JOÃO PEDRO STÉDILE Tem veneno no tomate, no abacaxi e até na pinga
BDF acaba de publicar uma entrevista com João Pedro Stedile. O
Agronegócio, a Reforma Agraria e o Plano de Desenvolvimento são tratados
minuciosamente seja do ponto de vista cientifico como social. São raras
as ocasiões para se ter conhecimento tão profundo e exaustivo sobre um
tema que não para de envenenar a vida do povo... "global". A matéria é
um pouco cumprida, mas tomem um tempinho, vale a pena.
Cesare Battisti
Segue a entrevista:
JOÃO PEDRO STÉDILE
Tem veneno no tomate, no abacaxi e até na pinga
Para líder do MST, o país precisa fazer um trabalho civilizatório de alerta à população sobre os perigos à saúde causados pelo agronegócio. 'Estão tendo lucro a peso de vidas humanas'
por Paulo Donizetti de Souza publicado 09/03/2015 11:55, última modificação 05/05/2015 16:06
GERARDO LAZZARI/RBA
Tem veneno no tomate, no abacaxi e até na pinga
Para líder do MST, o país precisa fazer um trabalho civilizatório de alerta à população sobre os perigos à saúde causados pelo agronegócio. 'Estão tendo lucro a peso de vidas humanas'
por Paulo Donizetti de Souza publicado 09/03/2015 11:55, última modificação 05/05/2015 16:06
GERARDO LAZZARI/RBA
"Agricultura familiar produz 297 alimentos. Agronegócio é soja, milho, algodão, eucalipto e cana, e se diz salvador da pátria"
Nos 30 anos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, um de seus
coordenadores nacionais, o economista João Pedro Stédile, não vê mais
como prosperar, no Brasil, a luta pela reforma agrária tal como
conhecida nos primórdios do MST. Ele observa que no senso comum das
pessoas trata-se de repartir o latifúndio e entregar para os sem-terra.
"E é isso mesmo, na essência, romper com a grande propriedade. Porém, os
projetos de reforma agrária, feitos pelo governo com os instrumentos do
Estado, só se viabilizaram, no passado, porque eram política combinada
com um projeto de desenvolvimento nacional que objetivava desenvolver a
indústria para o mercado interno", diz.
O movimento, no entanto, avalia que a questão agrária não pode se
resumir ao objetivo de proporcionar trabalho para segurar as pessoas no
campo. "A reforma agrária não é apenas resolver um problema de trabalho.
Tem de ser para resolver o problema do veneno, da alimentação sadia. De
garantir um futuro, de fazer uma agricultura que respeite o meio
ambiente, que respeite a biodiversidade", explica. Enfim, tem de ser
base de um novo modelo de desenvolvimento, que una na mesma planilha
progresso industrial e sustentabilidade.
Stédile critica a permissividade com que se prolifera no Brasil o uso de
agrotóxicos já proibidos em outras partes do mundo por sua
agressividade ao ambiente e à saúde. Cita pesquisas que associam o
veneno agrícola ao crescimento da incidência de doenças como câncer de
próstata, de mama, mal de Parkinson e a problemas de infertilidade.
Alerta que, no cigarro, a má fama fica com a nicotina, "que só vicia - o
que mata são os produtos químicos usados, sobretudo, no cultivo do
fumo". E que a produção em larga escala de cana-de-açúcar levando o
veneno também para a aguardente: "Pode largar mão de tomar pinga. No
Brasil se bebe cachaça há 400 anos, mas antigamente não tinha veneno, e
agora tem".
Stédile vê o cenário político-institucional brasileiro dominado pelo
poder econômico. Para ele a burguesia industrial perdeu a oportunidade
de fazer um pacto de desenvolvimento porque prefere colocar dinheiro na
especulação financeira. "Por isso foram contra a CPMF. Porque o dinheiro
deles está no banco, não na fábrica e na produção." Diante da hegemonia
do agronegócio no Legislativo e no Judiciário, e de um governo dividido
pela composição de classes em seu ministério, não está otimista:
"Estamos ferrados". Ele, aposta, porém que "a médio prazo" haverá uma
nova ascensão dos movimentos de massa, como foi de 1976 a 1989,
empurrada pelo agravamento das contradições da política e do capitalismo
brasileiro.
A quantas anda o potencial agressivo dos alimentos que a população consome?
O modelo do agronegócio é apenas um modelo de se ganhar dinheiro. Se o
único objetivo é ter lucro, não importa se vão destruir a natureza, se
vão usar venenos, se desempregam pessoas. Nos últimos dez anos, apesar
de termos um governo progressista, o agronegócio expulsou em torno de 4
milhões de trabalhadores assalariados. O trabalho humano foi substituído
por máquinas e pelo veneno. O uso do veneno, por esse modelo, não é uma
necessidade agronômica. Para se produzir não precisa veneno, que é
usado como uma forma de substituir a mão de obra que antes fazia as
práticas agrícolas com tempo de trabalho, por exemplo a capina, um
plantio mais cuidadoso. Agora, é máquina e veneno. Primeiro, para
substituir a mão de obra. Segundo, como são monoculturas em larga
extensão - ou só soja, ou só laranja, ou só algodão, ou só pasto - têm
de matar, na lógica deles, todas as outras formas de vida vegetal ou
animal. Não praticam uma agricultura. Querem produzir uma commodity. O
veneno é a forma de matarem tudo que não é soja, que não é laranja, tudo
que não é algodão.
