Grampo da Lava Jato: aproxima-se a hora da verdade
Marcelo Auler
A Corregedoria Geral do Departamento de Polícia Federal (DPF) comprometeu-se com o juiz Sérgio Moro concluir até o final do mês, ou seja, nos próximos dez dias, a sindicância que investiga o grampo encontrado na cela do doleiro Alberto Youssef, no final de março de 2014. O prazo foi estipulado em um ofício encaminhado ao juiz no último dia 12 (veja abaixo). Quem está cuidando da investigação é o delegado Alfredo José de Souza Junqueira, coordenador de Assuntos Internos (Coain) da Corregedoria do DPF, também conhecido entre seus colegas como “O Ético”.A esta altura são poucas as dúvidas sobre a real existência do grampo. Afinal, como noticiamos na matéria – “Surgem os áudios da cela do Youssef: são mais de 100 horas” -, a perícia do DPF em Brasilia teria recuperado os áudios, segundo informou na época o deputado Aluísio Mendes Guimarães Junior ((PSDC-MA). São conversas do doleiro com os demais presos na cela 5 da custódia da Superintendência Regional do Departamento de Polícia Federal no Paraná (SR/DPF/PR).
O próprio juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba, que está à frente da Operação Lava Jato, também já deixou claro que não houve autorização judicial para este tipo de grampo. Há, porém, questionamentos cujas respostas conhecidas precisam ser confirmadas – quem mandou colocá-lo? – e outros para os quais ainda não houve explicações: qual a motivação para fazê-lo de forma ilegal? E por que a Superintendência tentou, a todo modo, escondê-lo, inclusive com uma sindicância (04/2014) aparentemente feita para desmenti-lo?
A dúvida maior, no entanto, é se todos estes fatos – grampo ilegal, os áudios das conversas do doleiro com seus parceiros de cela, a possível perda de credibilidade de delegados caso mentiras sejam confirmadas – afetarão de alguma forma toda a Operação Lava Jato. Justamente o medo de que tudo isso venha a prejudicar a punição dos responsáveis pelo grande esquema de corrupção que foi descoberto, é que leva muita gente – a grande imprensa, inclusive – a evitar tocar no assunto.
Esquecem, porém, que há um exército de advogados, muitos deles dos melhores escritórios do país, que no legítimo dever/direito de defenderem seus clientes, esmiuçam os bastidores de tudo o que foi feito pela Polícia Federal, Procuradoria da República e a Justiça Federal do Paraná na tentativa de absolver ou, pelo menos, minimizar as punições dos réus que defendem.
É verdade que, em 11 de abril de 2014, um dia depois de ser comunicado do grampo ilegal descoberto na cela de Youssef, o juiz Moro, em despacho dentro dos autos de Busca e Apreensão Criminal Nº 5001446-62.2014.404.7000/PR, já descartava qualquer vínculo entre o grampo encontrado e o que estava sendo apurado.
Registre-se que, à época, não tinham vindo à tona as descobertas das transações nebulosas envolvendo a Petrobras e outras estatais. Apurava-se as operações dos doleiros, em especial Carlos Habib Chater (de Brasília) e Youssef, na chamada Operação Bidone. Neste despacho Moro foi claro:
“Observo, de todo modo, que não há qualquer prova nestes autos provenientes, direta, indiretamente ou mesmo remotamente de qualquer escuta ambiental. As provas em exame são aquelas que motivaram as prisões e as buscas e aquelas que foram apreendidas nas buscas e apreensões e estão sendo examinadas”.
Ainda que assista razão ao juiz na sua observação, convém lembrar que, naquele momento, Youssef não tinha prestado nenhum depoimento. Isso, quem afirmou foram os delegados Igor Romário de Paula (Delegado Regional de Combate ao Crime Organizado – DRCOR da SR/DPF/PR) e Márcio Anselmo Adriano, da Delegacia de Combate aos Crimes Financeiros (DELEFIN), encarregado das investigações da Lava Jato.
