Enquanto vocês reclamam do Fla-Flu, o Milicos do Senhor F.C. corre por fora
"Infelizmente, porém, o conservadorismo se imiscuiu em ambos os partidos: no PSDB e também no PT. O PT
tem demonstrado medo de lutar pelo que sempre pregou e volta e meia
cede aos conservadores no Congresso, em nome da tal governabilidade",
escreve Cynara Menezes, jornalista, em artigo publicado pelo Carta Capital.
Eis o artigo.
Em 2010, os eleitores do PT e do PSDB tiveram que escolher entre um partido de centro-esquerda acovardado, que fez um acordo com evangélicos para não perder a eleição, e um partido de centro que se entregou ao conservadorismo para tentar ganhá-la. Em sua obsessão pelo Planalto, o tucano José Serra não se envergonhou de beijar imagens religiosas e de dar espaço a um discurso medieval anti-aborto que faria corar dona Ruth Cardoso, a falecida esposa de FHC. A petista Dilma Rousseff, sabidamente católica não-praticante (senão atéia), foi a uma missa na catedral de Nossa Senhora Aparecida e posou ao lado de futuros inimigos como o pastor Marco Feliciano, além de voltar atrás em sua posição pró-legalização do aborto como questão de saúde pública.
Quatro anos se passaram e vem aí uma nova eleição presidencial. Neste meio tempo, a direita se assanhou ainda mais. O pastor Feliciano, acusado de racismo e homofobia, chegou a ocupar, cúmulo da contradição, a presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, onde a única coisa que fez foi perseguir os direitos humanos dos gays. Na TV, a apresentadora Rachel Sheherazade se tornou a representante-mor dos que hierarquizam seres humanos ao defender justiçamentos em praça pública. Revistas e jornais trouxeram para suas páginas comentaristas situados pateticamente à direita dos próprios donos dos veículos.
Nada deste conservadorismo está no DNA do PT –nem, para ser honesta, no do PSDB. O PSDB, arrancado da costela do PMDB por políticos que se diziam à sua “esquerda”, nunca havia enveredado por este caminho moralista até 2010. Em 1985, Fernando Henrique perdeu uma eleição para prefeito de São Paulo por assumir ter experimentado maconha e dizer que não acreditava em Deus – FHC, aliás, é um dos atuais arautos mundiais da descriminação da maconha. É certo que hoje o partido possui membros ligados às alas mais conservadoras da igreja Católica, como o atual governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, sobre quem se diz ser membro da Opus Dei. Ele nega. Mas conservador em termos morais o PSDB nunca foi. Muito menos o PT.
Infelizmente, porém, o conservadorismo se imiscuiu em ambos os partidos: no PSDB e também no PT. O PT tem demonstrado medo de lutar pelo que sempre pregou e volta e meia cede aos conservadores no Congresso, em nome da tal governabilidade. E o PSDB de Franco Montoro e Mario Covas não se envergonha de ter hoje, em suas fileiras, um nome como o deputado goiano João Campos, autor do abjeto projeto da “cura gay”. Repare que eles estão sempre juntos: os homofóbicos, os intolerantes, os favoráveis à redução da maioridade penal, os que querem que o Brasil nem sequer discuta questões como a legalização do aborto e das drogas, como acontece em inúmeros países ditos civilizados. São os mesmos que dizem que não são racistas porque “não existe racismo”, mas… Ups, ato falho.
Vejo muita gente criticando o Fla-Flu da política brasileira atual, como se fosse este O problema. Discordo. Acho natural que os gostos, as preferências eleitorais, se inclinem por um ou outro lado. Quem vota no PT acha que o PSDB governa para os ricos e é corrupto. Quem vota no PSDB acha que o PT aparelha o Estado… e é corrupto. Então, é uma questão de se sentir representado ou não por um dos dois partidos, assim como por qualquer outro. O preocupante para mim é outra coisa: em vários lugares do mundo, a direita propriamente dita –esta direita feroz, que no Brasil se caracteriza principalmente por ser carola– caminha por conta própria, em partidos próprios. Não são parasitas como a direita brasileira, que se encostou no PT ou no PSDB para existir.
