Que redação teria peito para repudiar um editorial como fizeram os argentinos? Por Paulo Nogueira
Viralizou nas redes sociais uma foto em que jornalistas do diário argentino La Nación manifestam sua rejeição a um editorial.
Nele, os donos do jornal sustentam que é hora de perdoar, ou coisa parecida, os militares que cometeram atrocidades durante a ditadura.
A redação se incomodou. O repúdio se espalhou e disso resultou uma imagem épica, na qual os jornalistas aparecem com cartazes em que dizem o que pensam.
Nas redes sociais no Brasil, a pergunta que mais se fez foi esta: você consegue imaginar isso na Folha, no Globo ou em qualquer redação?
Claro que não.
Minha hipótese é que o similar brasileiro seria uma foto na qual os jornalistas diriam em cartazes: “Eu apoio o editorial!” (Com exclamação, provavelmente.)
Isso mostra quanto as redações brasileiras foram aparelhadas pelos donos e seus prepostos.
É uma lástima, uma vez que se perde o debate de ideias e visões que mesmo na ditadura militar vigorava nas redações. É destruído, também, um certo equilíbrio de forças do qual o beneficiário foi sempre o leitor.
A situação clássica no jornalismo, no Brasil e em qualquer parte, é mais ou menos a seguinte. Os donos são conservadores, por razões óbvias. E os jornalistas são progressistas, por motivos igualmente óbvios.
Internamente, os dois lados esgrimam em torno de seu pensamento. Uma síntese sai daí.
Alguns casos notáveis: a Folha nos anos 1970, quando teve no comando da redação o jornalista Claudio Abramo, de esquerda. Claudio negociava o espírito do jornal com Frias, de direita.
Durante muitos anos, a coexistência na Folha de duas mentalidades tão diferentes em posições-chave resultou num jornal interessante. A Veja no período Mino Carta-Civitas é outro bom exemplo.
Mas o que se viu nos últimos anos foi a virtual eliminação do progressismo nas redações.
Começou com os diretores – não mais Claudios, não mais Minos. E seguiu pelos escalões inferiores.
Os colunistas, hoje, repetem as opiniões dos donos. Todos falam, basicamente, as mesmas coisas. Você lê um e não precisa ler os outros.
E os repórteres publicam o mesmo tipo de vazamento, sempre contra aqueles dos quais seus patrões não gostam.
Há histórias icônicas. O diretor de mídias digitais da Globo, Erick Bretas, é mais Marinho que a família Marinho. Em sua conta no Facebook, ele convocou os seguidores a aderir às manifestações pelo golpe no auge delas. Bretas avisou que iria para a rua, e colocou como avatar no Facebook esta frase sepulcral: “Game Over”.
Acabou, numa tradução livre. Quer dizer, Bretas derrubou Dilma alguns meses atrás.
Este tipo de jornalista patronal ocupou as redações. São centenas de Bretas que diariamente produzem o conteúdo que chegará ao público da grande mídia.
É dentro desse quadro que se instalou o desequilíbrio que marca hoje jornais e revistas.
Já não há confronto de ideias. Vigora uma ideia única, a dos donos.
A foto da redação do La Nación mostra que na Argentina é outra a realidade – e muito mais arejada.
Existe algo de profundamente errado numa redação em que o repórter acha exatamente as mesmas coisas que o dono.
E é isso o que acontece nas redações brasileiras.
Nele, os donos do jornal sustentam que é hora de perdoar, ou coisa parecida, os militares que cometeram atrocidades durante a ditadura.
Nas redes sociais no Brasil, a pergunta que mais se fez foi esta: você consegue imaginar isso na Folha, no Globo ou em qualquer redação?
Claro que não.
Minha hipótese é que o similar brasileiro seria uma foto na qual os jornalistas diriam em cartazes: “Eu apoio o editorial!” (Com exclamação, provavelmente.)
Isso mostra quanto as redações brasileiras foram aparelhadas pelos donos e seus prepostos.
É uma lástima, uma vez que se perde o debate de ideias e visões que mesmo na ditadura militar vigorava nas redações. É destruído, também, um certo equilíbrio de forças do qual o beneficiário foi sempre o leitor.
A situação clássica no jornalismo, no Brasil e em qualquer parte, é mais ou menos a seguinte. Os donos são conservadores, por razões óbvias. E os jornalistas são progressistas, por motivos igualmente óbvios.
Internamente, os dois lados esgrimam em torno de seu pensamento. Uma síntese sai daí.
Alguns casos notáveis: a Folha nos anos 1970, quando teve no comando da redação o jornalista Claudio Abramo, de esquerda. Claudio negociava o espírito do jornal com Frias, de direita.
Durante muitos anos, a coexistência na Folha de duas mentalidades tão diferentes em posições-chave resultou num jornal interessante. A Veja no período Mino Carta-Civitas é outro bom exemplo.
Mas o que se viu nos últimos anos foi a virtual eliminação do progressismo nas redações.
Começou com os diretores – não mais Claudios, não mais Minos. E seguiu pelos escalões inferiores.
Os colunistas, hoje, repetem as opiniões dos donos. Todos falam, basicamente, as mesmas coisas. Você lê um e não precisa ler os outros.
E os repórteres publicam o mesmo tipo de vazamento, sempre contra aqueles dos quais seus patrões não gostam.
Há histórias icônicas. O diretor de mídias digitais da Globo, Erick Bretas, é mais Marinho que a família Marinho. Em sua conta no Facebook, ele convocou os seguidores a aderir às manifestações pelo golpe no auge delas. Bretas avisou que iria para a rua, e colocou como avatar no Facebook esta frase sepulcral: “Game Over”.
Acabou, numa tradução livre. Quer dizer, Bretas derrubou Dilma alguns meses atrás.
Este tipo de jornalista patronal ocupou as redações. São centenas de Bretas que diariamente produzem o conteúdo que chegará ao público da grande mídia.
É dentro desse quadro que se instalou o desequilíbrio que marca hoje jornais e revistas.
Já não há confronto de ideias. Vigora uma ideia única, a dos donos.
A foto da redação do La Nación mostra que na Argentina é outra a realidade – e muito mais arejada.
Existe algo de profundamente errado numa redação em que o repórter acha exatamente as mesmas coisas que o dono.
E é isso o que acontece nas redações brasileiras.
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