De vez em quando, ultimamente, fico até com receio de perder meu tempo escrevendo. O mundo já poderá ter acabado quando este texto chegar aos caros leitores. Quem vai ler?
Sem falar na sempre iminente guerra nuclear das Coreias, o fim do mundo está onipresente no noticiário nacional, como se houvessem estabelecido uma programação prévia para não deixar o brasileiro respirar sossegado dois dias seguidos.
Mal se termina de falar de uma crise e já aparece outra nas manchetes, sem que tenha dado tempo da anterior terminar.
O ano mal começou, e já tivemos de volta as notícias alarmistas sobre os iminentes riscos de apagão de energia em razão da falta de chuvas nos reservatórios, ao mesmo tempo em que as enchentes em outros pontos do país provocavam novas tragédias. Imagens de reservatórios com pouca água e morros despencando eram acompanhadas de análises dos "especialistas" de sempre para quem o país, com este governo, não tem nenhum futuro, seja por falta ou excesso de chuvas.
Nós brasileiros nem tivemos tempo de comemorar o recorde da safra de grãos, e já começaram as séries de reportagens sobre o colapso na infraestrutura, com estradas intransitáveis e congestionamentos nos portos.
E assim fomos seguindo o ano de 2013, de agonia em agonia, até que sobreveio a grande crise do preço do tomate, a maior de todas, porque esta pode explodir ao mesmo tempo a inflação e os juros, levando o País à ruína completa. Em apenas três meses, ficamos novamente à beira do abismo.
Esses problemas todos existem, é claro, e alguns são bastante sérios, como já mostramos aqui no Balaio, tornando mais difícil a recuperação da economia. O clima de catastrofismo, porém, vai além da realidade dos fatos e tem como pano de fundo a sucessão presidencial de 2014, ativada pela antecipação da campanha e pela ausência de candidatos competitivos para enfrentar a candidata do governo.
Inconformados com os altos índices de popularidade da presidente Dilma Rousseff, que nas atuais pesquisas lhe garantem a reeleição já no primeiro turno, setores da sociedade que se sentiram prejudicados com a queda de juros e tarifas, especuladores e rentistas, e todos os donos da grande mídia, aquela gente que não se conforma com medidas que visam a beneficiar a população de baixa renda, resolveram investir em outros campos, já que o cenário eleitoral não lhes dá muitas esperanças de voltarem ao poder tão cedo.
Alguma coisa está fora de ordem e de lugar quando assistimos à 'judicialização' da política e à politização do judiciário, e os grandes protagonistas da cena brasileira se tornam o presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, e o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que agora têm uma opinião formada sobre tudo e dão seus pitacos definitivos sobre qualquer assunto, mesmo quando não são chamados. Eles se consideram os últimos catões da República, os únicos e os últimos honestos num país em que ninguém mais presta, só eles. Estão sempre de cara amarrada, não se permitem um sorriso. São as próprias expressões do fim do mundo.
Gurgel já decidiu que a nova distribuição dos royalties do petróleo só deverá valer a partir de 2016; Barbosa comenta a indicação do polêmico deputado pastor Marco Feliciano para uma comissão da Câmara, como se tivesse alguma coisa a ver com isso, e ambos se dedicam com afinco para colocar logo na cadeia os condenados da Ação Penal 470, recusando sumariamente qualquer recurso dos advogados de defesa.
Citado pelo ex-ministro José Dirceu numa história no mínimo muito malcontada, no episódio da sua indicação para o STF, o ministro Luiz Fux manda um assessor responder que não vai polemizar com réus condenados. Na mesma semana, o procurador-geral Gurgel determina ao Ministério Público e à Polícia Federal investigações sobre o ex-presidente Lula, a partir de declarações feitas por Marcos Valério, após o réu ser condenado a mais de 40 anos de prisão. Princípios e valores variam conforme os interesses de ocasião. E tudo parece muito natural para a nossa imprensa.
No mesmo momento em que Barbosa denuncia o "conluio" entre advogados e magistrados, o escritório de Sergio Bermudes, um dos mais caros do país, anuncia o patrocínio de uma festa de arromba para mais de 300 pessoas em seu apartamento de 800 metros quadrados, no Rio de Janeiro, para comemorar o aniversário de 60 anos do mesmo ministro Luiz Fux, cuja filha Marianna, candidata a uma vaga no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, trabalha com o anfitrião. A pedido da mãe do homenageado, diante da repercussão negativa do badalado regabofe, a festa foi cancelada, segundo os jornais deste sábado. Menos mal.
Mas não faltarão, certamente, outras festas do gênero, por mais que isso irrite ou agrade Barbosa, recentemente homenageado no Copacabana Palace pelos mesmos donos da mídia que publicam artigos de Marianna Fux e louvam seu pai, para congregar os comensais dos dois lados do balcão da Casa Grande, que podem perder as eleições e a vergonha, mas nunca perdem a pose nem o poder. Manda quem pode, obedece quem tem juízo. Este é o mundo deles, com ou sem perucas, e o resto que se dane, como costumam dizer, desde os tempos dos bailes da Ilha Fiscal.
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