Na primeira vez em que foi colocado à frente dos delegados para se ouvido, o doleiro exerceu seu direito de ficar calado.
Mas, como admitiu seu advogado, Antônio Augusto Lopes Figueiredo Bastos, na matéria “Lava Jato revolve lamaçal na PF-PR“, o doleiro foi retirado da cela para “conversas informais” com os delegados. Segundo ele, lhe questionavam sobre assuntos relacionados às suas conversas com os demais presos:
“Tivemos alguns indícios disso sim, Houve indícios, isso não tem dúvida. Mas, não em interrogatórios. Em conversas assim… que não têm como serem recuperadas. Eles nunca interrogaram diretamente sobre isso, mas os assuntos acabavam sendo abordados pelos delegados”, declarou Bastos.Ao comunicar o fato ao juízo, em 10 de abril de 2014, o advogado de Youssef levantou a hipótese de que o grampo ilegal contra seu cliente poderia ter a finalidade de ajudar a captar provas:
“Interceptações de conversas são medidas excepcionais, expedientes extremos que somente se justificam diante da impossibilidade de obtenção da prova através de outro meio menos invasivo, por isso carecem sempre de prévia e fundamentada autorização judicial.Não se pode, porém, descartar uma outra hipótese. De que a escuta clandestina tenha servido, a quem dela fez uso, para obter “argumentos” que ajudassem a convencer Youssef a aderir à delação premiada. Uma possibilidade admitida nos bastidores da própria Polícia Federal.
O investigado está encarcerado, e não tem sequer uma imputação formal contra si. É extremamente grave o ocorrido, houve uma interceptação abusiva que malfere os direitos e garantias do investigado”.
Grampo mal cheiroso - O aparelho de escuta foi descoberto ao acaso por outro preso da Operação Lava Jato, Carlos Alberto Pereira da Costa, entre os dias 29 e 30 de março (não houve uma definição clara).
Na cela, o local apropriado para uma luminária estava vazio, sem ponto de luz. Uma caixa de papelão sobre a laje mal tampava o buraco. Carlos Alberto atribuiu à fresta que ficou, o mau cheiro que sentiam. Subiu em uma beliche para reforçar a vedação com uma revista. Ao fazê-lo, empurrou a caixa de papelão sobre a laje. Ela tombou, deixando os fios do grampo expostos. Eles foram puxados e a parte mais pesada do aparelho caiu e ficou pendurada. Logo foi arrancada.
No dia em que o grampo foi descoberto, o doleiro sequer tinha sido denunciado, ou seja, ainda não era réu. Isto só foi acontecer em 22 de abril, na Ação Penal nº 5025699-17.2014.404.7000. Nela, ele e outros seis doleiros e assessores foram acusados pelo Ministério Público Federal (MPF) de, entre junho de 2011 e março de 2014, “promoverem a evasão fraudulenta de aproximadamente 500 milhões de dólares (US$ 444.659.188,75), por meio de 3.649 operações, utilizando-se de complexa engenharia financeira, que envolveu importações fictícias justificadas pela celebração de contratos de câmbio por empresas de fachada, sendo algumas delas a “Indústria Labogen S.A.”, “Labogen Química Fina”, “Piroquímica”, “HMAR”, “RMV & CVV”, entre outras”.