Vou chamá-los de “Milicos do Senhor Futebol Clube”, uma zebra verde-oliva doida para ganhar o campeonato. Ao mesmo tempo que são carolas, ratos de igreja que invocam o nome de Deus para perpetrar barbaridades, também são saudosos da ditadura militar. Adorariam que o Brasil chegasse a uma situação extrema para que houvesse uma intervenção no modelo “golpe constitucional” que vem surgindo na América Latina ultimamente, a partir do que houve em Honduras, em 2009, seguido pelo Paraguai, em 2012, e que pode estar prestes a ocorrer na Venezuela. Gente que se especializou em usar a defesa da “liberdade de expressão” como escudo na hora de defender ideias autoritárias, intolerantes, preconceituosas, arcaicas.
Enquanto as pessoas reclamam do Fla-Flu, o Milicos do Senhor corre por fora, sempre parasitando o PT e o PSDB, os dois partidos com mais chance de chegar ao Planalto. São tão desprezíveis que não possuem nem mesmo a coragem de colocar a cabeça para fora e se reunir num partido político. O PT e o PSDB são hospedeiros e cúmplices do crescimento destes vermes, e nem mesmo levam em conta que não é isso que seus eleitores querem. Tenho certeza que todos os eleitores petistas e a enorme maioria dos eleitores tucanos não concordam com as teses reacionárias da nova direita que está surgindo no Brasil. Não são homofóbicos, não são intolerantes, não são a favor de que direitos humanos sejam só para “humanos direitos”.
A nova direita deve se assumir e lançar um partido próprio, sair do armário. E o PT e o PSDB devem a seus eleitores a ruptura da aliança com o conservadorismo como meio de ganhar eleição. Mesmo com os dois turnos, é possível alijá-los da disputa –basta querer. Os Milicos do Senhor que cresçam sozinhos, se forem capazes. De minha parte, não vou participar da gestação do ovo da serpente.
Eis o artigo.
Em 2010, os eleitores do PT e do PSDB tiveram que escolher entre um partido de centro-esquerda acovardado, que fez um acordo com evangélicos para não perder a eleição, e um partido de centro que se entregou ao conservadorismo para tentar ganhá-la. Em sua obsessão pelo Planalto, o tucano José Serra não se envergonhou de beijar imagens religiosas e de dar espaço a um discurso medieval anti-aborto que faria corar dona Ruth Cardoso, a falecida esposa de FHC. A petista Dilma Rousseff, sabidamente católica não-praticante (senão atéia), foi a uma missa na catedral de Nossa Senhora Aparecida e posou ao lado de futuros inimigos como o pastor Marco Feliciano, além de voltar atrás em sua posição pró-legalização do aborto como questão de saúde pública.
Quatro anos se passaram e vem aí uma nova eleição presidencial. Neste meio tempo, a direita se assanhou ainda mais. O pastor Feliciano, acusado de racismo e homofobia, chegou a ocupar, cúmulo da contradição, a presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, onde a única coisa que fez foi perseguir os direitos humanos dos gays. Na TV, a apresentadora Rachel Sheherazade se tornou a representante-mor dos que hierarquizam seres humanos ao defender justiçamentos em praça pública. Revistas e jornais trouxeram para suas páginas comentaristas situados pateticamente à direita dos próprios donos dos veículos.