E o veneno, em si, também é um negócio.
GERARDO LAZZARI / RBA
O economista João Pedro Stédile
Há uma aliança de interesses. A Monsanto, por exemplo, fornece fertilizantes, veneno, e compra soja. A mesma coisa a Cutrale com a laranja. A mesma empresa ganha dinheiro com veneno e controlando o mercado, que tem origem nas fórmulas desenvolvidas pela Bayer, pela Basf, pela Du Pont, para os negócios das guerras. Na Primeira e na Segunda Guerra Mundial usaram muito. Depois, na Guerra do Vietnã. Quando terminaram as guerras, as fábricas de veneno pra matar gente e floresta em larga escala foram adequadas para a agricultura.
Há uma aliança de interesses. A Monsanto, por exemplo, fornece fertilizantes, veneno, e compra soja. A mesma coisa a Cutrale com a laranja. A mesma empresa ganha dinheiro com veneno e controlando o mercado, que tem origem nas fórmulas desenvolvidas pela Bayer, pela Basf, pela Du Pont, para os negócios das guerras. Na Primeira e na Segunda Guerra Mundial usaram muito. Depois, na Guerra do Vietnã. Quando terminaram as guerras, as fábricas de veneno pra matar gente e floresta em larga escala foram adequadas para a agricultura.
Agora não é mais em larga escala?
São as mesmas empresas. É os efeitos são de extrema gravidade. Um
punhado assim de terra (junta as mãos em concha), tem mais de mil formas
de vida. São aqueles bichinhos invisíveis, bactérias, que formam os
nutrientes, senão a terra não produz nada. O veneno mata essas formas de
vida. E contamina a água. Todas as grandes cidades do Brasil já têm
água contaminada com mais de 20 princípios ativos de venenos agrícolas,
inclusive em São Paulo. Essa água que a Sabesp nos fornece, que
aparentemente é boa, mesmo sendo considerada potável, tem mais de 20
contaminações que a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária)
ainda considera tolerável porque está dispersa. Só que se tomar essa
água todos os dias, aquele veneno, que é químico e não conseguimos ver,
vai se acumulando no organismo e também nos alimentos. Está em doses
mínimas, não vai matar na hora, mas vai se acumulando no organismo.
Como o consumidor de alimentos e dessa água pode imaginar alguma
gravidade se ele, como diz o samba, "bebe sim, come sim, e está
vivendo..."? Não seria um alarmismo falar que essa água e esse alimento
são envenenados?
É uma necessidade da população saber o que tem naquele alimento. Em
relação à água, que é mais problemático, os graus de contaminação, no
Brasil, estão acima de qualquer país da Europa. Temos uma campanha
nacional contra o uso do agrotóxico, da qual participam, inclusive,
técnicos da Anvisa, para pressionar o governo a mudar a legislação e
baixar os índices de toxidade a limites como os da Europa. E nos
alimentos, a única coisa que a Anvisa faz é avisar. Fazem uma pesquisa a
cada seis meses nos supermercados, só têm dois laboratórios no país que
fazem, quando deveria haver um por cidade, e te avisam. Nós já estamos
cansados de saber. Mas vamos avisar os leitores: os produtos que têm
mais agrotóxico são o tomate, o pimentão, o morango e a maçã.
Ultrapassam o tolerável. Se você está acostumado a, toda semana, comer
maçã, é claro que você vai acumular mais veneno do que quem come banana.
Se você está acostumado a sempre fazer a comida com pimentão, está
frito, porque o pimentão vai transferir para o seu organismo um índice
maior de veneno.
Mas se as pessoas não sentem os efeitos do veneno...
Aí vem a maior gravidade: os cientistas e médicos que trabalham no
Instituto Nacional do Câncer (Inca) têm feito várias pesquisas e
alertado que o veneno, quando se acumula no organismo, começa a atacar
as células mais frágeis. É por isso que tem aumentado a incidência de
alguns tipos câncer, que não têm mais relação com a idade das pessoas.
Você pode ter câncer de próstata com 40 anos. Tem mulheres com 20, 30
anos, com câncer de mama. Por quê? Veneno. O professor Wanderlei
Pignatti, da Universidade Federal do Mato Grosso, pesquisou durante dez
anos mulheres de uma região do estado e encontrou resíduos de glifosato
no leite materno. As mães que achavam que estavam dando o melhor
alimento do mundo não sabiam que através do alimento que comiam
concentravam também o veneno absorvido no leite; e as crianças, ainda
bebês, estavam recebendo suas primeiras doses.