Ou seja, Youssef estava preso legalmente desde 17 de março, mas sem uma acusação formalizada, o que só ocorreria em 22 de abril. Nesse espaço de tempo, havia um grampo em sua cela e ele mantinha conversas “informais” com os delegados. Somente depois disso, aceitou a “delação premiada”, negociada pelo próprio advogado, Este, curiosamente, jamais pareceu preocupado com o grampo em si. É verdade que, na reportagem que postamos em 20 de agosto, ele prometia:
“Isso é um caso que tem que ser bem esclarecido (…) Vou me basear, exclusivamente, na sindicância atual da Polícia Federal. Se ela apontar que efetivamente houve o grampo e este grampo foi feito de forma ilegal, aí, com certeza nós vamos ter que tomar atitude. Porque aí é uma violência brutal contra o meu cliente (…) Se houver a prova de que efetivamente esta interceptação é ilegal, nós iremos tomar providências sim, porque daí não tem como justificar você cometer um ilícito para investigar outro. Em minha opinião, se isto é ilegal, qual a credibilidade da investigação?”Apesar dessa posição, como lembram outros advogados e até policiais federais que acompanham o caso, ele não contestou o resultado da primeira sindicância, nem fez qualquer movimento no sentido de esclarecer o que se passou. Coube à defesa dos diretores da Odebrecht encaminhar ao juiz, em 21 de outubro, uma solicitação de informações à Corregedoria do DPF sobre a sindicância que está sendo refeita pelo delegado Junqueira. O pedido anexou cópias das reportagens publicadas neste blog. Não só a que, no dia 12 de outubro, revelou a existência de cem horas de áudio, como a de 20 de agosto na qual aparece o ofício assinado pelo próprio Junqueira e encaminhado à CPI da Petrobras, confirmando que o grampo encontrado no fumódromo da superintendência era ilegal – Lava Jato revolve lamaçal na PF-PR. Com isso, aumentará o coro dos que nos acusam de fazer o jogo dos réus. É do jogo.
MPF ausente – A primeira sindicância em torno do grampo, foi feita na própria Superintendência aos cuidados do delegado Maurício Moscardi Grillo, então chefe do Grupo de Investigações Sensíveis (GISE). Pelo que se depreende da cópia dela encaminhada pela Polícia Federal à CPI da Petrobras, o delegado Moscardi descumpriu uma determinação do juiz Moro e outra do superintendente Rosalvo Ferreira Franco. Nem por isso, sofreu qualquer sanção.
Moro, no despacho assinado no dia 11 de abril, foi explícito na determinação de que a sindicância anunciada pela Polícia Federal tivesse o acompanhamento do Ministério Público Federal, a quem cabe o Controle Externo da Polícia. Ele, inclusive, determinou a intimação da Procuradoria da República para tomar ciência de sua decisão.
No entanto, nas 139 folhas da Sindicância a que o blog teve acesso, a única citação ao Ministério Público Federal foi a do juiz. Não só não há registro da participação de algum procurador da República nos 16 depoimentos colhidos de 12 testemunhas – algumas pessoas depuseram mais de uma vez – como sequer houve ofício da Polícia Federal ao MPF comunicando o resultado da apuração.Apenas encaminharam o resultado ao juiz Moro, que acatou a conclusão do delegado Moscardi de que o grampo era antigo, da época em que o traficante Fernandinho Beira-Mar esteve preso ali (2008) e estava desativado.
Também não se conhece nenhuma medida por parte dos procuradores em consequência do descumprimento da ordem judicial. É como se ela não tivesse existido e o MPF não precisasse acompanhar esta apuração. Nem parece serem os mesmos que correram a denunciar – erroneamente, como destacou o juiz da 12ª Vara Federal de Curitiba, Danilo Pereira Júnior – o delegado Mario Renato Castanheira Fanton e o agente Dalmey Fernando Werlang por supostamente caluniarem os delegados da cúpula da superintendência ao apontarem prováveis erros cometidos na Operação Lava Jato.
Superintendente sem comando? – - Já a determinação do superintendente do DPF no Paraná, delegado Rosalvo, expressa em mensagem eletrônica que encaminhou a todas as chefias da SR/DPF/PR comunicando a instauração da sindicância, tornou-se uma “letra morta”. Aos olhos de qualquer leigo, parece ser uma recomendação banal em uma investigação policial.
