Caso Monte Santo: Globo condenada a indenizar juíza de Gaspar
A Globo foi condenada em 1ª instância a indenizar a juíza Ana Paula Amaro por reportagem veiculada no Jornal Nacional, acerca da adoção de crianças em Gaspar (SC).
Mais importante que a decisão foi sua fundamentação.
A juíza Cleny Serly Reauen Vieira disseca a estratégia das perguntas direcionadas, das informações sonegadas e dos truques de edição visando encaminhar a apuração para o desfecho pretendido pela emissora. É uma sentença importante por abordar as diversas formas indiretas de manipulação da informação.
Como se recorda, baseando-se em denúncias da jornalista Eleonora Ramos, Jornal Nacional e Fantástico empreenderam uma campanha contra a adoção visando turbinar uma novela "Salve Jorge", que tratava da questão do tráfico de pessoas. Montou um circo em Monte Santo (BA), mencionando quadrilhas organizadas, perigosas, criminalizando casais que adotaram e um juiz sério preocupado com a segurança das crianças.
Depois estendeu as denúncias para o município de Gaspar (SC) e para a juíza Ana Paula Amaro da Silveira. Nem se preocupou em se informar sobre a reputação da juíza, com um trabalho reconhecido por toda a comunidade.
O extraordinário poder da Globo, de destruir reputações, bateu de frente, no entanto, com dois juízes sérios: o de Monte Santo e a juíza Ana Paula que, graças às redes sociais, puderam disseminar sua defesa e demonstar a trama.
Em sua defesa, a Globo alegou:
1. Não haveria porque considerar que maculou a imagem da Ana Paula, pois teria se restringido a relatar sobre processos de destituição de poder familiar e seus efeitos sobre a sociedade afetada.
2. Alega que a edição buscou selecionar fatos que interessavam ao telespectador. E que esses fatos seriam os abalos sofridos pelos familiares que passaram por processos de destituição.
3. Invoca os valores da liberdade de expressão, que seria ameaçada pela pretensão de Ana Paula.
Liberdade de informação x direito à honra
A juíza Cleny começa sua sentença ponderando sobre os conflitos entre liberdade de informação/imprensa vs direito à honra, à imagem e à privacidade.
"No que toca à liberdade de imprensa, esta abrange o direito de informar e de ser informado". Lembra que o poder de disseminar informações é ampliado pela reprodução nos rádios, jornais, periódicos, assim como pela Internet.
Admite que a Constituição prevê os direitos da imprensa mas "impõe responsabilidade e observância dos direitos e garantias individuais". Logo, a liberdade de imprensa e de expressão não são direitos absolutos.
A primeira alegação acatada pela juíza foi a maneira maliciosa com que a reportagem tratou Ana Paula. Ela foi convidada a dar entrevistas sobre as práticas implementadas na área. Quando começou a entrevista, percebeu que a intenção era responder a acusações formuladas por numa funcionária municipal. Ela propôs, então, esclarecer a real situação dos procedimentos, "tendo o repórter, em evidente má fé, se negado a ouvi-la”. Quando a reportagem foi ao ar, "evidenciou a forma tendenciosa como a entrevista foi conduzida, passando a falsa impressão de que as crianças simplesmente eram arrancadas das famílias pobres para serem entregues à adoção de forma sumária".
A defesa da Globo foi que a reportagem não teve intuito sensacionalista nem cunho difamatório, "pois tratou-se de jornalismo crítico, lastreado na liberdade de informação e de pensamento".
A opinião da juíza foi a de que "a ré extrapolou o limite da informação crítica, utilizando-se de inverdades para produzir matéria sensacionalista".
A opinião da juíza foi a de que "a ré extrapolou o limite da informação crítica, utilizando-se de inverdades para produzir matéria sensacionalista".
O impacto foi tão grande que imediatamente o Tribunal de Justiça de Santa Catarina ordenou uma correição na comarca, que concluiu pela retidão de Ana Paula.
A sentença lembra que em 2001 a mesma Globo havia sido condenada por falsa denúncia contra um juiz que comandava adoções em Jundiaí.
A juíza condenou a Globo a indenizar Ana Amaro em R$ 500 mil. E também a lhe conceder Direito de Resposta.
A juíza cita a Constituição e também a tramitação da Lei de Direito de Resposta no Congresso, E menciona igualmente o Pacto de São José da Costa Rica, subscrito pelo Brasil, prevendo que toda pessoa atingida em sua reputação por meios de difusão legalmente regulamentados tem direito a fazer, pelos mesmo órgão de difusão, sua retificação ou resposta.
PS – Recebia da juiza Ana Paula Amaro um pequeno e gratificante email:
Sr. Nassif:
Agradeço a sua ajuda em divulgar.
Pela sua honestidade e coragem, meu muito obrigado.
Ana Paula
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