Uma tragédia histórica nas mãos de Cunha
Por Paulo Moreira Leite, em
seu blog:
Há um aspecto trágico na situação política brasileira. No momento em que escrevo estas linhas, o destino imediato de uma democracia conquistada com tantas dores e muitas dificuldades pode depender de um único fator. O interesse pessoal de Eduardo Cunha, deputado apanhado com R$ 23 milhões em contas secretas na Suíça, em abrir uma investigação contra Dilma Rousseff, presidente eleita com mais de 54 milhões de votos, contra a qual não se aponta o mais leve desvio de conduta.
Em função do caráter presidencialista da Câmara de Deputados, Cunha tem a prerrogativa de dar início – ou não – ao processo de impeachment. Caso resolva disparar o gatilho, como gesto à beira do abismo, cujo sacrifício inevitável se mostra cada vez mais próximo, no dia seguinte a oposição esquecerá as envergonhadas manifestações de constrangimento a respeito das denúncias contra Cunha.
Estará na rua para mobilizar seus eleitores para avançar sobre deputados e senadores para pedir a cabeça de Dilma – ou aguardar pelo troco nas próximas eleições.
O quórum qualificado de 2/3 é sempre uma garantia nessas situações. Verdade que, ao contrário do que ocorria com Fernando Collor, nada pode ser apontado contra Dilma. Convém recordar, contudo, que os humores de quem depende da simpatia do eleitor se tornam volúveis em situações de tumulto político. Traições podem transformar-se em fenômeno de massa, até porque são estimuladas pelos meios de comunicação, desde já empenhados em fazer o próprio povo vender a alma para o diabo e esquecer as regras elementares da democracia.
As contas suíças de Cunha deveriam ser um impeditivo a seus movimentos, especialmente os mais temerários do ponto de vista institucional. Severino Cavalcanti renunciou à presidência da Câmara, em 2005, uma semana depois que se comprovou que recebia suborno do dono de um quilo no Congresso, interessado em renovar contratos na casa. O cheque era de R$ 10.000. Em valores de hoje, os depósitos de Cunha na Suíça reúnem uma quantia 23.000 vezes maior.
Não estamos e nunca estivemos falando de ética, aprendemos mais uma vez.
Severino Cavalcanti foi derrubado porque, eleito como adversário, tornara-se um aliado do governo Lula.
Cunha sobrevive porque seu prêmio é muito maior: um PIB superior a US$ 2 trilhões e uma influência que se projeta por todo Hemisfério Sul. Pode entregar aquilo que Severino jamais seria capaz.
Do ponto de vista dos adversários do PT, de Lula e de Dilma, Cunha pode prestar um serviço único e, no momento, insubstituível. Eles acreditam que o presidente da Câmara é um político tão leviano e inconsequente que seria capaz de um gesto irracional, semelhante aos instintos de um assassino bestializado, capaz de cometer crimes em série porque está convencido de que não tem mais nada a perder.
Essa é a tragédia do momento.
Há um aspecto trágico na situação política brasileira. No momento em que escrevo estas linhas, o destino imediato de uma democracia conquistada com tantas dores e muitas dificuldades pode depender de um único fator. O interesse pessoal de Eduardo Cunha, deputado apanhado com R$ 23 milhões em contas secretas na Suíça, em abrir uma investigação contra Dilma Rousseff, presidente eleita com mais de 54 milhões de votos, contra a qual não se aponta o mais leve desvio de conduta.
Em função do caráter presidencialista da Câmara de Deputados, Cunha tem a prerrogativa de dar início – ou não – ao processo de impeachment. Caso resolva disparar o gatilho, como gesto à beira do abismo, cujo sacrifício inevitável se mostra cada vez mais próximo, no dia seguinte a oposição esquecerá as envergonhadas manifestações de constrangimento a respeito das denúncias contra Cunha.
Estará na rua para mobilizar seus eleitores para avançar sobre deputados e senadores para pedir a cabeça de Dilma – ou aguardar pelo troco nas próximas eleições.
O quórum qualificado de 2/3 é sempre uma garantia nessas situações. Verdade que, ao contrário do que ocorria com Fernando Collor, nada pode ser apontado contra Dilma. Convém recordar, contudo, que os humores de quem depende da simpatia do eleitor se tornam volúveis em situações de tumulto político. Traições podem transformar-se em fenômeno de massa, até porque são estimuladas pelos meios de comunicação, desde já empenhados em fazer o próprio povo vender a alma para o diabo e esquecer as regras elementares da democracia.
As contas suíças de Cunha deveriam ser um impeditivo a seus movimentos, especialmente os mais temerários do ponto de vista institucional. Severino Cavalcanti renunciou à presidência da Câmara, em 2005, uma semana depois que se comprovou que recebia suborno do dono de um quilo no Congresso, interessado em renovar contratos na casa. O cheque era de R$ 10.000. Em valores de hoje, os depósitos de Cunha na Suíça reúnem uma quantia 23.000 vezes maior.
Não estamos e nunca estivemos falando de ética, aprendemos mais uma vez.
Severino Cavalcanti foi derrubado porque, eleito como adversário, tornara-se um aliado do governo Lula.
Cunha sobrevive porque seu prêmio é muito maior: um PIB superior a US$ 2 trilhões e uma influência que se projeta por todo Hemisfério Sul. Pode entregar aquilo que Severino jamais seria capaz.
Do ponto de vista dos adversários do PT, de Lula e de Dilma, Cunha pode prestar um serviço único e, no momento, insubstituível. Eles acreditam que o presidente da Câmara é um político tão leviano e inconsequente que seria capaz de um gesto irracional, semelhante aos instintos de um assassino bestializado, capaz de cometer crimes em série porque está convencido de que não tem mais nada a perder.
Essa é a tragédia do momento.
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