“Que o artefato seja encaminhado para a perícia”
O primeiro a descumpri-la foi o terceiro na hierarquia da instituição, o delegado Igor Romário, Delegado Regional de Combate ao Crime Organizado. Em memorando, de 14 de abril de 2014, ao então corregedor, Alcyon Dalle Carbonare, expôs seus motivos para não solicitá-la:
“Quanto ao encaminhamento para a perícia, deixo de fazê-lo para que a medida possa ser realizada a pedido da autoridade policial designada para a sindicância que poderá determinar os quesitos conforme interesse da apuração”
Nada o impedia de, paralelamente a entrega do caso a um delegado para presidi-lo, fosse feito o pedido oficial do laudo pericial com a questão que parece básica no caso: aquele aparelho, instalado no teto da cela, poderia estar gravando antes de ser encontrado?O memorando de Igor foi a última citação da perícia em toda a sindicância. Pode até ser que Rosalvo, que segundo o agente Dalmey, estava junto quando ele recebeu a ordem do delegado Igor para colocar o grampo, tenha determinado a perícia apenas para constar. Afinal, ela poderia revelar se o grampo estava ou não funcionando, contrariando a posição da Superintendência que sempre insistiu que ele não estava ativado.
Seja como for, ao se verificar que sua ordem não foi cumprida, passou a imagem da falta de liderança e comando. O que não é bom para a sua carreira.
Oficialmente, a sindicância começou no mesmo dia 11 de abril da mensagem do superintendente Rosalvo. Coube a outro delegado, Gustavo Emílio Trevizan Mochi, ouvir os cinco presos da Operação Lava Jato que ocupavam a cela 5. O primeiro foi Youssef, depois, André Catão de Miranda, Carlos Alexandre de Souza Rocha, Luccas Pace Junior, Carlos Alberto Pereira da Costa.
Os traficantes Cláudio e Sedenir, não identificados completamente na apuração. também dividiam o mesmo espaço quando o grampo foi achado, no final de abril. Mas, na época da sindicância, já não estavam mais na custódia. Foram transferidos antes do dia em que a descoberta do grampo tornou-se conhecida. Claudio foi quem ajudou Carlos Alberto a recolher o aparelho do forro do teto. Sequer houve a preocupação de achá-los para deporem.
Na mesma cela ainda passaram Pedro Argese Junior, Rafael Srour e Esdra de Arantes Ferreira, cujas prisões temporárias decretadas na Operação Lava Jato duraram apenas cinco dias e não foram renovadas. Certamente suas vozes aparecerão nos áudios.Jogo de cartas marcadas - Para não fazer a perícia determinada pelo superintendente, o delegado Moscardi usou de um subterfúgio. Encomendou ao agente federal Dalmey um parecer técnico sobre o aparelho encontrado. E isto só ocorreu no dia 8 de maio, quase um mês depois de a sindicância ser iniciada. Normalmente, na vida real e nos seriados de televisão, neste tipo de investigação a perícia costuma ser uma das primeiras providências tomadas. Na Polícia Federal do Paraná isso não ocorreu.
Foi um jogo de carta marcadas, pois o próprio Dalmey foi quem colocou o grampo como ele vem confessando desde 4 de maio passado, ao depor para o delegado Mario Fanton (veja a íntegra do depoimento em Lava Jato revolve lamaçal na PF-PR). Segundo ele diz, Rosalvo e Márcio Adriano estavam ao lado de Igor quando este lhe mandou colocar o grampo por conta das primeiras prisões na Lava Jato. A ser verdade o que fala, o delegado Moscardi também estaria ciente de tal procedimento. Mesmo que desconhecesse, nada justifica que tenha deixado de solicitar a perícia técnica e também que não tenha ouvido, no minimo como testemunha, o agente Dalmey, já que na superintendência é considerado quem mais entende de escutas e grampos.
Somente o fato de já saber que o grampo tinha sido colocado a pedido da cúpula da SR/DPF/PR justifica a substituição de uma perícia criminal por um parecer técnico de um agente que, embora especialista no assunto, não é, teoricamente, capacitado a fazer tais laudos. E o parecer dele foi sob encomenda, típico de quem estava interessado em ajudar a esconder o fato. Ele não atestou se o aparelho poderia ou não ter feito gravações enquanto permaneceu instalado. Declarou o que parece óbvio:
“Nas condições atuais, o conjunto apreendido (transmissor, fonte e cabos), se ainda instalados, não teria qualquer funcionalidade”.
