Bolsa Família e do consistente aumento do salário mínimo, mas a disparidade entre as oportunidades oferecidas ainda é monstruosa. No trecho em que trata do Brasil, intitulado “gigante adormecido”, o estudo do Credit Suisse aborda a imensa desigualdade no país, lembrando que há 221 mil milionários no Brasil e que 315 mil brasileiros estão no 1% mais rico do mundo. O alto nível de desigualdade, afirma o banco, reflete a alta dispersão de renda, que por sua vez está relacionada “à educação muito desigual na população e à separação entre os setores formal e informal da economia”.
De um lado, a mais abjeta miséria...
De um lado, a mais abjeta miséria…

Brasil tem 8ª maior desigualdade do mundo, diz ONU
O Brasil tem a oitava maior desigualdade social do mundo entre 128 países que tiveram essa variável avaliada pelo Relatório de Desenvolvimento Humano da ONU, divulgado mundialmente ontem. A desigualdade social é apontada pelo relatório, preparado pelo Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (Pnud), como principal entrave ao crescimento econômico, além de ser “injusto”, “economicamente dispendioso” e “socialmente desestabilizador”.
Segundo o relatório, o Brasil está em 63º lugar entre 177 países no ranking de qualidade de vida, medido pelo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).
O IDH é um índice calculado com base em variáveis como a expectativa de vida, a renda per capita, dados de saúde pública e de educação. Numa escala entre 0 (menos desenvolvido) e 1 (mais desenvolvido), o índice do Brasil ficou em 0,792. O primeiro país da lista é a Noruega, com 0,963, e o 177º e último é o Níger, com 0,281.
Os dados considerados no relatório são de 2003, primeiro ano do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
No relatório do ano passado, que considerava os dados de 2002, o Brasil aparecia na 72ª posição, com um IDH de 0,775.
Desenvolvimento X desigualdade
Apesar de ter um IDH próximo ao que o Pnud estabelece como o mínimo para considerar o país como desenvolvido (0,800), o Brasil é apontado pelo relatório como um dos países mais desiguais do mundo.
O coeficiente Gini – indicador que mede a concentração de renda de um país e indica desigualdade maior à medida que se aproxima de 100 – do Brasil, de 59,3, é mais baixo apenas do que o de seis países da África e o da Guatemala. O país mais desigual do mundo, segundo o relatório, é a Namíbia, com um coeficiente Gini de 70,7. Os países menos desiguais são a Dinamarca, com um coeficiente Gini de 24,7, e o Japão, com 24,9.
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Objetivos do milênio
O Relatório de Desenvolvimento Humano aponta que apesar de apenas 18 dos 177 países analisados terem apresentado uma regressão no IDH desde os anos 1990, o ritmo de desenvolvimento mundial está aquém das metas estabelecidas em 2000 pela Cúpula do Milênio da ONU.
Os chamados Objetivos do Milênio, estabelecidos na cúpula, incluem cortar pela metade o número de pessoas vivendo abaixo da linha de pobreza, reduzir a mortalidade infantil em dois terços e atingir a universalização da educação até 2015. Para possibilitar o cumprimento dos Objetivos do Milênio, o Pnud pede mudanças “dramáticas” na ajuda financeira global, nas regras de comércio internacional e nas políticas de segurança.
“Os Objetivos do Milênio eram uma nota promissória, escrita por 189 governos aos pobres de todo o mundo. Essa nota vence em menos de dez anos, e sem os necessários investimento e vontade política, vai voltar com o carimbo ‘fundos insuficientes”, afirma Kevin Watkins, principal autor do relatório.
Entre os problemas apontados pelo relatório está o fato de 50 países (quase metade deles na África), com uma população total de quase 900 milhões de pessoas, terem regredido em pelo menos uma das metas do milênio.
Além disso, outros 65 países, com uma população total de 1,2 bilhão, não conseguirão atingir todas as metas antes de 2040 se continuarem com o atual ritmo de melhora no desenvolvimento humano.
http://www.dm.com.br/economia/2015/07/concentracao-de-riquezas-vai-aumentar.html
 
 
 
 
 
 
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