Esse mesmo professor fez outra pesquisa também muito interessante. Há um
secante que é passado na soja, para uniformizar seu amadurecimento,
porque na natureza não amadurece tudo ao mesmo tempo. Como querem usar a
máquina, então têm de entrar quando todas estiverem maduras. Passam
então um veneno, a base de glifosato, o chamado secante, que na verdade
"mata" toda a soja. Aí vem a máquina e toda a soja está seca. Ao matar a
soja, aquele veneno não é mais absorvido pelo grão. Vai para a
natureza. Sobe como pó e, conforme o vento, vai para qualquer parte.
Açude, horta, serra, qualquer lugar. Porém, esse professor fez uma
pesquisa da maior gravidade, no Mato Grosso, onde chove muito: o veneno
voltava com a chuva. De novo, a ação humana. Como no Mato Grosso chove
por seis meses, no período de chuva guardam água nas cacimbas, nas
cisternas. Aquela água da chuva já vinha com altas doses de glifosato.
Na Europa e algumas no Brasil, estão fazendo correlações de incidência
do glifosato não só com câncer, mas com outras enfermidades.
Por exemplo?
Há pesquisas científicas na Europa comprovando que pessoas que comem
alimentos com índices exagerados de glifosato, que é o veneno mais
disseminado, já apresentam baixa fertilidade. Os casais começam a não
ter filhos e aí um a põe a culpa no outro, quando na verdade a culpa é
do veneno. Também foram feitas pesquisas nos Estados Unidos em regiões
onde o mal de Parkinson era mais incidente, e a relação que foi
encontrada foi justamente essa. As pessoas tinham se contaminado, com os
alimentos ou expostas ao veneno usado na agricultura, e desenvolveram
maior propensão ao Parkinson.
Ainda assim, o uso dos agrotóxicos não incomoda as pessoas.
Essa questão me provoca, pois nós, como movimento social e como esquerda
em geral, temos de fazer um trabalho civilizatório em alertar a
população: é um verdadeiro crime o que está acontecendo por conta do
agronegócio. Eles estão tendo lucro a peso de vidas humanas. O Inca
advertiu que, a cada ano, surgem 500 mil novos casos de câncer, no
Brasil. Grande parte deles vem do uso de venenos agrícolas. Mesmo as
duas causas aparentes maiores, o tabaco e o álcool, no caso brasileiro:
por que que tem uma incidência maior de câncer no tabaco? Porque para se
produzir o tabaco, no Brasil, vão 30 tratamentos de veneno por ano.
Aquele veneno vai para a folha e, depois, você aspira, da pior forma,
vaporizado. É um veneno que vai direto para a sua garganta e o seu
pulmão. Por isso que tem tanto câncer. A fama ruim do cigarro é a
nicotina, mas a nicotina não causa câncer. Ela vicia. O veneno está no
tabaco. A mesma coisa vale para a cachaça.
Mesmo na região de Salinas, por exemplo?
Sobre Salinas vou absolvê-la, porque conheço a região do norte de Minas
e, de fato, a cana-de-açúcar dali, além de estar num microclima e compor
uma variedade que só dá lá, produz uma cachaça muito gostosa, lá não
usam veneno, pois são tudo pequenas propriedades. Já em São Paulo, toda a
cana-de-açúcar é cultivada com altas doses de veneno. Você, que é peão e
está acostumado, pode largar mão de tomar cachaça. A cana tem veneno,
vai para o alambique, a destilaria, quando se retira o mosto fica a
essência, transformada em álcool, junto com o veneno. Ao se tomar a
pinga com frequência vai absorvendo. Por isso que tem aparecido câncer
entre os alcoólatras. Não é a cachaça o mal pior. Toma-se cachaça há 400
anos no Brasil e antigamente não tinha veneno, agora tem.
As organizações do movimento social rural, como MST, Via Campesina, têm
conseguido ampliar a cultura do orgânico nos assentamentos? Existe um
projeto para fazer com que cresça uma agroindústria baseada em produtos
agrícolas familiares saudáveis?
Acho que é uma longa caminhada que envolve muitos fatores, por isso não é
fácil mudar do dia para a noite. Até oito anos atrás, ou até o Lula
ganhar as eleições, não havia nenhuma faculdade que ensinasse
agroecologia, o agrônomo não sabia como produzir com outras técnicas, na
faculdade só se falava em adubo químico e veneno. De oito anos para cá
já estamos tendo cursos de agronomia baseados na agroecologia. Olha que
demorado. Tem de formar os agrônomos, para que comecem a dar aulas para
outros agrônomos e multiplicar o conhecimento, que é universal, das
técnicas de agroecologia. Tivemos a sorte de ter aqui no Brasil a maior
cientista da agroecologia de solos, que é a professora Ana Maria
Primavesi, que tem 92 anos e produziu o conhecimento científico que
embasa isso. Estudou profundamente a natureza do solo. Depois, tivemos
de levar esse conhecimento para os agricultores e provar para eles que
era possível produzir sem veneno. O terceiro campo é convencer o
governo, que também é ignorante. Reflete a sociedade. Pela primeira vez,
no ano passado - e teve de ser em nível da Secretaria-Geral da
Presidência, porque nem o ministério da Agricultura nem o do
Desenvolvimento Agrário quiseram se envolver - criamos o primeiro plano
nacional de agroecologia, para fomentar o conhecimento.