Nas “condições atuais” significa dizer, após ser destruída a instalação ao ser puxada pelo fio, fazendo desaparecer até o microfone.
Outra questão em aberto na apuração foi com relação aos presos terem sido retirados das celas no dia em que foi deflagrada a Operação Lava Jato com a prisão dos doleiros. Dalmey, no depoimento prestado ao delegado Fanton e também na CPI, garantiu que o DRCOR, Igor, determinou ao agente Paulo Romildo Rossa Filho, mais conhecido como Bolacha, que retirasse todos das celas para efetivar a instalação da aparelhagem sem testemunhas.
A revelação de Dalmey, é verdade, só foi feita em maio deste ano, cerca de oito meses após o encerramento da sindicância – setembro de 2014 – quando o agente ainda parecia jogar com o time que negava o grampo. Mas, em 16 de julho, Aílton Gonçalves da Silva, preso desde dezembro de 2013, foi taxativo ao afirmar que no dia da chegada de Youssef todos os encarcerados foram levados para o pátio, distante das celas. Nessa ocasião, ele diz ter visto um dos guardas municipal que serviam na superintendência, Referes, ingressar na custódia com um policial federal.
Os dois tiveram ajuda de Valdecir de Lima, outro preso, que quebrou o cadeado do alçapão que dá acesso ao forro da custódia. Aílton, não só viu Valdecir colaborar com o agente e o guarda municipal, como ouviu o próprio lhe confessar o feito.
Ele não sabia o nome do policia federal. Quem o identificou foi Youssef, apesar de que nessa tarde o doleiro sequer tinha chegado à custódia, o que ocorreu à noite.
No reconhecimento fotográfico, Aílton apontou tratar-se do agente Rodrigo Prado Pereira. Acontece que, naquela data, Prado cumpria missão em Camboriú, Santa Catarina. Foi o suficiente para desconsiderarem o depoimento. Sequer colocaram Aílton frente à frente com Bolacha, que nega tudo, inclusive a retirada dos presos das celas.A sindicância presidida pelo DPF Moscardi também não ouviu os guardas municipais que trabalhavam junto a custódia da superintendência. Já o delegado Junqueira fez questão de ouvir tanto Referes como seu colega Benitez. Mandou localizarem ainda o Agente Penitenciário Federal, Takata, que atuou na custódia, mas retornou ao presidio de Catanduva após desentendimentos dento da Polícia Federal.
A grande dúvida que persiste junto aos servidores da SR/DPF/PR é com relação ao delegado Paulo Renato Herrera, um dos primeiros a questionar os métodos usados na Operação Lava Jato. Em consequência, caiu em desgraça e foi apontado como “dissidente”. Até hoje ele está afastado por licença médica e evita qualquer comentário a respeito do caso. Jamais tinha sio ouvido pela Corregedoria. Ninguém sabe informar, porém, se Junqueira o fez.
Personagem controverso - Curioso é que ao depor, o agente Bolacha, chefe da custódia, negou a movimentação relatada por Aílton assim como a ida de qualquer policial naquele dia à carceragem, no seu horário de trabalho. Falou isto em dois depoimentos, em dias diferentes. Segundo o blog conseguiu apurar, repetiu a mesma coisa nessa nova investigação. Desmentiu, portanto, Dalmey que conta com o depoimento de sua colega Maria Inês Paris. Ela o teria auxiliado na instalação do grampo e confirmou isso em e-mail, aqui divulgado (“Lava Jato: surgem mais grampos na PF-PR. “Grampolândia”?“).
Ao depor para o delegado Junqueira, Bolacha foi advertido das implicações criminais que pode sofrer diante de provas concretas da existência do grampo. Mas ele bancou a versão inicial e pediu até acareação com quem diz que os presos foram retirados da cela, ou seja com Dalmey e com o preso Aílton. No dia em que esteve com Junqueira, soube que voltou a ser acusado na nova investigação.
