sábado, 21 de maio de 2016

POLÍTICA - Brasil terá que fazer uma escolha: combater a pobreza ou manter privilégios.

Da ONU-BR
Gastos do governo com assistência social aos mais pobres são menores que um terço das despesas com previdência para brasileiros em melhor situação. Benefícios previdenciários ultrapassam também gastos primários com saúde e educação.
Banco Mundial destaca que a atual crise revelou necessidade de enfrentar problemas estruturais da economia, como a baixa produtividade.
Programas de redução da pobreza foram impulsionados por alta das commodities na última década. Foto: WikiCommons / Flickr / Maria Hsu
Em relatório publicado na segunda-feira (16), o Banco Mundial alerta que a desvalorização das commodities no mercado mundial desde 2011 e a resposta pouco eficiente do governo brasileiro para contornar a queda dos lucros das exportações estão entre as causas da recessão enfrentada pelo Brasil desde 2015.
A crise, porém, não precisa significar o abandono das políticas de redução da pobreza que retiraram 24,6 milhões de brasileiros da miséria de 2001 a 2013, mesmo porque os programas de transferência de renda custam relativamente pouco e são comprovadamente eficazes, segundo o Diagnóstico Sistemático de País para o Brasil — documento elaborado pelo organismo internacional.
Em 2014, iniciativas de assistência social direta aos pobres representaram 7,7% dos gastos primários do governo brasileiro. Consideradas as despesas com saúde básica, pré-escola e ensino fundamental, o valor sobe para 16,4%.
O percentual, no entanto, continua bem abaixo do montante de benefícios previdenciários concedidos aos não pobres (28,9%) — recursos que movimentam um sistema de gastos rígidos e considerado “explosivo” pelo Banco Mundial. A proporção do orçamento público dedicada à previdência ultrapassa as fatias dedicadas a educação, saúde e ensino superior somadas (28,6%).
Para o organismo financeiro, o momento atual exige reformas capazes de renovar o ciclo de combate à pobreza e solucionar problemas estruturais da economia brasileira, como a baixa produtividade e o gargalo da infraestrutura — mascarados pela alta global das matérias-primas na última década.

Alta das commodities impulsionou renda, emprego e assistência

De acordo com o Banco Mundial, o período entre 2003 e 2013 foi marcado por uma valorização mundial dos preços de commodities como a soja e o minério de ferro — o que permitiu ao Brasil investir em assistência social, aumentar o nível de emprego e os salários.
As conquistas do país na luta contra a miséria representam quase 50% da redução da pobreza em toda a região da América Latina e Caribe.
Dados do Banco Mundial indicam que, de 2004 a 2013, a geração de empregos e a redução da informalidade foram os principais responsáveis pelo declínio da pobreza — condição de quem vive com 140 reais por mês.
No entanto, quando considerada a queda de 62% da pobreza extrema — 70 reais mensais per capita — para o mesmo período, o relatório destaca que esta teria sido provocada por rendimentos não salariais, principalmente por programas de transferência de renda como o Bolsa Família.
Desvalorização das commodities no mercado global teve impactos sobre os lucros do Brasil com exportações, alerta Banco Mundial em novo relatório. Foto: Imprensa / GEPRhttps://i1.wp.com/nacoesunidas.org/wp-content/uploads/2016/01/cont03.jpg... 300w, https://i1.wp.com/nacoesunidas.org/wp-content/uploads/2016/01/cont03.jpg... 768w, https://i1.wp.com/nacoesunidas.org/wp-content/uploads/2016/01/cont03.jpg... 624w" style="border: 0px; vertical-align: baseline; height: 467px; border-radius: 0px; width: 700px;"> Desvalorização das commodities no mercado global teve impactos sobre os lucros do Brasil com exportações, alerta Banco Mundial em novo relatório. Foto: Imprensa / GEPR
Apesar dos avanços, entre 2003 e 2014, enquanto os salários mínimo e real cresceram em média 68% e 38%, respectivamente, a produtividade por trabalhador aumentou apenas 21%.
Para o Banco Mundial, a baixa produtividade do Brasil — ainda não superada — se configura como um dos principais entraves ao crescimento econômico no período pós-2013, quando as matérias-primas passaram a registrar forte desvalorização no mercado mundial.
Para tentar contornar a depreciação, o governo apostou em subsídios a alguns setores da economia, incentivos fiscais, controle de preços e crédito adicional oferecido pelos bancos estatais.
Mas a estratégia, além de pouco eficiente para estimular o crescimento, contribuiu para gerar um clima de incerteza que desestimulou investimentos e aumentou o déficit nas contas públicas. Como resultado desse processo e de uma economia externa em baixa, a queda na atividade econômica brasileira fez o PIB do país contrair 3,8% em 2015.

‘Ajuste fiscal e progresso social não são contraditórios’

O Banco Mundial aponta que, somente em 2016, o Brasil constatou a necessidade de um doloroso ajuste macroeconômico e fiscal que, no entanto, ainda não chegou a resolver os conflitos distributivos entre gastos com combate à pobreza e despesas previdenciárias com os não pobres. 
O organismo alerta para transferências a empresas — inclusive renúncias e transferências fiscais implícitas por intermédio dos bancos estaduais e por meio de isenções fiscais pouco transparentes e eficientes — que ultrapassaram 5% do Produto Interno Bruto (PIB) ou quase 14% dos gastos primários.
Caso esses benefícios fossem reduzidos, mais recursos seriam liberados para melhorar os serviços públicos e as políticas voltadas à população desfavorecida. A gestão mais eficiente de recursos públicos e investimentos em saúde, educação e moradia poderiam avançar o combate à pobreza.
“Brasil enfrenta o dilema de solucionar as injustiças nos gastos públicos, reduzindo as transferências para aqueles em melhor situação, ou contemplar a necessidade de desativar programas sociais e reverter algumas das conquistas da década de ouro”, aponta relatório.
Em março, um estudo das Nações Unidas já havia chamado atenção para injustiças fiscais no Brasil que beneficiavam com isenção os chamados super-ricos.
Para o Banco Mundial, a crise trouxe à tona também outros desafios já existentes, como os baixos produtividade e dinamismo associados ao “estado de abandono da infraestrutura física do país e à limitação da concorrência resultante de regulamentações domésticas”.
De 2000 a 2013, apenas a agricultura apresentou aumento expressivo na sua produtividade (105,6%), ao passo que a indústria registrou queda (-5,5%) e serviços verificaram uma taxa quase constante. Curiosamente, o setor industrial registrou o maior aumento de vagas de trabalho — o que sugere que a maior parte dos postos não têm um rendimento tão alto quanto poderiam.
O organismo internacional destaca ainda os fracos incentivos à inovação, inclusive à adaptação de tecnologias, devido a uma série de intervenções governamentais ineficientes.
A superação dessas obstáculos exigirá o aprimoramento de formas de gestão e a capacitação da mão de obra que poderia utilizar novas tecnologias nas cadeias produtivas, tornando-as mais dinâmicas e competitivas.
Mesmo com o aumento dos investimentos públicos em Pesquisa & Desenvolvimento, iniciativas ainda não se traduziram em transformações significativas da produção do Brasil, ainda uma país de tecnologia média.

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