Argemiro Ferreira.
McCain e a rejeição do pacote de Bush.
Em meio ao medo generalizado em seguida à rejeição na Câmara dos Deputados, sob a influência da bancada republicana, do pacote de US$700 bilhões do governo Bush para enfrentar a crise financeira, vale a pena ler melhor o que escreveu domingo o colunista Paul Krugman, um economista que nunca perde de vista a fator político nas suas análises econômicas.
Ele escreveu antes da decisão, mas ofereceu a medida adequada do reflexo da decisão da Câmara na campanha presidencial. Krugman não é um profeta do caos. Prefere ser sensato. Ele acha que a proposta apresentada domingo pelo secretário do Tesouro Henry Paulson, era muito melhor do que a original. Os remendos profundos, disse, eram suficientes para merecer a aprovação.
Não era o plano ideal e nem poria fim à crise. O mais provável, para o colunista do "New York Times", era o próximo presidente ter de tratar a questão depois com algumas grandes emergências financeiras. Quem então estaria bem equipado para o desdobramento seguinte? Barack Obama, bem informado e sensato em temas financeiros? Ou John McCain, que evitava o assunto, dizia-se não familiarizado com a economia, e escolhe mal os assessores?
O fantasma do guru Gramm
McCain deixa o economista Krugman assustado. O principal mentor do candidato em economia - conforme lembrei nesta TRIBUNA, em coluna anterior - era o ex-senador texano Phil Gramm, que patrocinava folias desregulamentadoras no Senado e depois decidiu tornar-se lobista. Gramm só não está mais na campanha de McCain porque foi longe demais em suas manifestações públicas.
Em julho, ao fazer um de seus retratos róseos da economia americana, ele jurou que só havia risco de recessão na cabeça de alguns, logo era "recessão mental". E, não contente com isso, chamou os EUA de "uma nação de choramingões". Também acrescentou depois que McCain tinha um plano (feito pelo próprio Gramm) "para reviver o crescimento dinâmico com dramáticas reformas fiscais e redução de gastos".
Obama ironizou as declarações de Gramm - e, comparando-o a uma personalidade da TV, chamou-o de "Dr. Phil da economia". O próprio McCain, então, percebeu a conveniência de afastar o conselheiro trapalhão, que é vice-presidente de um banco de investimentos, o UBS. Mas isso não impediu o candidato republicano de continuar convencido de que Gramm é o nome ideal para ser seu secretário do Tesouro.
Até há menos de duas semanas McCain, na linha Gramm, continuava garantindo que "os fundamentos da economia são sólidos". Disse a frase 18 vezes este ano, como um refrão monótono. Seguia o guru arquidesregulamentador: deve-se a Gramm o esforço contra a supervisão dos derivativos financeiros, os instrumentos que afundaram o Lehman Brothers e a AIG, deixando os mercados de crédito à beira do colapso.
O rumo desastroso do candidato
A adesão de McCain à fúria desregulamentadora também levou sua campanha no ano passado, como agora lembrou Krugman, a reunir "impressionante coleção de economistas, professores e líderes proeminentes do conservadorismo" para assessorá-lo em política econômica. Em destaque especial, no grupo, estava Kevin Hassett, autor (com James Glassman) do livro "Dow 36,000" - supostamente, "uma nova estratégia para lucrar na ascensão que virá no mercado de ações".
Qualquer um que leia jornal, sabe o que está acontecendo: as ações despencam - só ontem o Dow afundou quase 800 pontos, para 10.365 e não 36.000. A pobreza na qualidade dos assessores econômicos de McCain, segundo Krugman, reflete o estado intelectual despedaçado de seu Partido Republicano. O colunista acha patética, por exemplo, a proposta econômica dos republicanos da Câmara para resolver a crise financeira.
Refere-se exatamente ao grupo de republicanos à frente da rebelião na Câmara contra o plano remendado - e melhorado - do secretário Paulson. A sugestão deles era tentar resolver o problema através da eliminação de impostos sobre os ganhos de capital. Mas instituições financeiras em desordem, conturbadas, por definição não têm ganhos de capital para serem taxados, advertiu Krugman.
Os fundamentos duvidosos
Segundo o colunista, até o presidente Bush, no crepúsculo de seu governo, voltou-se para pessoas relativamente sensatas para tomar decisões econômicas. Krugman não é fã de Paulson, mas acha que ele representa grande avanço, para melhor, em relação ao antecessor. E a esta altura, começa a suspeitar que um governo McCain pode levar as pessoas até a ter saudade da "competência" de Bush.
O estranho, para Krugman, é que nas últimas semanas McCain chegou a ter algumas opiniões vigorosas - mas pouco depois partia para direção inteiramente oposta. A 15 de setembro disse, pela 18a vez este ano, que "os fundamentos da economia são sólidos". Foi o dia do colapso da Lehman e da tomada da Merrill Lynch, quando a crise financeira entrou num palco novo e muito mais perigoso.
Mas três dias depois McCain acusava os mercados financeiros do país de terem virado um "cassino", exigindo a demissão do diretor da SEC. A economia moderna, diz o colunista, é perigosa e não pode ser enfrentada com conversa dura e denúncia de malfeitores. "Terá o sr. McCain a capacidade de avaliação e o temperamento para tratar dessa parte do emprego para o qual se candidata?" - pergunta Krugman.
Fonte: Tribuna da Imprensa.
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