Com a Embrapa, dá para contar?
Na Embrapa, eles foram muito espertos. Porém, tem duas ou três unidades
da Embrapa onde se concentram os agrônomos de maior consciência, que
centram as pesquisas em agroecologia. Mas de todas as pesquisas que
estão fazendo na Embrapa, 80% interessa ao agronegócio e 20% à
agricultura familiar. Esse é o quadro da Embrapa, e reflete um pouco na
sociedade. Nosso esforço de anos recentes é fazer com que o governo
tenha um olhar mais atencioso para a merenda escolar.
As compras públicas seriam um canal para estimular essa produção?
Exatamente. Agora, conseguimos estabelecer em lei que 30%, no mínimo, de
toda a merenda escolar, no Brasil, que é financiado pelo Programa
Nacional de Alimentação Escolar, do Ministério da Educação, e vai para
as prefeituras, venha da agricultura familiar.
Só 30%? Ainda sobra muito espaço para o Toddynho e o salgadinho...
Ainda sobra muito. Mas também estamos produzindo o Terrinha, que é
concorrente do Toddynho, com leite e chocolate sem veneno. Então, é um
esforço muito grande... Aqui mesmo, na prefeitura de São Paulo, até a
entrada do Fernando Haddad, o anterior se fazia de sonso: "Como não tem
agricultura familiar na cidade de São Paulo, não sou obrigado a
comprar". Mas a lei não diz que tem de ser do município. Diz que é da
agricultura familiar. Agora, com vontade política da prefeitura, as mais
de 3 mil escolas respeitam a lei e no mínimo 30% da merenda sai da
agricultura familiar. Outro movimento que estamos fazendo, em todo o
Brasil: há uma proliferação de feiras agroecológicas. Todas as cidades
do Brasil já têm. Algumas de maneira permanente, como a feira da Água
Branca (São Paulo), em outras cidades fazemos em temporadas.
E fora dos grandes centros, como está o escoamento?
No Nordeste tem muitas feiras agroecológicas. O trabalho que estamos
fazendo é hercúleo, mas necessário e, sobretudo, humanista. Ao produzir
alimentos saudáveis, estamos salvando uma parte do povo brasileiro. No
fim de semana de carnaval fui à Paraíba, por conta das celebrações do
aniversário da Elizabete Teixeira, uma das grandes lideranças ainda viva
das Ligas Camponesas, que fez 90 anos. Era também a comemoração dos 100
anos que faria o Francisco Julião, se estivesse vivo, e de 60 anos das
Ligas. Aproveitei e andei na região de Campina Grande, visitando
agricultores e experiências de agroecologia. Um agrônomo do sindicato
local me disse: "Olha, há 15 anos Campina Grande e arredores tinham o
maior índice de câncer da Paraíba". De 15 anos para cá, com a assessoria
da AS-PTA (Assessoria e Serviços a Projetos de Agricultura Alternativa,
programa da ONG Fase), eles treinaram agricultores e hoje, nos 20
municípios da região de Campina Grande não se usa mais veneno, porque lá
é uma base só de agricultura familiar. Praticamente eliminaram o
veneno. Disseram que não têm estatísticas, mas que praticamente
desapareceu o câncer no meio rural, pelo que se registra nos hospitais.
Isso é uma vitória fantástica. Começou salvando a vida dos agricultores,
que é o primeiro a ser atingido pelo veneno, depois o consumidor, que
não vai mais receber as doses diárias de veneno e só se dava conta no
hospital.
Há uma perspectiva otimista de que a agricultura familiar possa crescer e
disputar com o agronegócio um espaço maior, sobretudo nessas regiões em
que o crescimento está se dando de maneira descentralizada?
Não tenho dúvida nenhuma. O chamado mercado dos produtos saudáveis,
orgânicos ou agroecológicos cresce em torno de 10%, ao ano. Por outro
lado, a população se dá conta de que não é mais caro de se produzir na
forma da agroecologia. Como é que ela está se dando conta? Porque estão
surgindo mais feiras, então o preço é melhor, e isso está quebrando o
monopólio dos supermercados. O que o Pão de Açúcar fazia, e ainda faz?
Compra o produto orgânico dos pequenos agricultores, inclusive
organizando centrais, onde o pequeno agricultor entrega e eles só lavam e
colocam naquelas caixinhas padronizadas; porém, como sabe que o produto
orgânico chega numa pessoa que tem mais consciência, classe média,
aumenta o preço, para ter lucro máximo, em cima da disposição da classe
média de pagar um pouco mais por um produto que tem o selo de garantia.
