Economista alemão previu, em 2006, colapso da economia global até 2010. Para ele, Brasil está bem preparado
Graça Magalhães-Ruether
BERLIM. Nas livrarias de Berlim, o best-seller hoje é um livro de 2006, "Der crash kommt" ("O crash vai chegar"), de Max Otte, da Universidade de Worms, na Alemanha, que prevê o colapso global da economia até 2010. Em entrevista exclusiva, o economista de 45 anos, que nos anos 90 foi aluno de doutorado de Ben Bernanke - o presidente do Federal Reserve, o Fed - afirma que o capitalismo como o conhecemos morreu. Em seu lugar virá uma economia regulamentada. Em sua opinião, o Brasil poderá ser afetado, mas está mais bem preparado que no passado.
No seu livro, o senhor adverte para os erros da economia americana e prevê a crise das hipotecas e a falência dos grandes bancos de investimento. Por que o governo dos EUA não agiu, se o perigo era conhecido?
MAX OTTE: Qualquer um podia ver, há cinco anos, o que havia de errado na economia dos EUA e na especulação global. Eu sou um professor da província e, embora tenha feito minhas advertências em livro, elas não foram registradas. Mesmo que um professor de Harvard tivesse advertido, ninguém teria ouvido. Enquanto os executivos lucravam milhões não tinham qualquer interesse em mudança. E o governo, que pregava o mercado livre, não queria interferir para não perder sua credibilidade de governo capitalista.
Quais foram os principais prenúncios da crise?
OTTE: Um deles podia ser visto nos anos 90: a explosão dos preços dos imóveis nos EUA, associada a um crédito descontrolado. Além disso, o setor especulativo da economia cresceu muito mais do que o produtivo. Em 2005, era possível ver que essa bolha especulativa romperia.
No livro, o senhor afirma que o grande crash ocorrerá até 2010. O pior ainda não passou?
OTTE: Infelizmente não. No momento, temos uma crise forte, que não podemos chamar ainda de colapso. Agora vamos ver se esse pacote de ajuda nos EUA terá efeito. Mas isso não muda o fato de que a economia real está entrando em recessão. Resta saber qual é sua profundidade. Se será como nos anos 70, tão forte quanto em 1981 e 1982 ou se será comparável à de 1929.
Até agora, diversos países da Europa, e também do Brasil, vêm afirmando que a crise é um problema mais americano, que não afetará suas economias. O senhor concorda?
OTTE: De forma alguma. Já agora, a crise tem efeitos no mundo inteiro. A Europa sofrerá bastante, mas países emergentes, como a China, sofrerão o impacto. Também o Brasil será afetado, embora esteja hoje mais bem preparado que nos anos 80 e 90. Mas a queda da demanda por bens que o Brasil exporta e a redução da liquidez internacional prejudicarão investimentos e, com isso, a economia brasileira.
Também depois do estouro da bolha da internet e do 11 de Setembro falava-se em depressão, mas houve melhora. É possível que a crise atual se torne igual às do início da década?
OTTE: Cada crise é diferente. Acho que a reação do Fed em 2001 pode ter ajudado a causar a crise atual ao abrir a torneira, alimentando o mercado das especulações. No final, com a crise das hipotecas, houve uma destruição de ativos que eu calculo em cerca de US$10 trilhões.
O senhor acha que as medidas tomadas são corretas?
OTTE: Sim, porque de outra forma os efeitos poderiam ser muito mais graves. Eu conheço Ben Bernanke, é um economista sólido. Quando fiz meu doutorado nos EUA, fui a um churrasco na casa dele. Antes, nenhum governo do mundo ocidental adotaria medidas semelhantes. Mas elas foram necessárias.
Em sua opinião, o capitalismo, que durante anos foi visto no Ocidente como o melhor sistema, vai acabar em conseqüência da atual crise?
OTTE: Já algumas vezes o capitalismo esteve ameaçado. Depois de grandes crises, houve a tendência de reestatização da economia. Hoje, o que fica claro é que, qualquer que seja o resultado, se colapso global ou apenas uma recessão, o poder dos bancos, o poder imensurável do capital, o comércio com bens altamente especulativos, isso acabou.
Como será a situação financeira mundial em 2010?
OTTE: Vejo dois cenários. Um é o pior possível: um colapso com uma grande depressão e todas as suas conseqüências politicas, até conflitos armados. O outro, bem melhor, é se conseguirmos sair da crise pela regulamentação, com uma forte fiscalização dos bancos. Tudo será mais tedioso e controlado, mas haverá muito menos riscos.
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