quinta-feira, 30 de outubro de 2008

PETRÓLEO - A crise do pico petrolífero: no centro da tempestade.

Enquanto aguardamos a revelação de quantos milhões de barris/dia será o corte da OPEP [1], é boa oportunidade rever a situação financeiro-energética, pois ambas estão agora fortemente ligadas.

Como é bem sabido, as características mais destacadas no panorama destes últimos meses têm sido o mergulho dos preços do petróleo e o aprofundamento da crise económica. Até agora os preços do petróleo estiveram em queda mais depressa do que a economia desmorona, dando com isso a impressão de que a gasolina mais barata em breve remediará os nossos males econômicos e tudo ficará bem.

Nunca pudemos entender o peso correto de cada um dos fatores que levou ao colapso dos preços do petróleo neste ano. A percepção coletiva de que o mundo se encaminha para tempos de dificuldades econômicas muito sérias obviamente está à cabeça da lista. A ascensão do dólar ou a queda do euro, margin calls sobre especuladores, o colapso da indústria habitacional dos EUA, o arranque das Olimpíadas que terminaram a grande farra de compras chinesas de petróleo, e mais recentemente a falta de crédito para financiar transações de petróleo, tudo isso contribuiu para o mergulho dos preços.

Atualmente a atenção mundial está centrada, sobretudo, no esmagamento do crédito, que foi precipitado pela relutância de bancos insolventes em admitirem a sua situação. Considerando que governos do mundo gastaram, emprestaram, penhoraram, garantiram, prometeram quatro milhões de milhões (trillion) de dólares num esforço para conseguir que os bancos emprestem dinheiro outra vez, não é de admirar que os mercados saltem ou mergulhem a cada convulsão do London Interbank Offered Rate. Por enquanto, poucos comentaristas parecem apreender realmente que por trás do esmagamento do crédito jaz um universo de perturbações: hipotecas incomportáveis, preços da habitação em queda, declínio das vendas ao consumidor, ascensão do desemprego, inadimplências nas prestações de empréstimos a casas, carros e cartões de crédito. Esta recessão, ou seja o quer for que acabe por ser, ainda está no seu princípio.

Assim, como é que tudo isto se reflete na oferta mundial de petróleo – o sangue vital da nossa civilização? Relatórios recentes dizem que a produção mundial caiu rapidamente em setembro. Quando a acumulação de estoques parece estar em ascensão, podemos presumir que a OPEP cortará a produção mais uma vez ou será confrontada com preços do petróleo muito mais baixos. Como quase todos os exportadores de petróleo do mundo permitiram que as suas economias se habituassem a seis anos de crescimento firme dos rendimentos petrolíeros, eles, tal como os seus clientes, atravessarão alguns momentos difíceis.

O factor mais assustador neste momento são relatórios de que traders mais pequenos, que têm sido uma parte essencial da movimentação de petróleo através do globo, podem não conseguir mais financiamento para embarques de petróleo – embora a Exxon, Shell, BP e WalMart não tenham de se preocupar acerca de tais coisas. Esta falta de empréstimos está a forçar muitos traders a afastarem-se, deixando o mercado apenas aos maiores participantes.

Uma vez que ninguém realmente pode prever no que toda a miríade de forças em jogo vai resultar, pode ser útil examinar um cenário ou dois para tentar perceber o que o futuro pode nos ter reservado em termos de oferta e de preço do petróleo. Em primeiro lugar, devemos recordar que a produção mundial de petróleo confirmadamente atingiu o pico devido à crise financeira, de modo que no fim deste ano a produção provavelmente será substancialmente mais baixa devido à falta de procura e aos cortes. Um corolário desta queda é que o investimento em novos projectos de produção já está a desacelerar devido a `preços de petróleo insuficientes` e a falta de financiamento. Enquanto as bem financiadas companhias majors provavelmente irão concluir o trabalho nos projectos já em curso, alguns deles poderiam ser adiados.

Vamos tomar um cenário imaginável mau, se não o pior. Suponha-se que a economia mundial realmente azede nos próximos dois anos, que o desemprego cresça para dois dígitos, que caiam as vendas ao consumidor, que a produção agrícola e industrial desça nitidamente por todo o mundo desenvolvido e o comércio internacional se reduza. O que acontece à produção, procura e preços do petróleo? Para começar, há numerosos países no mundo que já estão na espiral da morte económica. Para aqueles incapazes de obter divisas estrangeiras, a procura por petróleo cairá precipitadamente e grandes partes das suas economias em breve retornarão ao século XIX.

A China, entretanto, com uma grande população e economia em expansão irá aguentar-se [mesmo] que seja desconectada do resto do mundo de modo que poderá manter-se a crescer e a importar mais petróleo a cada ano. A Europa, que atravessou tempos difíceis no passado de gente que ainda está viva, utiliza apenas a metade do petróleo per capita dos EUA, e tem excelentes transportes por autocarros e comboio, pode provavelmente contentar-se com menos petróleo e gás natural.

A grande incógnita é provavelmente o consumo de petróleo dos EUA em meio a um grande desabamento económico. Actualmente o nosso consumo está abaixo em cerca de 8,5 por cento (4,3 por cento para a gasolina) devido aos altos preços do último Verão e à estagnação da economia. Como a gasolina provavelmente vai estar abaixo dos US$2,50 por galão [3,785 litros] ou em torno disso, os preços de US$4 do último Verão não estarão a inibir o consumo por algum tempo. Nos próximos poucos anos provavelmente seremos relegados a alto desemprego, actividade económica mais reduzida e consumidores intimidados ou empobrecidos, sendo estas as principais razões para o menor consumo de petróleo. Ainda não podemos dizer se isto cortará a procura estado-unidense em 10, 20 ou 30 por cento. Esforços sérios para a conservação – limites de velocidades mais baixos, partilha de carros, autocarros, mais isolamento térmico – poderiam ter algum papel na determinação de quanto cairá a procura.

A questão final é que efeito tem uma severa recessão económica sobre a produção mundial? Cairá rapidamente ou permanecerá no actual plateau? Será que a procura por petróleo cairá tão rapidamente que, pelo menos por algum tempo, manter-se-á à frente da capacidade declinante dos campos petrolíferos do mundo para produzirem? Poderemos nós esquecer as alternativas para o petróleo por um momento quando procura mundial mais reduzida significa que podemos obter todo o petróleo que ainda quisermos relativamente barato? Poderemos nós ter recursos para efectuar a transição para fontes de energia alternativas?

Por agora são apenas perguntas, mas no próximo ano ou pouco mais deveríamos começar a buscar respostas. De uma forma ou de outra, não será um tempo fácil.


Tom Whipple (jornalista)

[1] Em 24 de Outubro a OPEP decidiu reduzir a produção em 1,5 milhão de barris por dia.

O original encontra-se em www.fcnp.com.

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/.
Fonte: AEPET.

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