Essa máscara está caindo, porque mais produtos estão chegando ao
mercado, às feiras, e as pessoas começam a comparar: por que um quilo de
tomate orgânico no Pão de Açúcar custa R$ 14 e na feirinha da Água
Branca custa R$ 7?
As pessoas consomem orgânicos por consciência, ou estaria virando "grife"?
É perceptível em todas as regiões que aumentou a consciência da
população, tanto pelos casos de saúde na família quanto pelo aumento da
informação. Há muita informação que agora circula pela internet e que há
dez anos não se tinha. O próximo passo é nós, como movimento social,
nessa campanha contra os agrotóxicos, começarmos a buscar barreiras
legais ao uso do veneno, coisa que a Europa já vem fazendo. Em toda a
Europa é proibido usar pulverização aérea. Aqui é um festival, 60% dos
venenos são passados com avião. Dois anos atrás, chegaram a "bombardear"
uma escola, enquanto as crianças brincavam no pátio. Foram
hospitalizadas mais de 200, porque aspiraram imediatamente. Foi em Rio
Verde, Goiás. Um crime. A pulverização aérea nós temos que proibir,
porque ela fica no espaço, no ar, no alimento, na água e mata tudo o
quanto é ser vivo que existir. Toda a Europa já proibiu.
Essa proibição, enquanto não acontece por lei federal, não poderia ir sendo alcançada por leis municipais ou estaduais?
Nós tivemos alguns municípios que proibiram, como São Gabriel da Palha,
no Espírito Santo. Havia uma grande propriedade de café, e o dono
pulverizava veneno e todos os pequenos agricultores da região sofriam as
consequências. Os pequenos fizeram um movimento, motivaram a Câmara, e
proibiram. Nós estamos numa campanha cujo lema é "Banimento dos venenos
que já foram banidos em outros países". Porque determinados países
proíbem o veneno e o que eles fazem? Trazem para cá. Se um país da
Europa proibiu, é porque eles tiveram mais consciência e mais pesquisa
para dizer que o veneno é mesmo perigoso. Há uma lista de mais de 20
desses venenos que ainda circulam no Brasil. O glifosato, princípio
químico da maior parte dos venenos que se aplicam no Brasil, feito por
uma fábrica da Monsanto no polo petroquímico de Camaçari (BA), já foi
proibido na Holanda e na Bélgica.
Outra medida que é urgente: tributação. Sobre a água da Sabesp incide
imposto, está lá na conta; ou se você comprar da Coca-Cola, ou da
Nestlé, paga 17% de IPI. O leite paga imposto, o café paga imposto. Tudo
paga. Ou IPI, ou ICMS, ou os dois. Mas os venenos estão isentos de
impostos, no Brasil. Qual é a lei que determinou a isenção do ICMS para
veneno agrícola? Nós fomos procurar saber. Na época do Fernando
Henrique, década de 1990, fizeram uma reunião de secretários estaduais
da Fazenda e, como tinham hegemonia nos estados, junto com o secretário
do Tesouro, fizeram uma ata renunciando à cobrança de ICMS sobre o
veneno. Mais influência das multinacionais do que isso? Tem que ir lá,
de estado em estado, dizer que essa lei é fajuta. Ninguém aprovou. Esses
secretários não tinham mandato para isso. É preciso que as assembleias
legislativas tomem para si essa responsabilidade e voltem a cobrar o
ICMS dos venenos, para que pelo menos a sociedade recupere um pouco dos
recursos para gastar com saúde, já que as fábricas têm um lucro
fantástico.
Como acontece com tabaco e bebidas?
Quem sabe, no futuro, consigamos o que na indústria tabagista já se
conseguiu em outros países. Se se comprovar que a causa do câncer do
cidadão foi o veneno agrícola, quem tem que pagar o tratamento é a
Bayer, a Basf, a Monsanto, quem fez o veneno. Assim como nos Estados
Unidos já fazem em relação ao tabaco. Se você comprovar que o teu câncer
é por causa do tabaco, a empresa que fabricou o tabaco vai ter que
pagar o seu tratamento, e não a sociedade. Mas isso seria um sonho.
Espero, também, nessa mesma política, que as prefeituras nos ajudem a
produzir material para esclarecer as crianças e os professores dos
perigos disso, para começarmos lá na base e elas mesmas, as crianças,
recusarem. Por exemplo, quando ela compra uma batata frita, ela
perguntou quanto veneno tem na batata? E ela começa a comer batata frita
no recreio.
Na cantina ela compra batata frita, refrigerante, suco de caixinha, coxinha...
Tudo o que há de pior. Por exemplo, o abacaxi é uma das frutas que mais
utiliza veneno, depois que começou a ser produzido em escala pelo
agronegócio em grande propriedade. Quando era o pequeno agricultor, ele
tinha meio hectare de abacaxi, porque dá muito trabalho, então ele
cuidava de meio hectare. E, na medida em que ia amadurecendo, colhia.
