No momento em que a mídia golpista continua demonizando o Chaves e inventando historinhas para minimizar o resultado do referendo, é bom ouvir o que pensa um importante membro da oposição ao chavismo, que inclusive teve a coragem de mencionar o golpe patrocinado pela CIA em 2002. Ele cita o Pedro Carmona que foi empossado pelos golpistas, golpe esse que durou apenas 72 horas.
Carlos Dória
Juan Francisco Alonso
De Caracas, Venezuela
Com a sua característica fala mordaz e irônica, a qual durante anos empunhou no Parlamento venezuelano, o secretário geral da Ação Democrática, Henry Ramos Allup, fez um balanço, bem menos otimista que o dos seus colegas opositores, sobre os resultados do referendo de 15 de fevereiro, consulta na qual a maioria dos venezuelanos aprovou a modificação da Constituição que permitirá ao Presidente Hugo Chávez e aos demais ocupantes de cargos eletivos candidataram-se à reeleição quantas vezes quiserem.
No seu escritório do chamado bunker de La Florida, sede que em outras épocas foi símbolo do poderio de um grupo que chegou a colocar sete presidentes no Palácio de Miraflores, o mais alto representante do Partido Blanco recebe Terra Magazine para uma entrevista, na qual não apenas admitiu a derrota para o chavismo, como também não duvidou em qualificar como "uma surra" a vitória do oficialismo.
Terra Magazine - Qual avaliação o Senhor faz dos resultados do recente referendo?
Os resultados foram amplamente favoráveis ao governo. Se compararmos com as eleições para governadores realizadas há três meses ou com o referendo da reforma constitucional de um ano atrás, veremos que o governo saiu favorecido. O insólito é que, tratando-se da mesma proposta inconstitucional, e agora ainda mais personalizada, o governo tenha conseguido recuperar 10 pontos em apenas um ano. Isto deve fazer a oposição pensar. A explicação está, em minha opinião, no fato de que a mensagem do governo foi mais convincente que a da oposição.
A oposição alega que o motivo da derrota foi a máquina, ou seja, o uso dos recursos do Estado para a campanha do "Sim" ou dos meios de comunicação públicos, por exemplo.
Atribuir os resultados simplesmente ao abuso do governo me parece um erro. O abuso do governo e a parcialidade das instituições sempre existiram, existem e existirão, mas declarar que essa foi a causa dos resultados adversos seria ignorar que com este mesmo quadro de abuso ganhamos outros processos eleitorais (o processo de ativação do referendo revogatório presidencial de 2004, o referendo constitucional de 2007 ou os governos departamentais e municipais conquistados em novembro).
A oposição admitiu a derrota, mas destaca o crescimento de mais de um milhão de votos. Porém, você fala de uma surra. Não compartilha da análise do "copo meio cheio ou meio vazio" feito pelos seus colegas de outros partidos contrários ao Presidente?
Não concordo com isso, porque derrota é derrota. Até porque não foi uma simples derrota, foi uma grande derrota e sobre um assunto muito importante que em termos de projeto ideológico e futuro imediato é terrível para a Venezuela. Conquistamos mais votos, mas foi porque aumentou o número de eleitores, mas em percentual não crescemos, pelo contrário, diminuímos. Se compararmos o percentual de votos que obtivemos nas eleições regionais e agora, perceberemos que decrescemos.
O que deu errado para que o país aprovasse a reeleição indeterminada, quando um ano antes a recusou?
Várias cosas: A oposição errou na mensagem. Para alguns setores da oposição tornou-se prejudicial o confronto direto com Chávez, pois desta forma não haverá como conquistar os chavistas light, como se ele votassem a nosso favor só pelo fato de dizermos que o Presidente é uma boa pessoa. Esse discurso um tanto ambivalente e um tanto assexuado politicamente nos causou muitos estragos, porque enquanto o Presidente tem uma mensagem direta, precisa e até agônica (vida ou morte) nós percorremos caminhos indiretos e estamos convencidos de que podemos convencer pessoas diferenciando sujeito de predicado.
Mas o enfrentamento com Chávez mostrou que não dá resultado.
Quando?
Durante os primeiros anos deste governo.
Nos primeiros anos, quando enfrentamos Chávez, ele perdeu força, mas cometemos erros e o transformamos em vítima. A greve (de dezembro/2002 a fevereiro/2003) e o golpe do imbecil Pedro Carmona (abril/2002) fizeram com que Chávez subisse nas pesquisas.
Dizem que a oposição não cresce porque não oferece nenhuma proposta alternativa e porque não existe nenhum líder que possa fazer frente ao Presidente. Qual a sua opinião a respeito?
Os países civilizados não necessitam de líderes. Os países civilizados a cada 5, 6 ou 7 anos, trocam seus líderes e continuam funcionando, melhor ou pior. Os países atrasados são os que se prendem a um capataz. O que precisamos fazer é construir uma proposta e não andar à procura de um Chávez do nosso lado. Um Chávez do nosso lado não existe nem existirá, porque enquanto o chavismo é uma espécie de quartel político, a oposição é diversa, heterogênea e multicolorida. Devemos apresentar uma proposta comum como fizeram os chilenos. Claro que os chilenos levaram 20 anos para fazer isto porém espero que nós sejamos mais rápidos.
Se algo ficou evidente nos últimos dois processos é que o chavismo continua sendo maioria na Venezuela. Porém, alguns acreditam que a crise econômica poderá apunhalá-lo. Qual a sua opinião?
O governo e o Presidente continuarão girando na órbita do seu próprio projeto. Ninguém conseguirá dissuadi-lo a se afastar desse projeto hegemônico, antagônico, militarista, autoritário e absolutamente lesivo para a economia. É um projeto que não existe em nenhuma parte do mundo, talvez na pobre Cuba de onde não é possível sair e na Coréia do Norte. A China foi devolvida na própria China e já não existe o comunismo como Chávez o imagina. Para nós a situação da Venezuela é grave e comprometida no que se refere à economia e ao futuro imediato, o que não significa que a crise vai acabar com Chávez. Talvez não o atinja como aconteceu com Robert Mugabe. As crises podem ou não afetar os governos, mas certamente afetam a população.
As quedas nos preços do petróleo não necessariamente têm que colocar em risco a manutenção da revolução bolivariana?
Pode ser que abalem a revolução ou não. Temos o exemplo de Mugabe no Zimbabwe, que está há 27 anos no poder e que não foi abalado por nenhuma crise, as crises que afetam mesmo são os pobres habitantes de Zimbabwe.
Fonte:Terra Magazine.
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