Por Altamiro Borges
Até recentemente, o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF),
Joaquim Barbosa, era o herói dos "midiotas". Os manifestantes que saíram
às ruas para rosnar contra Lula, Dilma e as esquerdas chegaram a
cogitar o seu nome para presidente da República. Idolatrado pela
imprensa golpista, ele foi capa de inúmeras edições da Veja - inclusive
com o famoso título de "O menino pobre que mudou o Brasil". Por vários
meses, durante o julgamento do chamado "mensalão petista", o ex-ministro
foi manchete dos jornalões e motivo de excitação dos "calunistas" da
tevê. Nas últimas semanas, porém, Joaquim Barbosa desnorteou os
"midiotas", os que seguem acriticamente a mídia manipuladora.
Logo após a confirmação do
afastamento de Dilma pelo tribunal de exceção do Senado e a posse do
usurpador Michel Temer, nesta quarta-feira (31), ele disparou nas redes
sociais. "Eu não acompanhei nada desse patético espetáculo que foi o
'impeachment Tabajara' de Dilma Rousseff. Não quis perder tempo", postou
no Twitter. E completou: "Mais patética ainda foi a primeira entrevista
do novo presidente do Brasil, Michel Temer". "Explico: O homem parece
acreditar piamente que terá o respeito e a estima dos brasileiros pelo
fato de agora ser presidente. Engana-se", postou.
Em inglês, o ex-presidente do STF também criticou o Congresso Nacional e
comparou o Judas Michel Temer aos velhos "caudilhos" da América Latina.
´"É tão embaraçoso. De repente, as forças altamente conservadoras
tomaram o Brasil. Tomaram tudo". E ainda fustigou a mídia, afirmando que
ela conduz os processos políticos, "inclusive os canais de TV". Para
ele, a resposta da sociedade é uma questão de tempo: "Eles não têm
votos! Espere por dois anos", postou, em referência à eleição
presidencial de 2018. Já em francês, Joaquim Barbosa disse que o
usurpador pensa que "um golpe de varinha jurídica" é o suficiente para
legitimá-lo. "Que pobreza!".
"Não somos um bando de boçais"
Esta não é a primeira vez que o ex-ministro desnorteia os
"midiotas". Em maio passado, durante um evento do setor do comércio
eletrônico, em São Paulo, ele fustigou a condução do processo contra
Dilma. Para surpresa dos "coxinhas" presentes, Joaquim Barbosa
argumentou que o impeachment "é destituído de legitimidade profunda",
sem qualquer consulta ao povo, lembrando os períodos mais autoritários
da história brasileira, como na ditadura militar. "Não somos um bando de
boçais que pode ser conduzido com essa sem-cerimônia", afirmou. Na
ocasião, ele defendeu a convocação de eleições diretas para superar o
impasse político no país. "Sou radicalmente favorável à convocação de
novas eleições. Essa é a verdadeira solução, que acaba com essa anomalia
do impeachment".
Joaquim Barbosa também foi duro nas críticas ao interino. "É muito grave
tirar a presidente do cargo e colocar em seu lugar alguém que é seu
adversário oculto ou ostensivo, alguém que sequer um dia teria o sonho
de disputar uma eleição para presidente. Anotem: o Brasil terá de
conviver por mais dois anos com essa anomalia". E ainda atacou o PSDB.
"É um grupo que, em 2018, completará 20 anos sem ganhar uma eleição".
Contra os prognósticos otimistas na economia da mídia chapa-branca, o
ex-presidente do STF alertou: "Quem vai ter confiança e investir num
país que destitui um presidente da República com tanta facilidade e
afoiteza?".
Tanto agora como em maio, as ácidas opiniões de Joaquim Barbosa não
tiveram maior repercussão na imprensa. Diferente de outros momentos, ele
não foi manchete dos jornalões nem capa da "Veja". Os "calunistas" da
Globo também preferiram esconder seu ex-herói. Talvez temerosos com uma
possível crise depressiva dos seus "midiotas". Alguns mais fanáticos até
foram às redes sociais acusar o ex-ministro de "petralha", "chavista",
"comunista" - num caso típico de internação. De fato, ninguém entendeu a
recente conversão do ex-ministro, de inspirador do golpismo à critico
do impeachment e do usurpador Michel Temer. Paulo Nogueira, do
imperdível blog Diário do Centro do Mundo, até testou algumas hipóteses para explicar o fenômeno. Vale conferir:
*****
O que está passando pela cabeça de Joaquim Barbosa ao chamar o golpe de "impeachment Tabajara"
A melhor definição do golpe veio de alguém absolutamente improvável: Joaquim Barbosa.
Golpe Tabajara.
Barbosa disse isso, e muitas outras coisas, no Twitter. E suas
considerações viralizaram. Centenas, às vezes milhares de retuítes.
Ele tocou em pontos chaves do golpe Tabajara. Não só em português, mas em inglês e francês.
Tocou no papel da mídia como desestabilizadora do governo Dilma.
Traçou um retrato devastador — e real em cada letra - de Temer, “um
homem conservador, ultrapassado, desconectado do país”, alguém que é
comparável à velha figura dos “caudilhos”.
Afirmou a impotência do STF. “Em matéria de impeachment, o STF pode fazer pouquíssimo. E fez pouquíssimo.”
Barbosa descreveu como poucos o golpe. Mas o mais extraordinário não é isto, e aí entramos no terreno da psiquiatria.
É como se ele simplesmente ignorasse seu papel na construção do
golpe. Sem o Mensalão, e sem Barbosa especificamente, o impeachment de
2016 não teria ocorrido.
As mesmas forças conservadoras das quais Barbosa fala agora já
haviam se agrupado então. Barbosa foi o Moro de então, o grande
acusador, o impiedoso perseguidor das forças progressistas.
Como Moro, se tornou um ídolo da classe média manipulada pela
imprensa que, anos depois, tomaria as ruas do país para pedir o
impeachment de verde-amarelo.
Por falar tudo que a plutocracia queria que fosse dito, Barbosa
foi capa de revistas, apareceu interminavelmente em telejornais, dominou
as manchetes dos diários por um longo tempo.
Virou até máscara de carnaval.
O que ocorreu com ele? Como uma transformação tão vertiginosa?
Essa é uma das perguntas mais fascinantes destes nossos tempos.
Ele estaria arrependido? É possível. Mas esta hipótese não se
sustenta sem que Barbosa peça claramente desculpas pelo mal que causou à
democracia.
Tem planos políticos? Também é possível. Mas com sua
interpretação do golpe Tabajara ele jamais ganhará um voto do público
que o amava. Nas redes sociais você vê as mesmas pessoas que o veneravam
atirar-lhe pedras agora.
Jamais a mídia lhe dará espaço para falar as coisas que vem falando.
A única coisa concreta é que ele está certo, absolutamente certo nas coisas que disse.
Apenas se esqueceu de dizer o quanto foi importante na construção do golpe Tabajara.
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