Agora não. Eles amadurecem na marra, com veneno. Vão colocando já na
flor do abacaxi. O veneno cai em conta-gotas, para amadurecer tudo
igual. Quando se vai comer um abacaxi, já vem a dose de veneno, que vai
para o suco, e assim por diante. Além do que a maioria desses sucos de
caixinha, para ele sobreviver dentro da caixinha, vai conservante.
Conservante também é um veneno, porque é para matar os fungos e as
bactérias. O que nós, como movimento da agricultura familiar e da
agroecologia, dizemos: tem de se abandonar as embalagens de plástico e
voltar para o vidro. E cadê as fábricas de vidro? Não tem, porque só
duas fábricas multinacionais, no Brasil, fazem vidro, e a produção
prioriza o automóvel e a construção civil. Quando a nossa cooperativinha
tenta encomendar mil frascos para geleia natural, não tem.
As cooperativas todas não têm condições de criar demanda para essa indústria?
Claro que tem. Lá no Uruguai, na época do neoliberalismo, houve uma
greve da única fábrica de vidro do país, uma multinacional espanhola. Na
fábrica, para transformar areia em vidro, precisa de mais de mil graus
de temperatura. O forno não pode desligar. E os operários fizeram a
greve e desligaram o forno. O capitalista ficou puto, pegou o seu
capital, voltou para a Espanha e fechou a fábrica. Os operários, que só
sabiam fazer vidro, o que fizeram? Fizeram uma assembleia e religaram o
forno, transformaram numa cooperativa e está lá, funcionando. Quando
começamos a ter problemas, fomos comprar vidro do Uruguai. E nos
perguntaram por que não montávamos uma fábrica. Então, ajudaram com um
projeto e vão nos dar assessoria, tomara que o BNDES financie, para
montarmos uma fábrica e começarmos a fazer vidro destinado às
cooperativas que produzem alimentos. O negócio é demorado, mas esse é o
caminho em todo o mundo.
A reforma agrária parou no Brasil? Continua? Está aquém do que precisa? Em termos práticos e teóricos, em que pé que está?
No senso comum das pessoas, se perguntar o que é a reforma agrária, todo
mundo tem na cabeça que é repartir o latifúndio e entregar para os
sem-terra. E é isso mesmo, na essência, romper com a grande propriedade,
sinônimo de latifúndio. Só a (ministra da Agricultura) Kátia Abreu não
sabe, porque ela estudou psicologia. Se tivesse estudado português,
saberia que latifúndio é sinônimo de grande propriedade. Ela diz que não
tem mais latifúndio, no Brasil, embora ela mesma tenha 3 mil hectares. É
latifundiária sem saber. Porém, os projetos de reforma agrária, feitos
pelo governo com os instrumentos do estado, só se viabilizaram, no
passado, porque eram política combinada com um projeto de
desenvolvimento nacional que objetivava desenvolver a indústria para o
mercado interno.
Aquele país "comunista", os Estados Unidos, começou assim.
Só viraram ricos por causa disso, com a lei de reforma agrária que
fizeram em 1872, quando o norte, industrial, fez guerra contra o sul,
latifundiário e escravista, e ganhou. Distribuíram terra para todo
mundo, 64 hectares, nem mais, nem menos. Essa foi a sabedoria do
presidente Abraham Lincoln, que escreveu a lei de reforma agrária. Toda
família americana, tinha, por lei, direito a 64 hectares. E mais: era
autoaplicável. Não precisava o "Incra" ir lá. Depois de comprovar que
morava há cinco anos em cima daquela terra, para o trabalho, ia ao
cartório com dois vizinhos de testemunha e o governo concedia o título.
Isso foi a base para os Estados Unidos virarem a maior potência
industrial do mundo. Coincidência ou não, 64 hectares é mais ou menos a
escala ideal para um trator médio trabalhar. Em poucas décadas de
reforma agrária, em 1920, os agricultores americanos tinham 900 mil
tratores. Sabe quantos temos na agricultura brasileira? Cem anos de
industrialização, no Brasil, produziram apenas 880 mil tratores. Aquela
reforma agrária só se viabilizou porque foi casada com um projeto de
desenvolvimento da indústria, porque transformava o camponês pobre e
sem-terra em um produtor de mercadorias e consumidor da indústria.
E nunca chegamos perto disso aqui?