Nada deste conservadorismo está no DNA do PT –nem, para ser honesta, no do PSDB. O PSDB, arrancado da costela do PMDB por políticos que se diziam à sua “esquerda”, nunca havia enveredado por este caminho moralista até 2010. Em 1985, Fernando Henrique perdeu uma eleição para prefeito de São Paulo por assumir ter experimentado maconha e dizer que não acreditava em Deus – FHC, aliás, é um dos atuais arautos mundiais da descriminação da maconha. É certo que hoje o partido possui membros ligados às alas mais conservadoras da igreja Católica, como o atual governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, sobre quem se diz ser membro da Opus Dei. Ele nega. Mas conservador em termos morais o PSDB nunca foi. Muito menos o PT.
Infelizmente, porém, o conservadorismo se imiscuiu em ambos os partidos: no PSDB e também no PT. O PT tem demonstrado medo de lutar pelo que sempre pregou e volta e meia cede aos conservadores no Congresso, em nome da tal governabilidade. E o PSDB de Franco Montoro e Mario Covas não se envergonha de ter hoje, em suas fileiras, um nome como o deputado goiano João Campos, autor do abjeto projeto da “cura gay”. Repare que eles estão sempre juntos: os homofóbicos, os intolerantes, os favoráveis à redução da maioridade penal, os que querem que o Brasil nem sequer discuta questões como a legalização do aborto e das drogas, como acontece em inúmeros países ditos civilizados. São os mesmos que dizem que não são racistas porque “não existe racismo”, mas… Ups, ato falho.
Vejo muita gente criticando o Fla-Flu da política brasileira atual, como se fosse este O problema. Discordo. Acho natural que os gostos, as preferências eleitorais, se inclinem por um ou outro lado. Quem vota no PT acha que o PSDB governa para os ricos e é corrupto. Quem vota no PSDB acha que o PT aparelha o Estado… e é corrupto. Então, é uma questão de se sentir representado ou não por um dos dois partidos, assim como por qualquer outro. O preocupante para mim é outra coisa: em vários lugares do mundo, a direita propriamente dita –esta direita feroz, que no Brasil se caracteriza principalmente por ser carola– caminha por conta própria, em partidos próprios. Não são parasitas como a direita brasileira, que se encostou no PT ou no PSDB para existir.
Vou chamá-los de “Milicos do Senhor Futebol Clube”, uma zebra verde-oliva doida para ganhar o campeonato. Ao mesmo tempo que são carolas, ratos de igreja que invocam o nome de Deus para perpetrar barbaridades, também são saudosos da ditadura militar. Adorariam que o Brasil chegasse a uma situação extrema para que houvesse uma intervenção no modelo “golpe constitucional” que vem surgindo na América Latina ultimamente, a partir do que houve em Honduras, em 2009, seguido pelo Paraguai, em 2012, e que pode estar prestes a ocorrer na Venezuela. Gente que se especializou em usar a defesa da “liberdade de expressão” como escudo na hora de defender ideias autoritárias, intolerantes, preconceituosas, arcaicas.
Enquanto as pessoas reclamam do Fla-Flu, o Milicos do Senhor corre por fora, sempre parasitando o PT e o PSDB, os dois partidos com mais chance de chegar ao Planalto. São tão desprezíveis que não possuem nem mesmo a coragem de colocar a cabeça para fora e se reunir num partido político. O PT e o PSDB são hospedeiros e cúmplices do crescimento destes vermes, e nem mesmo levam em conta que não é isso que seus eleitores querem. Tenho certeza que todos os eleitores petistas e a enorme maioria dos eleitores tucanos não concordam com as teses reacionárias da nova direita que está surgindo no Brasil. Não são homofóbicos, não são intolerantes, não são a favor de que direitos humanos sejam só para “humanos direitos”.
A nova direita deve se assumir e lançar um partido próprio, sair do armário. E o PT e o PSDB devem a seus eleitores a ruptura da aliança com o conservadorismo como meio de ganhar eleição. Mesmo com os dois turnos, é possível alijá-los da disputa –basta querer. Os Milicos do Senhor que cresçam sozinhos, se forem capazes. De minha parte, não vou participar da gestação do ovo da serpente.
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