Bolacha é um personagem controverso dentro da SR/DPF/PR. Está na Polícia há muitos anos. Desde 2004 mantém-se na Custódia da superintendência. Em 2006 foi candidato a deputado estadual pelo PDT, não se elegendo. No início de 2014, foi acusado, no Inquérito Policial 453, de ter cobrado propina de Vergnia Aparecida Mariani, cujo marido, Dinocarme Aparecido Lima, foi preso na Operação Parceria, em Londrina. Foi uma ação do DPF que desbaratou um esquema de fraude com verbas publicas repassadas ao Centro Integrado de Apoio Profissional (Ciap), Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) dirigida por Dinocarme. Ele e sua mulher foram condenados no processo. Hoje recorrem da sentença no TRF-4.
Segundo Vergínia, para que seu marido não fosse transferido para a penitenciária estadual de Piraquara – um terror para qualquer preso -, Bolacha lhe cobrava. Ao depor, conforme o blog apurou com fontes próximas a ela, foram apresentados comprovantes de depósitos na conta bancária do agente, bem como do pagamento da faculdade do seu filho.
Apesar disso, Bolacha permaneceu à frente da custódia. O Inquérito 453/2014 até o final de outubro não tinha sido distribuído nem à 12ª, nem à 14ª Varas Criminais Federais de Curitiba (o juiz Moro, da 13ª Vara, já se deu por impedido para apreciar este caso). Não se conhece o andamento da investigação, embora, teoricamente, para um caso deste tipo seja necessário autorização judicial para quebra de sigilo bancário e fiscal de forma a verificar possível recebimento de recursos sem origem declarada.
Ainda em 2014, ele viu-se envolvido no inquérito que deveria apurar como um celular chegou à cela de Youssef. O caso, também não foi adiante. Em julho do ano passado, ele tomou posse na diretoria do Sindicato dos Policiais Federais do Paraná, cuja presidência é ocupada por Fernando Augusto Vicentine.
Por diversas vezes o blog telefonou para Bolacha, em busca de sua versão sobre o inquérito 453/2014, mas não conseguiu que ele retornasse a ligação. Nem mesmo o advogado Ademir Gonçalves, delegado federal aposentado e amigo do agente, que o tem acompanhado nos depoimentos sobre o grampo, quis falar a respeito, alegando desconhecer o caso. Como sempre, este espaço está aberto às explicações de Bolacha e da própria Polícia Federal. Aliás, no dia 5 de novembro encaminhamos um pedido de esclarecimento à Superintendência do DPF no Paraná sobre o inquérito. Até hoje não merecemos resposta.
Contradições surgirão – Após permanecer a semana toda em Curitiba ouvindo policiais federais, delegados, os dois guardas municipais, um agente penitenciário federal e um delegado da Polícia Civil do Paraná, entre outras testemunhas e suspeitos, o delegado federal Alfredo Junqueira, da Coain, está em Brasília elaborando o relatório final da sindicância.Oficialmente, nem Junqueira, nem a Comunicação Social do DPF dão detalhes sobre a apuração. Mas, a investigação apresentará algumas contradições com a sindicância feita pelo delegado Moscardi. Por exemplo, com relação à motivação da revista na cela de Youssef na tarde do dia 10 de abril de 2014, quando acharam o aparelho de escuta recolhido pelos presos.
Conforme noticiamos em 25 de outubro na reportagem Lava jato: um fato, duas versões da PF-PR. Mentira?, ao depor na 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba, o delegado Igor de Paula declarou que a revista foi provocada por conta da suspeita da existência de celulares na cela.
“(…) a gente já vinha fazendo várias revistas na custódia para localizar itens não autorizados e, por uma informação da possibilidade de haver um telefone lá dentro, foi feita uma revista na custódia e encontrado, salvo engano, nos pertences do réu Alberto Youssef, uma das partes de um equipamento de escuta ambiental”.