Aqui no Brasil, o projeto que chegou mais próximo dessa reforma agrária
foi com o Celso Furtado, em 1964. Ele foi sábio. Disse "vamos
desapropriar todas as propriedades acima de 500 hectares". Com isso,
estabelecia um limite. Pra que se quer 100 mil hectares, ou 300 mil,
como tem o (senador) Blairo Maggi? É absurdo. Porém, não em qualquer
lugar. O projeto do Celso Furtado era desapropriar essas áreas, acima de
500 hectares, ao longo das rodovias federais, 10 quilômetros de cada
lado, para o camponês ficar perto do asfalto e perto das cidades. Assim,
ele ia ter luz elétrica rápido e, atrás da luz elétrica, viria a
geladeira, o fogão, a televisão, o ferro elétrico. Ou seja, a indústria
chegaria lá. Qual foi o resultado dessa proposta do Celso Furtado? O
golpe militar. Depois, na redemocratização, o José Gomes da Silva, nosso
amigo, que era da equipe do Lula e pai do José Graziano, hoje
presidente da FAO, tentou recuperar essa ideia e fez um projeto que
previa o assentamento de 1 milhão e 400 mil famílias. Ele entregou o
projeto em 4 de outubro, dia de São Francisco de Assis, e o Sarney o
demitiu no dia 13. Durou nove dias esse projeto de reforma agrária. A
pergunta subsequente é...
Por que o Lula não fez a reforma agrária?
Na generosidade dele, acredito que ele até queria. Por que a reforma
agrária está bloqueada até agora? Porque falta ao Brasil um projeto de
desenvolvimento nacional e industrial. Ao contrário, a indústria vem
diminuindo. Na década de 80, a indústria pesava 50% do PIB, hoje é 16%.
Não se pode fazer uma reforma agrária em que é só dividir a terra, sem
estar casada com um projeto de desenvolvimento nacional. Como nos falta
um projeto, falta também uma burguesia industrial disposta a bancar esse
projeto. Os camponeses, sozinhos, 10% ou 15% da população, não têm
forças políticas para impor. Não há condições políticas, atualmente, no
Brasil, para fazermos aquela reforma agrária clássica. Eu fui dar
palestra na Fiesp e disse: "Vocês são burros! Estamos querendo fazer
parcerias com vocês para desenvolver a indústria, a agroindústria, mas
vocês não querem. Querem ganhar dinheiro com juros." Era na época em que
eles faziam a campanha para acabar com a CPMF. Por que queriam acabar
com a CPMF? Porque o dinheiro deles estava no banco, e não nas fábricas.
Não vale mais a pena lutar pela reforma agrária?
O que nós dissemos, depois de muitas reflexões, nos últimos anos é que
agora a reforma agrária mudou de tipo. Que tipo de reforma nós temos de
fazer? Um outro tipo, que nós chamamos de popular. Centrada na produção
de alimentos saudáveis. A outra reforma agrária estava baseada na
palavra de ordem que os camponeses gritavam, na América Latina inteira:
"Terra para quem nela trabalha", que o (Emiliano) Zapata inventou. Hoje
não tem sentido fazer uma reforma agrária só porque o camponês precisa
trabalhar, até porque ele te diz que pode trabalhar de pedreiro e ganhar
mais. A reforma agrária não é apenas para resolver um problema de
trabalho. Tem de ser para resolver o problema do veneno, da alimentação
sadia. De garantir um futuro, de fazer uma agricultura que respeite o
meio ambiente, que respeite a biodiversidade. Por que está faltando água
em São Paulo? É por que o (governador Geraldo) Alckmin não fez
investimentos e privatizou a Sabesp? É, mas não é só por isso. É porque
os mananciais que abasteciam o Cantareira, lá em cima do morro, secaram.
E o que faz encher um açude, em qualquer parte do Brasil, são as
fontes, córregos e nascentes.
Por que secaram?
Por causa de uma agricultura predadora, baseada no monocultivo e no
veneno. Olhem ao redor da Cantareira. Ou tem eucalipto, que suga 60
litros de água por dia, ou não tem nada. Ou, virou monocultivo de cana.
Essa prática do agronegócio está afetando a vida das pessoas, inclusive
nas cidades, seja pelo alimento contaminado, seja pelo desequilíbrio
climático, por conta das práticas agrícolas. Então, temos de repartir
melhor a terra para aplicar um outro modelo de agricultura, que seja em
equilíbrio com a natureza, que não altere as chuvas, que não altere o
clima. Que plante árvores. As árvores caem em São Paulo por causa do
vento, não porque estão velhas. Uma árvore dura a vida inteira. E por
que o vento, aqui, é mais forte? Porque já não encontra mais resistência
nas imediações de São Paulo, então vem com um velocidade enorme e
derruba. Nós temos de fazer uma reforma agrária que refloreste o país,
porque a árvore é uma fonte de vida perene. Depois que se planta uma
árvore, ela fica uma vida inteira. Se for uma árvore frutífera, em todo
ano ela te dará alimento. O agronegócio vai reflorestar o país?
Imagina...
Ninguém mais quer viver no interior, igual ao Jeca Tatu. Como se leva comodidades para o interior?
Leva com a agroecologia, que são técnicas que fazem com que se aumente a
produção, com menos esforço físico. Leva com a agroindústria. Ou seja,
em vez de o agricultor vender o leite in natura para a Nestlé e receber
R$ 0,55, para depois ver, no supermercado, o mesmo leite, agora com água
e mais conservante, a R$ 2, como se leva esse lucro para o agricultor?
Isso é possível? É. Nós temos uma cooperativa, em Paranacity, no norte
do Paraná, em que 36 famílias produzem tudo coletivamente. Produzem o
leite orgânico. Cuidam das vacas, com pasto sem veneno, plantam cana
para as vacas comerem. Produzem todo o leite necessário para o
município, e todo dia de manhã pasteurizam o leite e levam aos mercados,
padarias e escolas. 36 famílias alimentam 10 mil pessoas com leite, e
vendem a R$ 1. Ganham o dobro, o consumidor paga a metade e percebe a
diferença. Esse é o nosso novo modelo. Uma reforma agrária popular que
não interessa só aos camponeses. Interessa a toda população, através dos
alimentos, da pureza e da disseminação da agroindústria, pequenas
agroindústrias por todo o país.
Tem espaço para isso na política? Vontade política basta para isso? Ou a
mentalidade do poder econômico, no Brasil, ainda está muito atrasada?
Congresso, Judiciário...
Na política atual, nós estamos ferrados. Na política atual, quem tem a
hegemonia é o agronegócio, com a bancada ruralista no Congresso, com
seus juízes, a maioria casados com filhas dos latifundiários, e com um
governo dividido. Temos o Patrus Ananias, que é de esquerda, no
Ministério do Desenvolvimento Agrário, e a Katia Abreu, da direita, na
Agricultura. Como é que o governo chega a uma conclusão, se tem no
ministério uma composição de classes? Qual é a nossa esperança? É que os
problemas vão se acumulando, na sociedade brasileira. As contradições
estão aí para buscarmos as verdadeiras soluções. Por mais que a mídia
falsifique a realidade, a médio prazo, temos de apostar na inteligência
humana e que as pessoas vão se dar conta de onde está a verdade. Nós
apostamos que, a médio prazo também, haverá uma reascensão dos
movimentos de massa, no Brasil, como foi de 1976 a 1989.
É comum os líderes do agronegócio alegarem que se não fosse por eles,
inclusive com a produção de "defensivos agrícolas", não seria possível
alimentar a grande massa de gente que se tem hoje, não só no Brasil como
no Mundo.
No Brasil, apesar de nós termos 360 milhões de hectares de propriedade
privada que são agricultáveis, e já têm dono, só se cultivam 64 milhões
de hectares. O absurdo começa aí. Por que se cultiva tão pouco? Porque
está monopolizado. Nesses 64 milhões de hectares que se cultiva, 15
milhões são agricultura familiar, o restante é agronegócio. O que se
planta nesses 50 milhões de hectares e, portanto, que dizem salvar o
Brasil? Plantam soja e milho, combinados, plantam algodão, eucalipto e
cana-de-açúcar. Note se na sua mesa você vai encontrar esses produtos.
Vai ter óleo de soja, uma fritura. O que mais? Ou seja, a maior parte da
produção não tem nada a ver com a cesta alimentar. Vai lá na Conab
(Companhia Nacional do Abastecimento). Nosso sonho é transformar a Conab
em uma grande empresa estatal. A Conab está comprando hoje, produzidos
nesses 15 milhões de hectares da agricultura familiar, 297 tipos
diferentes de alimentos. Esses são os que alimentam o povo. Aí você
encontra o arroz, o feijão, as frutas, o leite, a carne. A carne de
frango é fornecida pelo frigorífico, mas quem cuida do frango? É o
pequeno agricultor. A carne de porco, a mesma coisa. A agricultura
familiar produz 297 alimentos. O agronegócio produz isso aí: soja,
milho, algodão, eucalipto e cana, e se diz salvador da pátria.
Agricultura pesa 11% no PIB, mas dizem que "carregam" a economia. É para
isso que existe a Globo.
Mas eles reclamam que o governo dá as costas para eles.
Esses 50 milhões de hectares, que geran os 11% do PIB, são financiados,
todos os anos, com algo em torno de R$ 160 bilhões. De onde vêm esses R$
160 bilhões, já que dizem que carregam o Brasil nas costas? Sabe de
onde vem? O governo obriga que 40% dos depósitos à vista sejam
destinados ao agronegócio, ao financiamento da agricultura. Portanto,
quem está financiando a agricultura são os correntistas de depósitos à
vista, que não recebem nada. Aí o fazendeiro pega R$ 1 milhão para
plantar soja. O governo ainda combina com ele. O banco diz: "Não vou
emprestar para esse cara. No comércio, recebo 48% de juros. Por que vou
emprestar a 12%?". Então, o governo faz mais um acerto: pega do Tesouro e
paga para o banco mais 12%. O Tesouro nacional - ou seja, todos nós -
gasta todos os anos 12% sobre esses R$ 160 bilhões. Então, quem é que
está carregando o Brasil?
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