A mesma versão foi apresentada tanto na abertura da sindicância 04/2014, como no relatório feito pelo delegado Moscardi (veja ao lado) que acrescentou ainda o fato do infarto de um guarda municipal ter deixado a custódia desguarnecida enquanto socorriam-no.
Na CPI da Petrobras, o delegado Rivaldo Venâncio deu outra explicação. Segundo ele, naquele dia, o superintendente Rosalvo foi chamado pelo delegado Silvio Jacob Rockembach, chefe da Agencia de Inteligência da Polícia Civil do Paraná. Sem poder ir ao encontro, pediu que Rivaldo o representasse.
Profissional considerado competente e sério, Rockembach comunicou que Youssef estava em poder de um aparelho de escuta retirado do forro da cela. Segundo se suspeita, ele foi avisado por um dos peritos contratados pela defesa do doleiro para analisar as fotos do grampo. Ao retornar à SR/DPF/PR, segundo disse aos deputados, Rivaldo relatou o fato na presença de Rosalvo e de Igor. Foi quando decidiram fazer a revista na cela retirando os preso dela. Acharam o aparelho no colchão de Youssef.
No depoimento de Rivaldo na CPI ele narrou um episódio tragicômico. Ausente no momento em que o recado do delegado civil foi levado ao superintendente – na hora, ele colhia o depoimento de um dos presos – Márcio Adriano foi buscar informações na sala de Rivaldo – na época ainda chefe da Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE). Ao ouvir a história, encostado na parede, escorregou pela mesma com as duas mãos na cabeça sem esconder a cara de pânico.O delegado Junqueira, pelo que o blog apurou, não só ouviu Rivaldo como também Rockembach, que confirmou a versão do primeiro. Não se sabe a qual versão o coordenador da Coain dará valor.
Erramos - Ao reproduzirmos aqui uma reportagem da revista Época na matéria “Lava Jato: surgem mais grampos na PF-PR. “Grampolândia”?” cometemos um erro, por confiar na apuração feita pelo blog da semanal
Ali constava que os advogados Jéferson Amorim e Ademir Gonçalves – defensores de policiais federais acusados de envolvimento com esquemas de contrabando e descaminhos na fronteira com o Paraguai – pediram a abertura de um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra os policiais responsáveis pela Operação Erupção, deflagrada em julho de 2012.
Na verdade, como explicou Gonçalves, o delegado aposentado que advoga para dois policiais envolvidos nesta operação, não houve nenhum pedido de PAD como noticiado pela revista e por nós.
“Fiz um pedido em um PAD que está em tramitação. Queremos averiguar se nossos clientes também foram vítimas de grampos ilegais em suas celas”, explicou.
O pedido foi encaminhado à Superintendência do DPF no Paraná, onde o PAD tramitou. Mas o Processo Disciplinar encontra-se em Brasília – já há um demitido e o pedido de demissão de um delegado no Ministério da Justiça.A superintendência, segundo Gonçalves, lavou as mãos alegando nada poder fazer. Agora a questão terá que ser apreciada em Brasília. A expectativa dele é que se houver grampo ilegal, seus clientes podem se beneficiar.
Como informamos na matéria, o agente Dalmey admitiu ter instalado grampos em duas celas, a pedido do delegado que comandava a operação, Rodrigo Costa, na época do setor de contra-inteligência da Diretoria de Inteligência Policial – DIP (hoje, Delegado Regional de Combate ao Crime Organizado – DRCOR, em São Paulo). Elas estavam destinadas aos policiais federais presos sob a acusação de facilitar o contrabando e o descaminho na fronteira com o Paraguai. Os grampos, porém, segundo Dalmey, não chegaram a ser ativados.
Fica aqui nosso pedido de desculpas aos advogados, aos policiais envolvidos na estória e aos nossos leitores. E também a lição de que nem sempre podemos confiar no que é publicado.
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